20-6-2006
Geoffrey Hill
(b. 1932)
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Guardian - 70th birthday - Biography
Genesis
I
Against the burly air I strode Crying the miracles of God.
And first I brought the sea to bear Upon the dead weight of the land; And the waves flourished at my prayer, The rivers spawned their sand.
And where the streams were salt and full The tough pig-headed salmon strove, Ramming the ebb, in the tide’s pull, To reach the steady hills above.
II
The second day I stood and saw The osprey plunge with triggered claw, Feathering blood along the shore, To lay the living sinew bare.
And the third day I cried: “Beware The soft-voiced owl, the ferret’s smile, The hawk’s deliberate stoop in air, Cold eyes, and bodies hooped in steel, Forever bent upon the kill.”
III
And I renounced, on the fourth day, This fierce and unregenerate clay.
Building as a huge myth for man The watery Leviathan.
And made the long-winged albatross Scour the ashes of the sea Where Capricorn and Zero cross, A brooding immortality – Such as the charmed phoenix has In the unwinthering tree.
IV
The phoenix burns as cold as frost; And, like a legendary ghost, The phantom-bird goes wild and lost, Upon a pointless ocean tossed.
So, the fifth day, I turned again To flesh and blood, and the blood’s pain.
VI
On the sixth day, as I rode In haste about the works of God, With spurs I plucked the horse’s blood.
By blood we live, the hot, the cold, To ravage and redeem the world: There is no bloodless myth will hold.
And by Christ’s blood are men made free Though in close shrouds their bodies lie Under the rough pelt of the sea;
Tough Earth has rolled beneath her weight The bones that cannot bear the light.
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Genesis
I
Contra o áspero ar caminhei, Onde o rijo oceano ergue a sua carga, Gritando os milagres de Deus.
E primeiro apliquei o mar Ao peso morto da terra; E as ondas prosperaram ao meu rogo, E os rios desovaram a areia.
E onde as ribeiras salgadas se encheram, Duro e obstinado lutou o salmão, Travando a vazante e o sorvo da maré, Por chegar à firmeza dos montes nas alturas.
II Ao segundo dia avistei O mergulho da águia de garra engatilhada, Emplumando sangue ao longo da costa, Para descarnar os músculos vivos.
E ao terceiro dia gritei: “Guardai-vos Da doce voz do mocho e do sorriso do furão, Da curva deliberada do falcão no ar, De olhos frios e corpos em arcos de aço, Sempre prontos a matar.”
III
E renunciei, no quarto dia, A este barro bravio e incorrigível, E construí para o homem um imenso mito, O Leviatã marinho.
E fiz o albatroz de asas em luva Voar sobre as cinzas do oceano, Onde se cruzam Capricórnio e Zero, Uma imortalidade a pairar – Tal como a da Fénix encantada Na árvore que não murcha.
IV
A Fénix arde fria como o gelo; E, tal como um lendário espectro, A ave-fantasma, selvagem e perdida, Debateu-se num oceano sem finalidade.
Por isso, ao quinto dia, voltei À carne viva e à dor do sangue.
V Ao sexto dia, cavalgando Apressado pelas obras de Deus, Colhi com as esporas o sangue do cavalo.
Pelo sangue vivemos, o quente e o frio, Para devastar e redimir o mundo: Nenhum mito sem sangue permanece.
E pelo sangue de Cristo são os homens libertados, Ainda que os corpos amortalhados jazam Sob os rudes golpes do mar;
E que a Terra tenha esmagado ao seu peso Os ossos que não podem suportar a luz.
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Tradução de João Ferreira Duarte, em "LEITURAS, poemas do inglês", Relógio de Água, 1993. ISBN 972-708-204-1 |