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Versão esta que, indubitavelmente, além de afrontar sobremaneira o sólido, límpido e irrefragável conjunto probatório, subestima até o mais neófito operador do direito penal. Por isso, tal versão está fadada ao insucesso.
Não é outra a recomendação da robusta e incontestável prova em desfavor dos demais co-autores LUIS MIGUEL MELITÃO GUERREIRO, LEONARDO SOUSA DOS SANTOS, apodado por "GROSSO" e JOSÉ JURANDIR PEREIRA FERREIRA, o primeiro, réu confesso nas fases indiciária e jurisidicionalizada, os últimos, são réus confesso na esfera policial, conforme já foi deveras dissecado no início da presente peça de acusação final. Cujas confissões coadunam-se de forma cristalina e notória com as demais provas dos autos, em especial, a prova testemunhal produzida em Juízo e as provas materiais referentes a apreensões de dinheiro e objetos pertencentes as vítimas, bem como o revólver, arma instrumento dos crimes.
Mesmo assim, adotando-se o adágio popular consistente na expressão - o que abunda não prejudica -, é de bom alvitre se reportar de alguns detalhes relativos a inquestionável participação dos preditos réus.
O réu LUIS MIGUEL MELITÃO GUERREIRO, principal protagonista da desgraçada chacina, quando preso pelos agentes-federais foi apreendido em seu poder a importância de R$ 15.000,00(quinze mil reais), um veículo tipo Kombi e outros objetos, frutos da consumada ação criminosa, os quais encontram-se relacionados nos autos de apresentações e apreensões que repousam às fls.150/153.
Verifica-se ainda, nos fólios deste processo criminal, farta documentação evidenciando movimentos bancários e efetivações de compras realizadas pelo sobredito réu lusitano, através de cartões de créditos despojados das desditosas vítimas portuguesas. Acresce que, em alguns momentos, que o mesmo dilapidava o patrimônio das extintas, chegou a ser filmado pelo circuito interno de televisão do Banco BBV, consoante se depreende das fls.73/77.
De sua vez, os co-réus LEONARDO DE SOUSA SANTOS, alcunha "GROSSO" e JOSÉ JURANDIR PEREIRA FERREIRA, além de serem réus confesso, na fase inquisitorial, narraram a participação de todos quadrilheiros, na cena sangrenta que ceifou as vidas dos seis turistas portugueses, evidenciando, portanto, a prévia constituição da celerada associação delituosa, sob o comando do português LUIS MELITÃO GUERREIRO com o desiderato de pôr em prática o plano deletério ora analisado.
Registre-se, também, a título de reforço ao incontestável elenco probante que evidencia a participação de todos os réus, a existência nos fólios deste processo do RELATÓRIO CIRCUNSTANCIADO fls. 446/448, prestada pela testemunha JEAN CÉSAR PINHEIRO, Agente de Polícia Federal, relativa o "derrame de dinheiro" (aquisição de objetos, pagamentos de dívidas, doações de gorjetas, etc), fruto da hedionda chacina, por parte dos réus MANOEL LOURENÇO CAVALCANTE, vulgo "CLÁUDIO, JOSÉ JURANDIR PEREIRA FERREIRA e LEONARDO SOUSA DOS SANTOS, apodado por "GROSSO", cujo relato foi confirmado em Juízo às fls. 593/599, onde a referida testemunha prestou depoimento sem contradita. Além disso, restou corroborada pela Nota Fiscal acostada às fls.453, a qual registra que no dia 18.8.2001, o réu JOSÉ JURANDIR PEREIRA FERREIRA, comprou na empresa denominada LASER ELETRO MAGAZINE um Refrigerador Cônsul pela importância de R$396.00(trezentos e noventa e seis reais).
Por outra banda, as compras efetivadas pelo réu RAMINUDO MANTINS DA SILVA FILHO, encontram-se comprovadas através das fls.349/353.
Relativamente as provas técnicas consistentes em Exame em Local de Crimes, Exame de Balísticas e Laudos Cadavéricos, também se coadunam com a primeira versão apresentada pelos réus, à exceção de RAIMUNDO MARTINS DA SILVA FILHO, a Polícia Judiciária Federal.
Indubitavelmente, o conjunto probatório norteado pela versão dos réus LUIS MELITÃO GUERREIRO, LEONARDO SOUSA DOS SANTOS e JOSÉ JURANDI PEREIRA FERREIRA é por demais insofismavelmente e uno. Com efeito, há uma perfeita e irrefutável harmonia entre a prova material ( Laudos de Exames Cadavéricos fls.295/305) e as confissões extra-judicias firmadas pelos referidos delinquentes, conforme se verifica com facilidade através das fls. 93/98 e 127/131, quanto aos modus operandi utilizados para na execução sumária das três primeiras vítimas, in casu, VICTOR MANOEL MARTINS, ANTONIO CORREIA MARTINS E JOAQUIM MANOEL PESTANA DA COSTA, as quais foram submetidas a uma série de espancamentos produzidos por pau, enxada, faca e outros instrumentos contundentes, em seguida foram lançadas na antedita "cova clandestina".
Por outra banda, as demais extintas, ou seja, JOAQUIM SILVA MENDES, JOAQUIM FERNANDES MARTINS E MANOEL JOAQUIM BARROS, foram vítimas de agressões desferidas pelo celerado RAIMUNDO MARTINS DA SILVA FILHO e posteriores espancamentos.
Em verdade, as três primeiras vítimas trucidadas, quais sejam, VICTOR MANUEL MARTINS (laudo cadavérico fls. 297), JOAQUIM MANOEL PESTANA DA COSTA laudo cadavérico fls.298) e ANTONIO CORREIRA RODRIGUES(laudo cadavérico fls.302), além de soterradas vivas, foram lesionadas por espancamentos produzidos por instrumentos contundentes. As demais vítimas: JOAQUIM FERNANDES MARTINS (laudo cadavérico fls. 295/296) e JOAQUIM DA SILVA MENDES (laudo cadavérico fls.299/300) foram atingidos com tiros na cabeça. E, por último, a vítima MANOEL JOAQUIM BARROS (laudo cadavérico fls.301) foi alvejada com um tiro à altura do pescoço, senão vejamos trechos do referido laudo, verbis: "...Observamos que a lesão descrita na região foi produzida por móvel que não penetrou em cavidades produzindo lesões de pela e subcutâneo, sendo compatível com lesão por trajeto tangencial de projeto de arma de fogo"(grifo nosso). Tudo isso, além de outros espancamentos produzidos por elementos contundentes.
No que tange ao trabalho der Polícia Técnica, Infere-se LAUDO DE EXAME DE ARMA DE FOGO E MICROCOMPARAÇÃO BALÍSTICA realizada pelos expertos do Instituto de Criminalística do Estado do Ceará, que o projétil extraído do cadáver de JOAQUIM DA SILVA MENDES, assim como, a capsula arrecadada pela perícia no local do crime, foram disparados pelo revólver aprendido em poder do denunciado LEONARDO SOUSA DOS SANTOS, conforme bem explicita às fls.105/106 e 357/366.
A execução do sórdido, covarde e frio plano, assinalado por uma sessão de torturas, humilhações e desrespeito ao ser humano, com a induvidosa participação ativa de todos os incriminados, narrada com riqueza de detalhes, durou quase uma hora. Os perversos sicários realizaram diversas ações para alcançarem o desiderato criminoso previamente maquinado.
Os laudos de Exames Cadavéricos evidenciam detalhes de crueldade e torturas sofridas pelas infortunadas vítimas, que tem em comum, como causa principal da morte: "asfixia mecânica pela presença de areia na traquéia e esôfago, o que caracteriza movimentos respiratórios e de deglutinação após o soterramento do corpo...". Em face disso, correto e verberar que a vítima que teve menos lesão externa sofreu por mais tempo, quando sepultada viva. Continuando, testificam aquelas perícias médica que os cruéis "sicários" para alcançar o seu objetivo escuso e sangrento, utilizaram-se de diversos instrumentos (revólver, faca, pau, pedra, socos, pontapés, cordas, etc). Pasmem-se os céus de tamanha barbaridade!.
Destarte, certo é afirmar que, todos os portugueses foram sepultados vivos, motivo justificador de que todos os réus participaram diretamente das mortes da vítimas, bem como da agravante de utilização de meio cruel, acertadamente reconhecido pelos médicos-legistas.
Conclui-se, portanto, que as confissões extra-judciais prestadas pelos réus em referência, perante a Polícia Judiciária Federal, é por demais corroborada pelas diversas apreensões de objetos despojados das inditosas vítimas, apreensão de arma e outros instrumentos usados na prática delitiva, por uma imensa quantidade de provas periciais, em especial os Exames Cadavéricos, bem como pela confissão judicial do réu LUIS MIGUEL GUEREIRO, mentor do malsinado plano diabólico, e, por fim, pelos depoimentos das testemunhas oitivadas em Juízo, sem contraditas.
Dessa forma, tais confissões, por estarem plenamente recepcionada pelo conjunto das provas colhidas no bojo deste volumoso processo criminal, há de serem acolhidas ainda que alguns co-autores tenham se retratados em Juízo, sem para tanto, comprovarem os seus respectivos álibes apresentados ou apresentarem contra-provas.
A respeito da confissão policial, tem-se que a prova constante do inquérito policial, em regra, não deve ser desprezada, principalmente nos casos de latrocínio, delito que sempre ocorre na clandestinidade. E as confissões colhidas nesta fase, desde que obtidas regularmente e segundo sejam seus termos postos em confronto com as demais circunstâncias ocorridas no caso, às quais se ajustam, têm alto valor probante e devem ser aceitas para condenação, se não elididas na fase judiciária. Esse é o entendimento manso e pacífico da jurisprudência pátria. Senão vejamos:
CONFISSÃO POLICIAL - STF: "O princípio basilar do processo penal brasileiro é o de livre convencimento, as confissões judiciais e extrajudiciais valem pela sinceridade com que são feitas ou verdades nelas contidas. Precedente" (STF - Rec. - Rel. Cordeiro Guerra - RT 499/409).
"Em crime de roubo devem prevalecer as confissões policiais com incriminações recíprocas, confirmadas por apreensões de coisas subtraídas e de arma utilizada, bem como pela delação judicial de outro acusado"(TACRIM-SP-AP-Rel. Penteado Navarro-RJD 24/344).
"A confissão policial assistida por advogado gera no espírito do julgador a convicção de que foi narradas a realidade dos fatos, tornando despida de credibilidade a retratação na fase judicial"(TACRIM-SP--AP-Rel. Vanderley Borges - RJD 23/214).
"A confissão do agente, apesar de extra judicial, constitui valioso elemento de convicção a demonstrar a procedência da denúncia, quando oferecida na presença de advogado e harmonizando-se plenamente com a prova colhida sob o crivo do contraditório"(TACRIM-SP-AP-Rel. Teixeira de Freitas - RJD 20/71).
"A confissão policial, mesmo se não confirmada em Juízo, pode justificar o decreto condenatório se roborada pelas declarações do co-réu, cujo depoimento, pelas suas circunstâncias, resulta idôneo,... "(TACRIM-SP-AP-Rel. Sabino Neto-JUTACRIM-SP 15/214).
"A confissão policial amparada por apreensão e por indícios resultantes de prova testemunhal é prova suficiente para a condenação"(TACRIM-SP-AP-11ªC. -Rel. Fernando de Oliveira- j.25.3.96-RJTACRIM 30/188).
No que tange a delação feita por co-réu, na esfera policial, que não objetivou a excluir-se a sua participação delitual, a orientação pretoriana pátria é que, aquela, deve ter condão para expedição de decreto condenatório. "Ex vi":
PROVA CRIMINAL - "Palavra de co-réus - Valor probante - Condenação. "As palavras de co-réus que se mostram desprovidas de qualquer interesse ou paixão podem servir de suporte à condenação, na veemente prova circunstancial colhida nos autos"(TJMS-AP-Rel. José Rizkallah - RT 660/330).
"A chamada de co-réu, que, na fase policial, não visou a eximir-se da própria responsabilidade, é suficiente para condenar o parceiro de roubo surpreendido na posse da res furtiva, quando, escoteiro a negativa deste, a prova testemunhal também confirmou, no contraditório, a apreensão em poder do mesmo, de parte do produto do crime e a delação do co-autor"(TACRIM-SP-AP-Rel. Haroldo Luis-RJD 20/147).
"A chamada co-réu, isto é, a confissão do acusado envolvendo também outro personagem do crime, constitui valioso elemento probatório, ensejando a condenação da pessoa referida se com apoio em outros elementos do processo"(TJSC-RC-Rel. Marcílio Medeiros-RT 479/381).
No vertente caso, conforme já ficou devidamente esclarecido as decisões acima coletadas caem como uma luva nas mãos, uma vez que os réus em epígrafe, à exceção de RAIMUNDO MARTINS DA SILVA FILHO, nas declarações prestadas no inquérito policial, confessaram amplamente a prática dos delitos. Tais confissões são deveras corroboradas com a apreensões de parte da importância fruto dos crimes, de objetos pertencentes as vítimas, de objetos adquiridos com dinheiro proveniente das ações criminosas e do revólver utilizado na prática dos ilícitos penais. Além disso, repita-se: o réu LUIS MIGUEL MELITÃO GUERREIRO ratificou a sua confissão em Juízo, procedimento este, também adotado pelas testemunhas oitivadas na esfera policial, ocasião em que as mesmas deixaram bem claro que em momento algum sofreram qualquer constrangimento na repartição policial.
Registre-se ainda que, os álibes apresentados pelos réus para sustentarem a negativa de participação na malsinada chacina, não restaram provados. Aliás, não resistiram, sequer, a uma só prova das diversas existentes no bojo deste processo.
Crível, nesse passo, é que não basta ao réu alegar o que lhe aprouver para combalir o teor da acusação que lhe é atribuída, mesmo porque sua simples afirmação, sem o prestígio e o conforto de outras provas, colocando-se em ângulo sombrio nos autos, não é suficiente para trazer a descortino a sua absolvição.
Quanto a ofuscada e pálida versão trazidas pelos réus JOSÉ LEONARDO DE SOUSA e JOSÉ JURANDIR PEREIRA FERREIRA, em Juízo, no sentido de que teriam confessado a autoria delituosa, mediante torturas sofridas nas dependências da Superintendência da Polícia Federal, as quais teriam produzido nos mesmos lesões corporais, não procede, eis que naquela ocasião, todos os imputados foram submetidos a Exame de Corpo de Delito (lesão corporal), cujos resultados deram negativos, conforme bem explicita às fls.303/305, além do mais, a confissão policial apresentada pelos mesmos foram confirmadas pelas demais provas.
Ainda a respeito daquela fantasiosa versão, é bom frisar que o réu RAIMUNDO MARTINS DA SILVA FILHO, quando oitivado pela Polícia Judiciária Federal, negou qualquer participação na repudiada chacina. O que, obviamente, representa mais uma prova que, se os seus comparsas tivessem sido torturados para confessar os crimes, aquele também teria sido, e, por conseguinte, teria sido réu confesso, da mesma forma dos demais. De sorte que esse inusitado e pifo argumento, visa tão-somente denegrir e macular o trabalho imparcial, sério, enérgico e reconhecido por toda sociedade nacional e internacional realizada pela aquela respeitável instituição federal.
O certo é que, hoje, à luz da legislação pátria, não se pode afirmar desvalorizada a confissão do culpado feita no inquérito policial, uma vez que domina como princípio relevante na apreciação das provas o livre convencimento do Juiz, o que, obviamente, não que dizer, opinião ou mero arbítrio na apreciação das provas.
O princípio enfocado encontra-se insculpido no art. 157, da Legislação Processual Penal, "verbis":
"Art. 157 - O Juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova".
O sistema ou princípio do livre convencimento ou da persuasão racional consiste no fato de que o Juiz só pode decidir de acordo com as provas existentes no bojo dos autos. Mas, na sua apreciação, tem inteira liberdade de valorá-las e sopesá-las. Não há hierarquia nas provas. Se é certo ficar ele adstrito às provas constantes dos autos, não é menos certo que não fica subordinado a nenhum critério apriorístico no apurar, por meio delas, a verdade real - princípio norteador do Direito Processual Penal -.
Como se constata, o princípio da verdade real, não prende o juiz a critérios legais de estimativa das provas, uma vez que preconiza o julgamento segundo sua consciência. Predomina-se, portanto, o princípio do livre convencimento motivado.
Em decorrência desse sábio princípio a pacífica jurisprudência brasileira firmou a seguinte posição:
Princípio do livre convencimento - TAMG: "É válido, de acordo com o sistema adotado pelo Código de Processo Penal, que o Juiz forme sua convicção através de prova indireta, ou seja, a partir de indícios vementes que induzam àquele convencimento de maneira induvidosa"(RT 673/357).
Prova, segundo José Frederico Marques, é o elemento instrumental para que as partes influam na convicção do juiz, e o meio de que este se serve para averiguar sobre os fatos em que as partes fundamentam suas alegações.
Segundo Malatesta, "prova é a relação particular e concreta entre o convencimento e a verdade". "É o conjunto de meios e processos tendentes a convencer o Magistrado acerca da existência ou inexistência de um fato".
No dizer de João Monteiro, prova, não é somente um fato processual, "mas ainda uma indução lógica é um meio com que se estabelece a existência positiva ou negativa do fato ou a veracidade de uma afirmação".
Para Mittermaier, "prova judiciária é a soma dos meios produtores da certeza, a respeito dos fatos que interessam a solução da lide.
Segundo Moacyr Amaral dos Santos, costuma-se conceituar a prova no sentido objetivo e no sentido subjetivo. No sentido objetivo, é como os meios destinados a fornecer ao juiz o conhecimento da verdade dos fatos deduzidos em juízo. No sentido subjetivo, prova é aquela que se forma no espírito do juiz, seu principal destinatário, quanto à verdade desses fatos. É a soma dos fatos produtores da convicção dentro do processo.
Ada Pellegrini Grinover, conceitua a prova como o instrumento por meio do qual se forma a convicção do juiz a respeito da ocorrência ou inocorrência dos fatos controvertidos no processo.
Diz Malatesta, que "sendo a prova o meio objetivo pelo qual o espírito humano se apodera da verdade, sua eficácia será tanto maior quanto mais clara, mais plena e mais seguramente ela induzir no espírito, a crença de estarmos de posse da verdade".
Com a prova, o que se busca é a configuração real dos fatos sobre as questões a serem decididas no processo. Para a averiguação desses fatos, é da prova que se serve o juiz, formando ao depois sua convicção.
Diante do milionário e irrefutável conjunto probatório que dormita no bojo deste processo criminal, em especial os Laudos Cadavéricos, chega-se a conclusão que todos os réus foram autores das execuções dos turistas portugueses, haja vista que, apesar das pauladas, enxadadas e tiros desferidos contra os mesmos, todos tiveram como causa mortis asfixia mecânica por soterramento. Até porque, no crime complexo de latrocínio é desnecessário saber-se qual dos co-autores desferiu o golpe final, pois todos os agentes agem em unidade de desígnios, e assim respondem pelo ato.
Isso porque, ao tratar da co-delinquência a legislação penal pátria abraçou a teoria unitária ou monística. Equipara-se, em princípio, o art. 29 todos os que intervêm no delito, quem, de qualquer modo, concorre para ele. Nesse prisma não se pode negar que a co-autoria é nada mais nada menos, em última análise, a própria autoria. Funda-se ela sobre o princípio da divisão de trabalho; cada autor colabora com sua parte no fato, a parte nos demais na totalidade do delito e, por isso, responde pelo todo. Há, na co-autoria, a decisão comum para a realização do resultado e a execução da conduta.
No que diz respeito a concurso deliquencial, a remansosa jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, assim tem entendido:
"Na co-autoria, não há necessidade do mesmo comportamento por parte de todos, podendo haver a divisão quanto aos atos executivos"(TACRIM - SP - AC - Rel. Des. Hélio de Freitas).
"Concurso de Agentes - Agente que colabora para o êxito do fato criminoso. No concurso delinquencial não é necessário que todos os partícipes consumem atos típicos de execução; para ser alguém co-responsabilizado, basta que tenha colaborado, auxiliado ou instigado, prestigiando ou encorajando a atuação dos executores direto"(TACRIM-SP-Rel. Des. Nogueira Filho - BMJ 87/4).
"Segundo a teoria monistica adotada pelo Código Penal, tudo quanto for praticado para que o evento se produzisse é causa indivisível dele. Há na participação criminosa uma associação de causas conscientes, uma convergência de atividades que são, em seu incindível conjunto, a causa única do evento e, portanto, a cada uma das forças concorrentes deve ser atribuída, solidariamente, a responsabilidade pelo todo"(TJSP-ACRel. Des. Mendes Pereira - RJTJSP - 40/317).
À luz desse festejado entendimento legislativo, doutrinário e jurisprudencial, para o reconhecimento da solidariedade criminosa ou mera ajuda, ainda sem participação direta, basta a simples anuência a empreendimento delituoso, com vista ao sucesso da atividade delinquencial de outrem. Dessa forma, no caso sob exame, verifica-se com facilidade, que, a coisa foi mais além, vez que por parte dos denunciados não houve apenas anuência, e sim, a participação decisiva na reiterada prática deletéria, onde todos se destacaram dentro de suas respectivas atribuições delituosas, previamente estabelecidas em forma de organização delitiva, do início até o final.
De modo que, ante a invocada Teoria monísta ou unitária eleita pelo legislador penal pátrio, "todos os que contribuem para a integração do delito cometem o mesmo crime", pois, em tal hipótese, "há unidade de crime e pluralidade de agentes" (Damásio E. DE Jesus, Código Penal Anotado, p. 108, 3ª ed., 1993, Ed. Saraiva).
A participação de cada acusado na série de eventos criminosos, caracterizado por atividade de inequívoca colaboração material e pelo desempenho de conduta previamente ajustada entre todos por meio de associação delituosa, está satisfatoriamente identificada no bojo do caderno policial.
Conclui-se, portanto, que essa regra, aplica-se, também, aos meliantes integrantes de associação criminosa ou quadrilha - art. 288, do Código Penal Pátrio, em especial, quando, em concurso material, perpetram outros delitos, vez que atuam norteado pelo dolo - vontade livre e consciente de delinqüir.
Como se vê, a prova colhida é por demais contundente na demonstração e fixação da autoria dos crimes, restando inarredável a certeza de que as mortes foram previamente idealizadas, através de associação criminosa, com o intuito claro de obter a vantagem pecuniária. De modo que, patenteado está o roubo qualificado pelo resultado morte, doutrinariamente denominado de latrocínio, em pleno concurso material com os delitos de ocultação de cadáver e quadrilha ou bando.
O concurso material ou real de crimes, está previsto no art. 69, da Lei Punitiva Pátria, é aquele concurso em que o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não. Nesse caso, as penas privativas de liberdade cominadas aos fatos delituosos realizados pelo agente são aplicadas cumulativamente.
No caso sob exame, os réus em epígrafe, perpetraram mais de uma ação, e não atos, pois a morte de cada uma das vítimas, além de ser anunciada, obedeceu a uma seqüência, dentro de um certo lapso temporal, não foram executadas de uma só vez. Todas foram amarradas e trancafiadas, para em seguida serem eliminadas uma por uma. As mortes das mesmas operaram-se através de ações individuais, demorando uma para outra, cerca de 10 a 15 minutos. Exemplo: a primeira vítima foi retirada do banheiro, em seguida, espancada até desmaiar, por último, lançada na cova clandestina e soterrada. Aí está uma ação isolada. Da mesma forma, e em seqüência, os sicários cruéis procederam com relação às demais vítima. Ou seja, várias ações criminosas.
Atente-se, também, que, além de ter ocorrido ofensa (execução) a bens personalíssimos diversos, as vítimas - no que tange a instrumento usados na chacina - foram executadas de maneira diferente, eis que algumas atingidas a socos, pauladas e enxadadas, enquanto outras foram atingidas a tiros de revólver.
Destarte, não há dúvida da ocorrência de mais de uma ação (concurso material). E, por conseguinte, cada vítima foi objeto de uma ação criminosa, umas mais rápidas, outras mais demoradas, como aconteceu com aquela vítima que após resistir um tiro de revólver, foi desmaiada pelo desalmada réu RAIMUNDO MARTINS DA SILVA FILHO, que aplicou-lhe uma violenta golpe conhecido vulgarmente por "gravata", a altura do pescoço.
Desta forma, é por demais indiscutível a verificação do CONCURSO MATERIAL.
Com relação a concurso material de crimes, vejamos o entendimento da jurisprudência encabeçada pelo Excelso Supremo Tribunal Federal:
"Se o agente comete mais de um crime, com a prática de mais de uma ação, há concurso material de delitos, devendo ser aplicadas, cumulativamente, as penas"(STF - HC - Rel. Firmino Paz - DJU 30;0482 p. 4004).
"O que distingue o concurso material ou real ou real é a pluralidade de resultados puníveis e decorrentes de duas ou mais ações ou omissões típicas, e cada qual configura resultado autônomo, mas todas vinculadas pela identidade do sujeito, sendo independente para cada crime o momento executivo"(TACRIM-SP-AC- Rel. Munhoz Soares - JUTACRIM89/386).
"Sendo distinta da primeira ação do acusado aquela em que mata, desnecessariamente, outra vítima para roubar, não há falar em crime único ou continuado, mas em concurso material de latrocínio"(TJSP--AC-Rel. Marino Falcão - RT 574/327).
ROUBO COM PLURALIDADE DE VÍTIMAS:
"Havendo mais de uma vítima, com ofensas a bens personalíssimos, caracteriza-se concurso material de tantos crimes quanto forem ofendidos"(TACRIM - SP - AC - Rel. Denser de Sá - JUTACRIM 59/259).
"Inexiste continuidade delitiva nos crimes de roubo, quando diversas vítimas atingidas, devendo o meliante responder por delitos em concurso material(JUTACRIM - SP - Rec. - Geraldo Pinheiro - JUTACRIM 46/132).
"São autônomas as penas no caso de concurso material. A cada crime corresponde uma pena, ou seja, em uma infração à lei penal incumbe ao Juiz motivar, no tocante ao seu quantum a pena imposta. Ultimados os processos de aplicação das penas, estas são, somadas ou, nos termos da lei, aert.51, caput(atual art.69), são elas aplicadas cumulativamente"(TACRIM-SP-AC-Rel. Amaral Salles - JUTACRIM 70/250).
De sua vez, o crime de quadrilha ou bando descrito no art. 288, do Diploma Penal Brasileiro, é reconhecido diante da associação estável e mais ou menos permanente ("societas delinquetium"), com a finalidade de prática de delitos da mesma espécie ou não, porém determinados. Foi exatamente o que quedou apurado no vertente caso, uma vez que os réus há de muito vinham se reunindo com o desiderato de cometimento de crimes(latrocínios, ocultações de cadáveres e formação de quadrilha).
A respeito do delito de formação de quadrilha, oportuno e trazer à baila, a orientação pretoriana pátria, "veribs":
QUADRILHA E CONCURSO MATERIAL COM OUTROS DELITOS:
"O crime de quadrilha se tipifica e se consuma pelo só consenso criminoso entre os quadrilheiros, dando-se o concurso material com os delitos de furtos e outros que venham a ser praticados"(TJRJ - AC 3.640 - Rel. Cavalcanti de Gusmão).
"A adesão de grupo marginal, ainda que ocasional, mas tendo cada um de seus membros papel definido, constitui prova da prática de crime de quadrilha ou bando, de cujo conteúdo não se pode abstrair a figura de co-autoria ou ainda da relação causalidade"(TJMS- AC- 391/82 - Rel. Des. Pereira Rosa).
"Bando ou Quadrilha - Caracterização - Falta de habitualidade - Irrelevância ante a preparação estável no propósito criminoso"(TJSP- AC - Rel. Prestes Barra - RJTJSP 68/380).
"Havendo mais de uma vítima, com ofensa a bens poersonalíssimos, caracteriza-se concurso material de tantos crimes quanto forem os ofendidos"(TACRIM-SP-AC- Rel. Denser de Sá - JUTACRIM-59/259).
"Inexiste continuidade delitiva nos crimes de roubo, quando diversas vítimas atingidas, devendo o meliante responder por delitos em concurso material"(TACRIM-SP-Rwec. - Rel. Geraldo Pinheiro - JUTACRIM 46/132).
Esses são os reais e lamentáveis fatos, que retratam de forma cristalina e indiscutível a nojenta e sangrenta tragédia, através da qual, o português LUIS MIGUEL MELITÃO GUERREIRO traiu e atraiu para a morte seis patrícios ou compatriotas, com o fito de roubá-los.
Destarte, se impõe a aplicação de reprimenda ao pervertidos réus, proporcional aos danos irreversíveis causados a cada vítima, levando-se em consideração que nenhuma das extintas concorreu para as cruéis, covardes e desumanas ações criminosas, bem como, a ausência de qualquer motivação. Tudo isso, no âmbito das diretrizes insculpidas no dispositivo 59, do Código Penal Brasileiro.
EX POSITIS, inequivocamente demonstrado a autoria e inconcussamente testificada a materialidade delitiva, esta consubstanciada nos Laudos Cadavéricos que repousam às fls.295/302, R E Q U E R o Ministério Público, através de seus representantes legais in fine assinados, a procedência in totum da presente ação penal nos termos da peça vestibular acusatória que dormita às fls.02 usque 33, o que consiste na justa e eficaz CONDENAÇÃO dos réus LUIS MIGHUEL MELITÃO GUERREIRO, MANOEL LOURENÇO CAVALCANTE, apodado por "CLÁUDIO", RAIMUNDO MARTINS DA SILVA FILHO, LEONARDO SOUSA DOS SANTOS, vulgo "GROSSO" e JOSÉ JURANDIR PEREIRA FERREIRA, nas tenazes do - Art. 157, § 3º, parte final (seis vezes), art. 211, caput (seis vezes) e art. 288, caput c/c os arts. 69 (concurso material)) e art. 62, inciso II, alínea "c" e "d", todos do Código Penal Brasileiro, com a redação dada pelo art. 1º, inciso II, da Lei nº 8.072/90, que cuida de crimes hediondo, por ser uma questão da mais lídima Justiça.
Nestes Termos,
Pede deferimento.
Fortaleza (CE), 15 de janeiro de 2001.
TEODORO SILVA SANTOS
Promotor de Justiça