16-11-2005
Gregorio de Mattos e Guerra
(1636 - 1695)
Gregório de Matos e Guerra foi um poeta brasileiro do sec. XVII, que deixou mais de 700 poesias, mas nenhuma viu publicada durante a sua vida. A sua poesia ficou espalhada por manuscritos variados, dispersos pelo mundo, até que foi publicada parcialmente no sec. XIX e depois no sec. XX.
O poeta nasceu em 1636, na Baía, no Brasil, sendo descendente de famílias prestigiadas e abastadas daquela cidade. Estudou ali no Colégio das Jesuítas. até que veio para Portugal em 1650, matriculando-se em 1652 na Universidade de Coimbra. Não deve ter sido muito feliz a passagem por esta cidade, como se vê lendo os seus versos “Adeus, Coimbra inimiga”.
Em 1661, conclui a sua formatura e vai para Lisboa, onde se casa no mesmo ano com Dona Michaela de Andrade. Não consta que tivesse filhos desta senhora, que veio a falecer em 1678. Em 1674, reconhece como sua uma filha natural, portanto, fora do casamento.
Desempenhou diversos cargos de nomeação oficial, próprios da sua formação como jurista. Em 1671 é Juiz do Cível em Lisboa: mais tarde serão publicadas algumas das suas sentenças pelo seu amigo Manuel Alvares Pegas (a este dedicará mais tarde três sonetos). Afinal, foram colegas em Coimbra onde Pegas se formou em 1658. Para além das três que são conhecidas e mencionadas no Brasil, descobri mais quatro, que publico neste site.
Em 1672, é nomeado Procurador da Bahia (Senado da Câmara) em Lisboa, cargo de que será destituído em 1674.
É provável que, já em Lisboa, o poeta tivesse começado a atacar tudo e todos a torto e a direito com os seus poemas satíricos. Em 1681, recebe as ordens menores como clérigo tonsurado, pretendendo talvez na altura ser ordenado padre, o que nunca veio a concretizar-se.
Em 1682 regressa ao Brasil, depois de ter permanecido em Portugal 32 anos.
A sua produção poética revela uma vida agitada, recheada de episódios burlescos e criando muitos inimigos. Em 1685, é denunciado à Inquisição, mas a queixa não vai por diante, possivelmente devido ao prestígio da sua família.
Algum tempo depois casa com Maria de Povoas, de quem tem um filho chamado Gonçalo.
Em 1692, o Governador da Bahia, D. João d’Alencastre, desterrou-o para Angola, para, segundo ele, o afastar dos que o que queriam assassinar. Em 1695, regressa ao Brasil e morre no mesmo ano no Recife.
BIOGRAFIAS
A primeira biografia do poeta é de 1882, da autoria de Manuel Pereira Rebello, em Obras poéticas de Gregório Mattos Guerra: precedidas da vida do poeta, 367 págs., Rio de Janeiro, (existe um exemplar na Biblioteca do Arquivo Regional de Ponta Delgada), está transcrita aqui.
Foi reescrita e publicada de novo em 1929.
No último volume (VI – Última) da edição dos poemas, em 1933, aparece, anónima, uma Vida do Grande Poeta Americano Gregório de Matos Guerra.
Outras biografias foram sendo publicadas, mas, nos últimos decénios, o Dr. Fernando da Rocha Peres, da Baía, tem-se dedicado à investigação da biografia do poeta, que divulgou em muitas publicações, todas com muito interesse.
OBRA
A primeira publicação de versos do poeta foi feita por Januário da Cunha Barbosa em 1831 (oito poemas) mas foi também o licenciado Pereira Rebello quem, em 1882, iniciou a publicação mais sistemática da obra do poeta, embora muito incompleta.
Nos anos 30 (1929 a 1933), a Academia Brasileira, publicou as poesias conhecidas em 6 volumes, em edição dirigida por Afrânio Peixoto, omitindo, porém, os poemas mais vulgares e licenciosos. Escreveu Afrânio Peixoto no prefácio do volume V (Satírica, 2.º volume) (1930) (existe em Lisboa, na Biblioteca Municipal de Belém):
“Quazi integral essa publicação, porque ficam excluídas algumas poesias licenciozas, tão cruas de obscenidade, que tivemos de fugir ao primeiro intento de as publicar. Não servem à glória do Poeta, pois não têm aquela virtuosidade ou estro, por exemplo, das composições semelhantes de Bocage. São, em calão erótico, apenas mau indício de uma corrompida e baixa sociedade colonial. Ficam nos Arquivos da Academia, para satisfação de alguma indiscreta curiozidade."
Em 1969, a Editora Record publica a Obra Poética de Gregório de Matos, numa edição ao cuidado de James Amado, mais completa que a da Academia Brasileira dos anos 30. Esta edição foi reeditada em dois volumes em 1990.
Em 1999, o Prof. Doutor Francisco Topa apresentou na Faculdade de Letras da Universidade do Porto uma tese de doutoramento com uma edição crítica (referências) da obra poética de Gregório de Matos e Guerra e ainda uma edição crítica completa dos sonetos, que se encontra na Internet:
Edição Crítica da Obra Poética de Gregório de Matos
Volume I, Tomo I: Introdução; Recensio (1.ª parte)
https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/73576/2/62659.pdf e também em https://sigarra.up.pt/flup/pt/pub_geral.show_file?pi_gdoc_id=500117
Volume I, Tomo II: Introdução; Recensio (2.ª parte)
https://sigarra.up.pt/flup/pt/pub_geral.show_file?pi_gdoc_id=474159 e também em https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/76418/2/61915.pdf
Volume II: Edição dos Sonetos
https://sigarra.up.pt/flup/pt/pub_geral.show_file?pi_gdoc_id=481457 e também em https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/75329/2/60119.pdf
Volume II: Edição dos Sonetos; Apenso - Sonetos excluídos
https://sigarra.up.pt/flup/pt/pub_geral.show_file?pi_gdoc_id=486446 e também em https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/76273/2/63032.pdf
ÍNDICE DAS POESIAS DE GREGÓRIO DE MATOS NA INTERNET
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ALTERNATIVA |
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II - Os Homens Bons
III - A Cidade e seus Pícaros Os seus doces empregos - Custódia Os seus doces empregos - Bárbora ou Babu Os seus doces empregos - Antônia Os seus doces empregos - Briga, Briga Os seus doces empregos - Teresa Os seus doces empregos - Maria João Os seus doces empregos - Adãos de Massapê Os seus doces empregos - A Freira: ralo, roda e grade Os seus doces empregos - Opúsculo de Pedro Alz. da Neyva Alguns passos discretos e tristes Andanças de uma viola de cabaça Os seus doces empregos - Anica Os seus doces empregos - O engenho está pejado Os seus doces empregos - Inácia, Apolônia e Mariana Os seus doces empregos - Mariquita Os seus doces empregos - Eu me vou por este mundo
IV - Armazém de pena e dor
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II - Os Homens Bons
III - A Cidade e seus Pícaros Opúsculo de Pedro Alz. da Neyva Alguns passos discretos e tristes Andanças de uma viola de cabaça
IV - Armazém de pena e dor
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A vida do Estudante em Coimbra
Mancebo sem dinheiro, bom barrete, Medíocre vestido, bom sapato Meias velhas, calção de esfola-gato, Cabelo bem penteado, bom topete;
Presumir de dançar, cantar falsete, Jogo de fidalguia bom barato, Tirar falsídia ao moço do seu trato, Furtar à ama a carne que promete;
A putinha aldeã achada em feira, Eterno murmurar de alheias famas, Soneto infame, sátira elegante;
Cartinhas de trocado para a Freira, Comer boi, ser Quixote com as damas, Pouco estudo: isto é ser estudante.
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Adeus, Coimbra inimiga
Adeus, Coimbra inimiga Dos mais honrados madrasta Que eu me vou para outras terras Onde viva mais à larga!
Adeus, prolixas escolas, Com reitor, meirinho e guarda, Lentes, bedéis, secretários, Que tudo, sommado, é nada!
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A nossa Sé da Bahia
com ser um mapa de festas é um presépio de bestas. e se nisto maldigo ou me engano, eu me submeto à Santa Madre Igreja. Se virdes um Dom Abade sobre o púlpito cioso, não lhe chameis Religioso chamai-lhe embora de Frade Jesu, nome de Jesu!
Aos Capitulares do seu tempo
A nossa Sé da Bahia, com ser um mapa de festas, é um presépio de bestas, se não for estrebaria: várias bestas cada dia vemos, que o sino congrega, Caveira mula galega, o Deão burrinha parda, Pereira besta de albarda, tudo para a Sé se agrega.
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Descreve um horroroso dia de trovões
Na
confusão do mais horrendo dia,
Bramava o mar, o vento embravecia,
Desde
o alto aos côncavos rochedos,
Pois
dava o Céu ameaçando riscos
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Ao Conde de Ericeyra, D. Luiz de Menezes, pedindo louvores ao poeta, não lhe achando elle prestimo algum.
Um soneto começo em vosso gabo;
Na quinta torce agora a porca o rabo:
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Descreve o que era naquele tempo a cidade da Bahia
A cada canto um grande conselheiro, Que nos quer governar cabana e vinha;Não sabem governar sua cozinha,E podem governar o mundo inteiro.Em cada porta um frequentado olheiro,Que a vida do vizinho e da vizinhaPesquisa, escuta, espreita e esquadrinha,Para o levar à Praça e ao Terreiro.Muitos mulatos desavergonhados,Trazidos pelos pés os homens nobres,Posta nas palmas toda a picardia,Estupendas usuras nos mercados,Todos os que não furtam muito pobres:E eis aqui a Cidade da Bahia.
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À canseira da vida humanaCarregado de mim ando no mundo,E o grande peso embarga-me as passadas,Que como ando por vias desusadas,Faço o peso crescer, e vou-me ao fundo.O remédio será seguir o imundoCaminho, onde dos mais vejo as pisadas,Que as bestas andam juntas mais ornadas,Do que anda só o engenho mais profundo.Não é fácil viver entre os insanos,Erra, quem presumir, que sabe tudo,Se o atalho não soube dos seus danos.O prudente Varão há de ser mudo,Que é melhor neste mundo em mar de enganosSer louco c’os demais, que ser sisudo.
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Que me quer o Brasil, que me persegue?
Com o seu ódio a canalha, que consegue?
Isto posto, ignorantes, e canalha
E se os senhores nobres, e elegantes
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A Jesus Cristo Nosso Senhor
Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado, Da vossa piedade me despido, Porque quanto mais tenho delinqüido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado. Se basta a vos irar tanto um pecado, A abrandar-nos sobeja um só gemido, Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado. Se uma ovelha perdida, e já cobrada Glória tal, e prazer tão repentino
vos deu, como afirmais na Sacra História:
Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada Cobrai-a, e não queirais, Pastor divino,
Perder na vossa
ovelha a vossa glória. |
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A Cristo Senhor Nosso crucificado, estando o poeta na última hora da sua vida
Meu Deus, que estais pendente em um madeiro, Em cuja lei protesto viver, Em cuja santa lei hei de morrer
Animoso, constante, firme, e inteiro. Neste lance, por ser o derradeiro, Pois vejo a minha vida anoitecer, É, meu Jesus, a hora de se ver
A brandura de um Pai manso Cordeiro. Mui grande é vosso amor, e meu delito, Porém pode ter fim todo o pecar,
E não o vosso amor, que é infinito. Esta razão me obriga a confiar, Que por mais que pequei, neste conflito
Espero em vosso amor
de me salvar. |
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Define a sua cidade
MOTE
De dous ff se compõe esta cidade a meu ver um furtar, outro foder.
Recopilou-se o direito, e quem o recopilou com dous ff o explicou por estar feito, e bem feito: por bem Digesto, e Colheito só com dous ff o expõe, e assim quem os olhos põe no trato, que aqui se encerra, há de dizer, que esta terra De dous ff se compõe.
Se de dous ff composta está a nossa Bahia, errada a ortografia a grande dano está posta: eu quero fazer aposta, e quero um tostão perder, que isso a há de preverter, se o furtar e o foder bem não são os ff que tem Esta cidade a meu ver.
Provo a conjetura já prontamente como um brinco: Bahia tem letras cinco que são B-A-H-I-A: logo ninguém me dirá que dous ff chega a ter, pois nenhum contém sequer, salvo se em boa verdade são os ff da cidade um furtar, outro foder.
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Caralho do Muleiro é feito de papelão,
O Muleiro, e o Criado
Disto Criado apelou,
Item sendo necessário,
E que depois de se erguer,
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A huma dama por nome Maria Viegas, que fallava fresco, e corria por conta do Capitão Bento Rabello, seu amigo
Senhora Cota
Vieira,
Portuguesa nas palavras.
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O homem
mais a mulher
MOTE
O
cono é fortaleza,
O
homem mais a mulher
Neste
Forte recolhidos
Aquartelaram-se então
Marchando por um atalho
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Com cachopinha de gosto
MOTE
As
excelências do cono
Com
cachopinha de gosto
Eu na
minha opinião,
É
também conveniente,
Mas a
maior regalia,
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Diz mais com o mesmo desenfado
Sal, cal, e alho |
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