20-7-2013
ANTÓNIO JOSÉ DA SILVA, O "JUDEU" (1705 - 1739)
GENEALOGIA
Miguel Cardoso (1661 - Pr. n.º 17999), senhor de engenho, c.n., casou com Francisca Coutinho, c.v. ele natural de Torre de Moncorvo e ela de Guimarães, moradores no Rio de Janeiro, e tiveram:
A-P.e Bento Cardoso (1713: Pr. n.º 6285; faleceu nos cárceres em 14-1-1714), que tem dois filhos e duas filhas naturais, de uma preta escrava chamada Esperança
B-Salvador Cardoso (1712 – Pr. n.º 5467), solteiro, que teve com Maria Monteiro, mulher parda:
Isabel Cardoso, solteira (1714 – Pr. n.º 7282)
Miguel Cardoso, casado com Maria Romeira, que têm um filho chamado António (1714 - Pr. n.º 7960), que faleceu nos cárceres da Inquisição em 6 de Setembro de 1715
Diogo Cardoso
Maria Ferreira
Lourença Coutinho
C-Diogo Cardoso, que faleceu solteiro, sem filhos,
D-Isabel Cardoso, que é já defunta e foi casada com Manuel Gomes Mourão, natural e morador no Rio de Janeiro, de quem teve três filhos:
D. Branca Gomes Coutinho (1710 – Pr. n.º 9134), viúva de João Tomás Brum, castelhano, de quem teve
João Tomás Brum (1710 – Pr. n.º 11479), lavrador de cana, casado a 1.ª vez com Clara Isabel de Morais, de cujo casamento teve um filho que morreu logo após o nascimento e 2.ª vez com Jerónima Gomes ou Jerónima Coutinho, sua prima, filha de seu tio Baltasar, de cujo matrimónio lhe ficaram quatro filhos, de que sobreviveram Baltasar, João Tomás Bruno e Isabel, referidos a seguir em sua mulher.
Miguel de Castro Lara (1710 – Pr. n.º 4146), advogado, que casou com sua prima Maria Coutinho, filha de Baltasar Rodrigues Coutinho, e tiveram os filhos indicados em sua mulher.
Ana Gomes (1710 – Pr. n.º 11474) é viúva de Aires de Miranda, lavrador de cana, de cujo matrimónio teve
João Alves Figueiró, advogado (1710 – Pr. n.º 1251)
André de Miranda, sem ofício
Nuno Alves de Miranda, Alferes de Infantaria,
Manuel Gomes, já defunto
Amaro de Miranda Coutinho (1710 – Pr. n.º 11150)
Leonor Rodrigues (1710 – Pr. n.º 8165)
Branca Rodrigues (1710 – Pr. n.º 9095)
Isabel Cardoso (1710 – 11476)
Bertoleja de Miranda (1710 – Pr. n.º 9091), todos solteiros
Catarina de Miranda (1710 – Pr. n.º 6523), casada com Francisco de Sequeira Machado (1708 – Pr. n.º 1892), médico, que tiveram:
Leonor Violante Rosa (1726 – Pr. n.º 4901)
Ana Isabel (1726 – Pr. n.º 7623), gémeas
João Álvares
Brites Isabel
Francisco de Sequeira fora antes casado com Leonor Henriques, de quem tivera:
José Henriques de Sequeira (1712 - Pr. n.º 5277), que é médico em Goa
Fernando Henriques de Sequeira (1715 - Pr. n.º 10142)
Jerónimo Henriques de Sequeira (1715 - Pr. n.º 7887)
Isabel Maria de Sequeira (1712 - Pr. n.º 694)
Maria dos Prazeres Coutinha, que faleceu na Baía, sendo casada com Luis Mendes de Morais, mercador, de quem teve:
Ana Gomes Coutinho (1729 – Pr. n.º 9660), casada com Gaspar Henriques (1726 – Pr. n.º 6486), de quem tem um filho chamado Francisco, de 4 anos
João de Morais Coutinho, solteiro, residente na Baía.
Guilherme Gomes (1712 - Pr. n.º 947), solteiro
Guilherme Gomes de Morão já defunto, foi casado com Branca de Morais (1706 – Pr. n.º 9137), e faleceu no mar vindo preso para a inquisição, de cujo matrimónio lhe ficaram:
Isabel Cardosa, que faleceu solteira e sem filhos
Clara Isabel de Morais, também defunta, 1.ª mulher de João Tomás Brum,
Ana Gomes, solteira
Manuel Lopes de Morais (1711 - Pr. n.º 11793), advogado, ambos solteiros e moradores no Rio de Janeiro.
E-Maria Coutinho, já defunta, foi casada com João Alves Figueira, (1710 – Pr. n.º 1251), advogado e não tiveram filhos
F-Lourença Coutinho, foi casada com Manuel Lopes de Morais, sem ofício, natural e morador no Rio de Janeiro, ambos já defuntos e tiveram uma filha
Clara de Morais Coutinho (1712 - Pr. n.º 965), casada com Luis Vieira de Mendanha Sottomayor, lavrador de cana, de cujo matrimónio teve seis filhos:
Belchior da Fonseca Dória (1712 – Pr. n.º 5340)
Luis Vieira Mendanha (1725 - Pr. n.º 6887), que casou com Clara de Morais e tiveram
José da Fonseca Sottomaior (1725 – Pr. n.º 4089)
José
Salvador,
Luisa Maria Dória (1713 - Pr. n.º 7279)
Manuel Lopes ou Manuel de Mendanha Sottomayor, todos residentes no Rio de Janeiro, excepto Manuel Lopes que estuda em Coimbra
Filhos bastardos que teve Manuel Lopes de Morais em Guiomar Nunes, da Baía:
Diogo, sacerdote, que faleceu em Lisboa;
Leonor Nunes, já defunta e foi casada com Francisco Lopes, da Baía.
Branca de Morais (1706 - Pr. n.º 9137) é viúva de Guilherme Gomes de Morão, de quem tem os filhos nele referidos-
Clara de Morais, já defunta foi casada com António Ferreira, cirurgião, de quem teve dois filhos que faleceram solteiros.
G-Baltasar Rodrigues Coutinho e mulher Berta Cardosa (1712 - Pr. n.º 969) tiveram os seguintes filhos, todos naturais do Rio de Janeiro:
Manuel Cardoso Coutinho (1710 – Pr. n.º 11794), solteiro, sem ofício, que se ausentou para Inglaterra
Diogo Cardoso Coutinho (1712 – Pr. n.º 10168), solteiro, médico, que se ausentou para Inglaterra
Isabel Cardoso (1712 - Pr. n.º 8017, 1726 - 8017-1 e 1737 - 8017-2), casada com Rodrigo Mendes de Paredes (Pr. n.º 5462), moradores em Lisboa, que não têm filhos;
Branca Maria Coutinho (1712 - Pr. n.º 970), casada com Inácio Cardoso de Azeredo (1712 - Pr. n.º 5447), de quem teve uma filha chamada Ana, que faleceu solteira de 17 para 18 anos;
Francisca Coutinho, solteira, (1712 - Pr. n.º 1363), moradora no Rio de Janeiro, que fugiu com sua irmã Maria
Jerónima Gomes, já defunta, que foi casada com João Tomás, sem ofício de quem teve:
Baltasar
João Tomás
Isabel, todos residentes no Rio de Janeiro
Maria Coutinho (1710 - Pr. n.º 9150), é viúva de Miguel de Crasto Lara, advogado, (1710 - Pr. n.º 4146) de quem teve:
João Tomás de Castro (1726 - Pr. n.º 9999), relaxado
Brites Eugénia (1726 - Pr. n.º 1558)
Branca Maria (1726 - Pr. n.º 9920),
Baltazar, que faleceu solteiro
Silvestre e
Thereza, ambos solteiros, que se ausentaram do País com sua mãe, sua tia Francisca e seus tios Manuel e Diogo.
Lourença Coutinho (1712 - Pr. n.º 3458, 1726 - 3458-1 e 1737 - 3458-2) que casou com João Mendes da Silva (1712 - Pr. n.º 11806), advogado, naturais do Rio de Janeiro e residentes em Lisboa, que tiveram:
António José da Silva (1726 - Pr. n.º 8027 e 1737 - 8027-1), relaxado, que casou com Leonor Maria de Carvalho (Pr. n.º 3464), de quem teve Lourença e um menino que nasceu na prisão do S.to Ofício
Baltasar Rodrigues Coutinho (1726 - Pr. n.º 9923), casado com Antónia Maria Teodora, cristã velha, de quem tem Miguel e André, e
André Mendes da Silva (1726 - Pr. n.º 4865 e 1737 - 4865-1), solteiro, que depois casou com Páscoa dos Rios (Pr. n.º 9224), irmã de Leonor Maria de Carvalho, de quem teve uma filha chamada Inês.
Filhos bastardos que teve Baltasar Rodrigues Coutinho em Jerónima de Sequeira, mulher parda:
Manuel Rodrigues Coutinho (1712 – Pr. n.º 9989)
Brites de Jesus (1712 – Pr. n.º 10144)
Por antonomásia, o Judeu é António José da Silva, que sucumbiu no patíbulo da Inquisição aos 34 anos no auto da fé de 18 de Outubro de 1739. Tem sido bastante estudada a biografia dele, embora nem sempre com exactidão.
António Baião deveria ficar algo baralhado com a enorme quantidade de documentação ao seu dispor, sem ter então meios informáticos para a tratar. Não achou o processo do pai, João Mendes da Silva e dá a mãe, Lourença Coutinho, como solteira à data da sua prisão. Calculou mal a idade dos três filhos, erra a data do casamento de António José e omite a condenação à morte em Espanha da mãe da esposa deste, Ana Henriques.
Camilo Castelo Branco toma as liberdades habituais de romancista. Como se costuma dizer “A realidade é mais dura que a ficção”. Também ele omite o relaxe de Ana Henriques e o processo de João Mendes da Silva e faz a Inquisição bastante menos severa do que ela era: põe os familiares a falar e a levar e trazer recados para os presos, o que é absolutamente impossível que acontecesse; os presos apenas falavam com os carcereiros.
Tanto Camilo como Bernardo Santareno vão buscar a figura de Francisco Xavier de Oliveira (1702-1783), o “Cavaleiro de Oliveira” para contracenar com António José da Silva nas suas obras. Mas o desenho de caracteres feito por Bernardo Santareno deve estar bem mais próximo da realidade que o de Camilo.
O relato mais fiel é o de João Lúcio de Azevedo nas “Novas Epanáforas” (pgs. 139-218), que se pode consultar com toda a facilidade na biblioteca digital da BNP. As incorrecções nele são muito poucas. Uma delas é a nota (1) de pags. 207, que está errada: a denúncia de Bento Pereira a que se refere está incluída na transcrição do processo, a pgs. 137 da publicação. Também discordo da afirmação, a pags. 153, de que os Inquisidores “eram juízes rectos”, pois, tenho visto que, às perversidades do processo, acrescentavam eles outras tantas, de sua própria iniciativa.
Têm-se considerado importantes os contributos literários de António José da Silva, relevando-se por exemplo as páginas que lhe consagram Óscar Lopes e António José Saraiva na sua História da Literatura Portuguesa.
O tratamento que António José da Silva teve às mãos da Inquisição não tem muito de extraordinário. No primeiro processo (n.º 8027), escapou ao cadafalso, denunciando quase uma dezena de suas parentes e purgou com o tormento o facto de não ter denunciado sua mãe. No segundo (n.º 8027-1), determinou ele a sua má sorte com os jejuns no cárcere; depois de os fazer, seria preciso humilhar-se muito perante os Inquisidores para salvar a pele e isso iria certamente contra o seu feitio.
Característica dos processos deste tempo (primeira metade do sec. XVIII), é a repetição de processos contra os mesmos réus, sempre que aparecia mais uma denúncia, fosse ela verdadeira ou falsa, coisa que nunca importou aos Inquisidores: bastava que parecesse verdadeira.
Foi também nesta época (como, aliás, referem todos os autores) que aumentou muito o número de prisões no Brasil. No final do séc. XVII, tinham já sido liquidadas praticamente pela Inquisição todas as fortunas dos cristãos novos na Metrópole, parecia oportuno avançar para o Brasil, onde se dizia que tinha recrudescido o judaísmo.
É prova do que fica dito o quadro de “Genealogia” que precede, limitado ao ramo feminino da ascendência de António José da Silva; é enorme o número dos que passaram pelos cárceres da Inquisição.
Penso que há ainda outra razão para o aumento dos detidos no Brasil: é que a viagem para o Brasil (comparando com Angola, por exemplo) era relativamente fácil porque o caminho era relativamente curto (três meses, aproximadamente) e além disso o tráfego de navios era intenso, dado o volume de mercadorias a transportar nos dois sentidos.
Como refere João Lúcio de Azevedo, o recrudescimento das prisões começou do modo tradicional, isto é, através das denúncias. É muito interessante a história (verdadeira) por ele contada da “perra perdigueira”, Catarina Soares Brandão, ou Brandoa, (1706 - Pr. n.º 10124) que em 1698, quando tinha 27 anos, se achou no meio de um casamento com inúmeros convivas, todos cristãos novos e se viu apontada como estranha, embora fosse também parcialmente cristã nova. Disseram-lhe que teria de aderir total e fielmente à Lei de Moisés para salvar a sua alma. Ela assentiu, mas pelos vistos, com muita reserva mental, pois, passados oito anos, denunciaria na Inquisição em Lisboa 131 convivas daquela festa. Acho absolutamente impossível que ela se tenha lembrado de todos aqueles nomes. Parece-me mais lógico que, nos dias seguintes à festa, ela tenha elaborado por escrito uma lista completa dos convivas, com a ideia que lhe poderia ser bastante útil mais tarde como moeda de troca na Inquisição.
Entre os convidados, estavam os pais de António José da Silva que, em 1711, tiveram mandado de prisão, depois de terem acrescido uma ou mais denúncias contra eles. Como refere João Lúcio de Azevedo, a data do mandado de prisão de Lourença Coutinho (16-2-1710) tem de estar errada e o ano será 1711. Vieram do Brasil em navios separados: o pai, João Mendes da Silva veio na nau “Santa Madre de Deus”, Lourença Coutinho, provavelmente com os três filhos, Baltazar, de 11 para 12 anos, André, de 10, e António, de 7, na nau “Candelária”. Marido e mulher deram entrada em 11 de Outubro de 1712 nos cárceres da Inquisição.
João Mendes da Silva, advogado no Rio de Janeiro, tinha fama de bom católico e praticante, apesar de ter sangue de cristão novo. Tinha estudado Teologia e formara-se em Cânones em Coimbra; escreveu poemas e está biografado por Barbosa Machado na Biblioteca Lusitana. Segundo revelam os processos, a esposa, Lourença Coutinho teria mais tendência para o judaísmo. Tentou ele defender-se arguindo ser cristão velho, mas a Inquisição de Lisboa lançou inquirições por todo o lado e ele viu-se obrigado a deixar de lado esse argumento porque sabia ter sangue de cristão novo nos seus antepassados. Depois, marido e mulher defenderam-se do modo tradicional, acusando familiares, amigos e conhecidos; o marido acusado por 20, denunciou 124 pessoas. A esposa, acusada por 30, denunciou 36. Contra ambos, figurava a denúncia de Catarina Soares Brandão, a “perra perdigueira”.
Foram ambos ao auto da fé de 9 de Julho de 1713, juntamente com mais 72 brasileiros, segundo diz João Lúcio de Azevedo. João Mendes da Silva não voltaria a ser incomodado pela Inquisição e faleceu com 77 anos em 9 de Janeiro de 1736, alguns meses antes da prisão dos filhos. Já a esposa, Lourença Coutinho, voltaria lá mais duas vezes.
Ficaram ambos os cônjuges em Lisboa com os filhos, ao contrário de muitos dos seus familiares penitenciados que regressaram ao Brasil. João Mendes da Silva abriu escritório de advogado, ajudado depois pelo filho Baltasar Rodrigues Coutinho, que também se formou em Cânones em Coimbra e veio para Lisboa exercer a advocacia. António José da Silva foi também estudar para Coimbra em 1722 e ali se matriculou quatro anos lectivos. Como demonstrou o Prof. Oliveira Barata, não deve ter regressado a Coimbra depois da sua prisão, não terminou o curso e não podia exercer a advocacia. Poderia sem dúvida ajudar o pai no escritório e terá sido por isso que se declarou como “advogado” na Inquisição. André Mendes da Silva não se formou, disse ter estudado Filosofia por dois anos; no segundo processo, declarou como actividade “Administrador do Paço da Madeira”.
2.ª vaga de prisões na família
Tal como a primeira vaga de prisões da família de António José da Silva, também a segunda teve a sua origem em factos com muito jeito de anedota.
Vizinho da tia Maria Coutinho, vivia um rapaz, estudante em Coimbra, já de 33 anos, chamado Luis Terra Soares de Barbuda, que se dizia cristão velho. Contactando com as filhas daquela, começou um namoro com Brites Eugénia, mais nova uns bons 10 anos. Ficaram noivos, mas ela exigiu-lhe que passasse a ser crente judeu cumpridor dos preceitos da Lei de Moisés, tendo ele reconhecido que também tinha sangue de cristão novo. Foram ambos falar com a tia da moça, Lourença Coutinho, mãe de António José.
Com o passar do tempo, o rapaz deve ter-se arrependido da promessa e, a 22 de Março de 1726, apresentou-se na Inquisição de Coimbra para confessar tudo e denunciar os amigos e amigas de Lisboa (Depoimento transcrito a fls. 7 do pr. n.º 9999, de João Tomás de Castro). Depois fugiu, ignoramos para onde, até porque não aparece o processo que lhe terá sido instaurado em Lisboa.
A 22 de Maio, foram emitidos mandados de prisão das irmãs Brites Eugénia e Branca Maria e do irmão, estudante em Coimbra, João Tomás de Castro. As duas irmãs começaram a confessar e a Inquisição ficou com denúncias suficientes para a 8 de Agosto de 1726, prender Lourença Coutinho e os seus três filhos.
Entretanto Maria Coutinho, mãe dos primeiros três, decidiu organizar a fuga para Inglaterra que envolveu a ela, seus dois filhos mais pequenos, Silvestre e Teresa, a sua irmã Francisca, solteira, e seus irmãos Manuel e Diogo. Esta fuga deixou furiosos os Inquisidores, como era habitual.
Sigamos este primeiro processo de António José da Silva que foi especialmente rápido. A tarefa é fácil, porquanto os dois processos dele estão transcritos na Revista Trimestral do Instituto Histórico e Geográphico Brasileiro, Tomo LIX, de 1896 (1.º e 2.º trimestre). Logo no dia em que foi preso, iniciou as suas confissões, depois de ter sido nomeado seu curador (por ter só 21 anos, portanto menos de 25) o Beneficiado Filipe Néri.
Disse que em casa de uma tia de sua mãe, Esperança de Azeredo (1712 – Pr. n.º 10167), esta o incitou a ter relações sexuais com uma criada dela, dizendo que, segundo a religião judaica, a fornicação simples não é pecado. Denunciou depois os seus três primos, filhos de Maria Coutinho já referidos e ainda um irmão destes, Baltasar, falecido anos antes; Leonor Violante Rosa, também sua prima, e sua irmã gémea, Ana Isabel, filhas de Francisco de Sequeira, médico. Refere a seguir três filhas de Alexandre Soares Pereira, fazendo uma enorme confusão: fala da Leonor, de 17 anos, quando a mais velha se chamava Isabel Maria (1726 – Pr. n.º 10165), que já se encontrava presa tal como sua irmã, Helena Maria (1726 – Pr. n.º 6487), que ele também refere; e de mais uma irmã de que não sabe o nome, que seria então a Leonor… de 6 anos! Denuncia depois seus dois irmãos.
Na sessão da crença, em 16 de Agosto, diz-lhe o Inquisidor que ele está diminuto nas suas confissões. Queria ele dizer que não tinha denunciado sua mãe.
Quem tinham sido os e as denunciantes de António José da Silva?
Entre parênteses, cumpre anotar aqui que nesta data a Inquisição de Lisboa era mais descuidada que antes na documentação dos processos, pois deixou de transcrever as culpas. Ora estas eram descritas na prova da justiça sem indicação do deponente e do lugar, impossíveis assim de identificar. Os elementos que nos sobram para os identificar são uma lista oficiosa dos denunciantes nas primeiras páginas do processo e às vezes (nem sempre) a indicação do deponente e da data do depoimento na publicação da prova da justiça; estes elementos existem no processo de António José da Silva, mas não a transcrição dos depoimentos.
Depuseram contra ele os três irmãos João Tomás, Brites Eugénia ou Brites Cardosa e Branca Maria, Leonor Violante Rosa e irmã Ana Isabel, e o irmão Baltasar Rodrigues.
Após a leitura do libelo, em 23 de Agosto de 1726, disse não ter defesa com que vir e não querer procurador.
A 3 de Setembro de 1726, denunciou Manuel Nunes Ribeiro, estudante de medicina, filho do médico Diogo Nunes Ribeiro (1703 – Pr. n.º 2367), quando pai e filho ou já tinham fugido ou se preparavam para fugir para Inglaterra. Denunciou também Luis Terra Soares de Barbuda.
Na mesma data, disse que não queria que as testemunhas que o tinham acusado fossem de novo perguntadas.
No dia seguinte, a publicação da prova da justiça. Perguntado se queria vir com contraditas, “disse que não tinha contraditas com que vir, nem para que estar com procurador; o que, visto pelos Senhores Inquisidores, o lançaram e houveram por lançado das com que pudera vir e mandaram corresse este processo seus termos ordinários (…)” Esta expressão, usada na época, mas que já caiu em desuso há muitos anos, queria dizer que o Tribunal considerava que o réu desistira definitivamente de apresentar contraditas. Se a expressão for “lançado da defesa”, quer dizer que o réu desistiu definitivamente de apresentar defesa, etc.
A 7 de Setembro, denunciou mais João Álvares, filho do médico Francisco de Sequeira.
A 10 de Setembro, é citado de mais provas da justiça, primeiro de Luis Terra Soares de Barbuda (depoimento de 22-3-1726 em Coimbra) e depois de Ana Isabel (Proc. n.º 7623) de 23-8-1726.
Desta vez, quis arguir contraditas e pediu para isso procurador. Foi-lhe dado como Procurador o Licenciado Brás de Carvalho.
Arguiu contraditas em relação a João Tomás e Luis Barbuda. Em 12-9-1726, nomeou testemunhas. Ainda na mesma data, um despacho recebeu as contraditas apenas por informação.
A 16-9-1726, citação de mais prova: é um depoimento de sua prima Brites Cardosa de 10-9-1726. Desta vez disse que não tinha contraditas, nem queria estar com o Procurador.
Em 18-9-1726, Assento da Mesa, que decide submetê-lo a tormento por não denunciar sua mãe, Lourença Coutinho nem suas tias Isabel e Maria, todas dadas por “cúmplices” pelas testemunhas. Por maioria, foi decidido que sofresse um trato corrido.
De certo modo, a sessão do tormento era favorável ao réu porque lhe garantiria a liberdade: se ele fizesse as denúncias pretendidas, ficariam satisfeitos os Inquisidores; se as não fizesse, teria purgado essa falta no tormento, que era bastante doloroso.
A 23-9-1726, a sessão do tormento, com os preliminares habituais. Foi atado no potro em oito partes, duas em cada membro. O trato corrido da polé corresponde a meia volta de aperto no arrocho do potro. Durou o tormento “um quarto de hora, em o qual gritou muito, e só chamava por Deus e não por Jesus, ou santo algum.” Não denunciou mais ninguém.
Na mesma data, o segundo Assento da Mesa, onde se diz “pareceu a todos os votos, que, visto o réu, confessando suas culpas, dizer de si bastantemente, e de outras pessoas suas conjuntas e não conjuntas, satisfazendo a principal informação da justiça, e assentar bem na crença de seus erros e judaísmo, por que foi prezo e acusado, ele seja recebido ao grémio e união da Santa Madre Igreja e vá ao auto público da fé na forma costumada (…)”.
Segue-se a sentença, anotada no final, da ida ao auto da fé de 13-10-1726. Depois a abjuração em forma (e não “juramento” como foi transcrito na Revista). Não foi assinada, por o réu não poder assinar “por causa do tormento”, ingénua confissão da Inquisição, pouco habitual.
Termo de segredo a 14 e Termo de ida e penitências a 23 de Outubro.
António José da Silva saía em liberdade, enquanto seus irmãos permaneciam presos por mais bastante tempo, assim como sua mãe.
Baltasar e André foram ao tormento mas não denunciaram a mãe como os Inquisidores pretendiam, já que que eram muito fracas as provas contra ela. Foram reconciliados no auto da fé de 25 de Julho de 1728.
Lourença Coutinho foi ao tormento em 3-9-1729, depois de um Assento quilométrico da Mesa da Inquisição de 2-6-1729, confirmado por outro do Conselho Geral de 22 de Julho. Foi atada “perfeitamente” com as oito cordas e o tormento durou “mais de um quarto de hora, em que chamava por Santa Rita, e que pelas chagas de Cristo tivessem dela misericórdia”. Foi reconciliada mas condenada a degredo por 3 anos para Castro Marim, que aparentemente não cumpriu pois, no processo seguinte, disse que não tinha saído de Lisboa. No final do processo, está a revogação da sobrinha Branca Maria, como lhe fora recomendado por um confessor jesuíta, antes de partir para Inglaterra para se juntar a sua mãe. Foi-lhe lida a sentença no auto de fé de 16 de Outubro de 1729, em que foi relaxado o sobrinho, João Tomás de Castro, médico.
O escritor
A vida prosseguiu. António não regressou a Coimbra, mas foi trabalhar com o irmão Baltasar para o escritório do pai e por isso se intitulou “advogado”.
Baltasar tinha casado com uma cristã velha, Antónia Maria Teodora. André casou com Páscoa dos Rios, uma cristã nova que saíra penitenciada no mesmo auto da fé que ele (o processo dela está extraviado na D.G. de Arquivos). Foi assim que António José conheceu uma irmã desta, Leonor Maria de Carvalho, com quem casou por volta de 1735, estava ela grávida da filha Lourença, nascida pouco depois a 25 de Outubro.
Leonor teve uma vida atribulada. Fora denunciada com a mãe e irmãos em 1725, quando tinha 16 anos. A mãe, Ana Henriques (1703 – Pr. n.º 154), um irmão e a família deste, uma irmã e uma tia decidiram fugir para Baiona e ela foi junto com eles. Em Salamanca traiu-as o cocheiro da caleche que tinham contratado e pago e entregou-os à Inquisição. A irmã Páscoa dos Rios não quisera ir com eles e apresentou-se à Inquisição em Lisboa. A mãe, relapsa, foi garrotada e queimada pela Inquisição de Valladolid. Leonor foi reconciliada e condenada a degredo pro forma. Esteve três meses em Vitigudino e depois regressou à Covilhã. O seu processo de Espanha está nos Arquivos em Lisboa, juntamente com o processo de Lisboa.
Não são conhecidos detalhes sobre o que levou António José a escrever peças para o teatro das marionetas do Bairro Alto. Certamente, o teatro já existiria como tal. O gosto pelas letras ter-lhe-á surgido em Coimbra, como era habitual acontecer com os melhores alunos.
Chegaram até nós oito peças escritas por ele para o teatro dos bonifrates, designação popular daquela altura:
Labirinto de Creta
Variedades de Proteu
Guerras de Alecrim e Mangerona
Vida de D. Quixote
Esopaida ou Vida de Esopo
Precipícios de Phaetonte
Amphitrião ou Júpiter e Alcmena
Encantos de Medeia
Foram representadas de 1733 a 1738, ainda em vida do autor, mas anónimas, tendo sido logo publicadas as três indicadas acima em primeiro lugar. Em 1744, foram reunidas em livro. O nome do autor figura em duas décimas, em acróstico, não sabemos se compostas por ele ou por outrem:
Amigo Leitor, prudente,
Não crítico rigoroso
Te desejo , mas piedoso
Os meus defeitos consente:
Nome não busco excelente
Insigne entre os Escritores
Os aplausos inferiores
Julgo a meu plectro bastantes ,
Os encómios relevantes
São para engenhos maiores.
Esta cómica harmonia,
Passatempo é douto, e grave
Honesta, alegre, e suave ,
Divertida a melodia:
Apolo , que ilustra o dia.
Soberano me reparte
Ideias, facúndia, e arte,
Leitor, para divertir-te,
Vontade para servir-te,
Afecto para agradar-te.
João Lúcio afirma com bons argumentos que a Inquisição não fez qualquer ligação do processo ao facto de António José ser autor de peças de teatro e que a autoria seria muito pouco conhecida.
Em 1736, à morte da Infanta D. Francisca, todos os versejadores de Lisboa pegaram na pena e também António José escreveu uma “Glosa ao soneto de Camões “Alma minha gentil que te partiste”, na qual exprime Portugal o seu sentimento na mor da sua belíssima Infanta a Sr.ª D. Francisca” , que foi inserida na colectânea “Accentos saudosos das Musas Portuguezas ao mesmo assumpto”, do impressor António Isidoro da Fonseca.
3.º vaga de prisões na família
Nunca é demais sublinhar a especial ferocidade da Inquisição na primeira metade do séc. XVIII, sob o comando do Cardeal Nuno da Cunha de Ataíde. Sobretudo terrível a persistência em prender as mesmas pessoas quando chegava à Inquisição qualquer nova amostra de prevaricação, verdadeira ou inventada.
Como muitos outros, foram parar à Inquisição António da Fonseca Rego (1729– Pr. n.º 10476), de 48 anos, sua mulher Maria de Valença (1729 – Pr. n.º 1530 e 1737 – Pr. n.º 1530-1), que tinham um filho, de nome Simão Rodrigues da Fonseca – 1736 – Pr. n.º 2919 e 1741 – Pr n.º 2919 – 1 ). Os pais foram penitenciados, ela em 17-6-1731 e ele no ano seguinte, em 6 de Julho de 1732, depois de terem feito copiosas denúncias, inclusive do filho. O marido regressou ao Brasil e a mulher ficou praticamente a viver de esmolas. Acolheu-a em sua casa Páscoa dos Rios, tendo-a acompanhado quando ela casou com André Mendes da Silva. Maria de Valença portava-se mal e era no mínimo ingrata para quem lhe fazia bem. Fez de alcoviteira para um sujeito da Covilhã que perseguia Leonor Maria de Carvalho, e foi dizer a Páscoa dos Rios que o marido namoriscava de longe uma vizinha e, mesmo assim, conseguiu que o filho se lhe juntasse como hóspede da família. Disse ela ao filho que os seus benfeitores eram crentes na Lei de Moisés e tanto lhe encheu os ouvidos que este foi à Inquisição denunciar toda a gente, incluindo a mãe e a tia. Se a mãe tinha mau carácter, o filho deveria ser praticamente desaparafusado da cabeça. Foi à Inquisição chamar os esbirros para apanharem em flagrante seis mulheres a rezar na festa do Quipur (início de Outubro de 1737): a mãe, a tia, a hospedeira Páscoa dos Rios, uma criada e duas visitantes. Foi tudo preso. Depois, foram presos André Mendes da Silva, o irmão António José da Silva, a mãe Lourença Coutinho e Leonor Maria de Carvalho, grávida quase a dar à luz.
Foi também presa uma escrava rebelde de Lourença Coutinho, de nome Leonor, que os denunciara e que também estava grávida. Acabou por dar a luz no cárcere dali a poucos dias e morrer no parto.
Havia ainda outra denúncia de Maria Teresa, ama-de-leite da filha de António José, que se aliou com a escrava contra os patrões.
Antes de prosseguir a leitura do processo de António José da Silva, vejamos o que sucedeu aos outros detidos, que saíram todos no auto da fé de 18 de Outubro de 1739, em que foi executado António José da Silva.
A mãe, Lourença Coutinho, foi presa em 12-10-1737, praticamente apenas com a denúncia de Simão Rodrigues da Fonseca, já que a própria Inquisição deu pouca importância ao testemunho da escrava e da ama-de-leite. Foi levada a tormento que, neste caso, funcionava como “prova” da sua culpa, mesmo que ela nada confessasse, como não confessou.
O irmão, André Mendes da Silva, foi preso a 5-10-1737, com denúncias apenas dos seus “hóspedes” Maria de Valença e filho Simão Rodrigues da Fonseca. Teve o mesmo tratamento de sua mãe, apenas um tormento mais duro e demorado.
A esposa, Leonor Maria de Carvalho, foi presa também a 5-10-1737, com as mesmas denúncias. Tentou defender-se e arguir contraditas, o que não serviu de muito. Teve um tormento mais duro de um quarto de hora e mais meio, e “nele chamava por Jesus e N.ª Sr.ª da Penha de França”. Também aqui o tormento funcionava para os Inquisidores como “prova” das suas culpas.
A cunhada, Páscoa dos Rios, cujo processo está extraviado, saiu no auto de fé de 18 de Junho de 1741, condenada a cárcere a arbítrio e hábito penitencial perpétuo sem remissão e ao degredo de 5 anos para Angola, que não deverá ter cumprido, pois equivaleria praticamente a sentença de morte.
Tem interesse a história de Maria de Valença que ficou 19 (!) anos presa, pois os Inquisidores achavam que teria de ser relaxada como relapsa e, para o evitar, fez um pedido ao Papa que demorou esse tempo todo a decidir.
O segundo processo de António José da Silva
Também António José da Silva foi preso a 5 de Outubro de 1737.
O processo inicia-se com o depoimento da escrava cabo-verdiana Leonor Gomes, que estava “reservada” no cárcere da penitência. Como disse, daí a dias faleceria na sequência do parto.
No ano seguinte, a 12 de Abril, uma denúncia de maior importância: o Alcaide dos cárceres veio dizer à Mesa que o réu estava a fazer jejuns judaicos.
Com o mesmo método e a eficácia do costume, o processo faz a descrição e transcreve os testemunhos de cinco jejuns judaicos de 2 a 17 de Abril; é uma leitura monótona e maçadora que ocupa 178 páginas (!).
A Inquisição usou também outro eficaz método: a colocação de presos bufos como companheiros de cárcere. O primeiro foi José Luis de Azevedo (1738 – Pr. n.º 4975; 1741 – Pr. n.º 4975-1), de 31 anos, natural de Avis. Outro foi Bento Pereira (1738 – Pr. n.º 7756), soldado, de 18 anos, também natural de Avis.
António José confessou ao José Luis que era crente na Lei de Moisés e juntos fizeram uma meia dúzia de jejuns judaicos. Mas depois, o José Luis aborreceu-se e deixaram de se falar.
Bento Pereira disse à Mesa que António José fazia jejuns judaicos, que não fazia quaisquer acções de cristão, que nunca se benzia e que se ria se os outros falavam no nome de Jesus.
Sucederam-se as denúncias de Bento Pereira até que em 12-6-1739, veio à Mesa declarar que António José, passeando no cárcere, cuspia nas imagens sagradas que nele estavam.
Termina aqui (fls. 190) o elenco das culpas do réu. O processo volta atrás para referir o inventário (22-10-1737), a Genealogia (15-11-1737), a sessão in genere (26-11-1737), Exame (3-6-1738) e sessão in specie (19-9-1738).
Em 24-9-1738, foi-lhe lido o libelo e o réu disse que tinha defesa com que vir e queria que lhe fosse dado um Procurador. Foi nomeado o Licenciado José da Mata Freire, com quem esteve dia 25 de Setembro.
Contestou por negação, indicando como testemunhas vários religiosos, que todos afirmaram que sempre o viram fazer acções de católico.
Tem importância documental o depoimento de Fr. Diogo Pantoja, mestre da Ordem de Santo Agostinho, o qual disse “que depois que ele testemunha veio da Índia a última vez, e o comunicava por causa das composições que ele fazia assim no Bairro alto, em casa de um irmão dele testemunha, como na casa do réu, onde ele testemunha ia, achando-o em todas as ocasiões muito comedido e honesto, (…)” Esta a única ligação que existe no processo à actividade do réu de escritor de peças teatrais.
Segue-se a citação da prova da justiça. Há aqui outra irregularidade no processo: está a cópia da prova da justiça entregue ao réu e devolvida, mas não o original.
Tendo sido notificado, o réu e o seu procurador apresentaram as perguntas que desejavam fossem feitas às testemunhas. Como é evidente, todas as testemunhas confirmaram os seus depoimentos, que aliás, lhes foram lidos previamente.
A 7-2-1739, foi-lhe indicado um novo procurador, o Licenciado José Rodrigues Leal.
Para além da defesa, o réu arguiu contraditas para invalidar os testemunhos da escrava e da ama-de-leite, dada a hostilidade que havia da parte delas com os patrões. Indicou para isso testemunhas, entre as quais sua cunhada cristã velha, Antónia Maria Teodora.
Assento da Mesa de 11-3-1739
Foram afastados por inválidos os testemunhos da escrava, a acusação baseia-se exclusivamente nos testemunhos dos familiares que vigiaram os jejuns e do dos “bufos” companheiros do cárcere. Concluem que o réu é herege e deve ser relaxado à Cúria secular.
Assento do Conselho Geral de 13-3-1739
Confirmou a decisão da Mesa.
Não há actividade no processo até à antevéspera do auto da fé.
Em 16-10-1739, foi feita a notificação de mãos atadas e o réu ficou com o Padre Francisco Lopes, da Companhia de Jesus.
A 18 de Outubro de 1739, o auto da fé.
As condenações da família de António José da Silva estão perfeitamente dentro da lógica da Inquisição. Os pais e os irmãos foram condenados pelos testemunhos que havia contra eles, falsos ou verdadeiros, não importa; mostraram o seu “arrependimento” denunciando um número considerável de pessoas. António José da Silva demonstrou a sua crença judaica com as declarações aos companheiros de cárcere e sobretudo com os jejuns que ali efectuou.
Está errada a declaração seguinte de Claude-Henri Frèches: “Le Tribunal n’a pas démontré que la dévotion de son prisonnier était d’un juif pur. Lourença Coutinho et Leonor Maria, son épouse, plus « juives » que lui, a priori, n’ont pas été brulées. » A Inquisição, que pretendia ser um Tribunal, não julgava devoções ou crenças, tinha de se apoiar em declarações ou factos que provavam a crença judaica de quem as dizia ou fazia; era o Regimento que assim mandava. Por isso, apurou a crença judaica dos réus pelas denúncias contra eles e pelas acções que demonstravam essa crença, tal como os jejuns. Sendo um Tribunal, não lhe era lícito presumir tal crença ou devoção.
TEXTOS CONSULTADOS
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