18-7-2000

 

Emily Dickinson

(1830-1886)

 

 

Emily Dickinson : uma poética de excesso - Tese de doutoramento de Ana Luísa Amaral

 

A sepal, petal, and a thorn
Upon a common summer's morn --
A flask of Dew -- A Bee or two --
A Breeze -- a caper in the trees --
And I'm a Rose!
 

 

Sépala, pétala, espinho.

Na vulgar manhã de Verão –

Brilho de orvalho – uma abelha ou duas –

Brisa saltando nas árvores –

- E sou uma rosa!

 

 

Afraid!  Of whom am I afraid?
Not Death -- for who is He?
The Porter of my Father's Lodge
As much abasheth me!
 
Of Life?  'Twere odd I fear [a] thing
That comprehendeth me
In one or two existences --
As Deity decree --
 
Of Resurrection?  Is the East
Afraid to trust the Morn
With her fastidious forehead?
As soon impeach my Crown!
 

 

Ter medo? De quem terei?

Não da Morte – quem é ela?

O Porteiro de meu Pai

Igualmente me atropela.

 

Da Vida? Seria cómico

Temer coisa que me inclui

Em uma ou mais existências –

Conforme Deus estatui.

 

De ressuscitar? O Oriente

Tem medo do Madrugar

com sua fronte subtil?

Mais me valera abdicar!

 

 
By a departing light
We see acuter, quite,
Than by a wick that stays.
There's something in the flight
That clarifies the sight
And decks the rays.

 

 

A uma luz evanescente

Vemos mais agudamente

Que à da candeia que fica.

Algo há na fuga silente

Que aclara a vista da gente

E aos raios afia.

 

 

Experiment to me
Is every one I meet
If it contain a Kernel?
The Figure of a Nut
 
Presents upon a Tree
Equally plausibly,
But Meat within, is requisite
To Squirrels, and to Me.

 

 

Experiência para mim

É cada qual que eu encontro.

Será que contém um fruto?

A Imagem de uma Noz

 

Aparece numa Árvore,

Igualmente plausível;

Mas Miolo é requisito

Para esquilos e p’ra Mim.

 

 

 

Fate slew Him, but He did not drop --
She felled -- He did not fall --
Impaled Him on Her fiercest stakes --
He neutralized them all --
 
She stung Him -- sapped His firm Advance --
But when Her Worst was done
And He -- unmoved regarded Her --
Acknowledged Him a Man.
 

 

O Fado mata-o, mas ele não caiu –

Dos dois – o Fado tombou.

E nas mais terríveis varas empalado –

A tudo neutralizou.

 

Morde-O e sapa-lhe o mais firme Avanço

Mas, quando o Pior passou,

E Ele, impassível, o fitou nos olhos,

Por Homem o aceitou.

 

 

Finding is the first Act
The second, loss,
Third, Expedition for
The "Golden Fleece"
 
Fourth, no Discovery --
Fifth, no Crew --
Finally, no Golden Fleece --
Jason -- sham -- too.
 

 

Encontrar – Acto primeiro –

O segundo é perder –

O terceiro  a Expedição

Em busca do Velo de Ouro –

 

O quarto, não descobri-lo –

O quinto, não ter marujos –

E enfim, nenhum Velo de Ouro –

Pois que é mentira Jasão.

 

 
"Heavenly Father" -- take to thee
The supreme iniquity
Fashioned by thy candid Hand
In a moment contraband --
Though to trust us -- seems to us
More respectful -- "We are Dust" --
We apologize to thee
For thine own Duplicity --
 

 

“Pai Celeste – a Ti levade

A suprema iniquidade;

Tua Mão cândida a faz

Em contrabando fugaz –

Por melhor que confiemos

No respeito – “pó seremos” –

Pedir desculpa se há-de

Por Tua Duplicidade.

 

 
How slow the Wind --
how slow the sea --
how late their Fathers be!
 

 

Quão lento o Vento –

Quão lento o Mar –

Quão tardas suas penas em voar!

 

 

I cannot be ashamed
Because I cannot see
The love you offer --
Magnitude
Reverses Modesty
 
And I cannot be proud
Because a Height so high
Involves Alpine
Requirements
And Services of Snow.

 

 

Não posso ter vergonha

Porque não posso ver

Esse amor que me ofereces –

A magnitude

Inverte a Pudicícia.

 

E não posso orgulhar-me

Porque Altura tão alta

Implica Alpinas

Exigências

E os Serviços da Neve.

 

 
  I had no time to Hate --
  Because
  The Grave would hinder Me --
  And Life was not so
  Ample I
  Could finish -- Enmity --
  
  Nor had I time to Love --
  But since
  Some Industry must be --
  The little Toil of Love --
  I thought
  Be large enough for Me --
 
 

Para o Ódio nunca tive –

Tempo –

pois que a Morte espreita –

E a vida nunca foi

tanta

Que uma Aversão se acabasse.

 

Nem tempo tive de Amar –

Ocupar-me

Era preciso –

Do amor o simples Trabalho –

Como achei –

Que Me bastava.

 

 

I have no Life but this --
To lead it here --
Nor any Death -- but lest
Dispelled from there --
 
Nor tie to Earths to come --
Nor Action new --
Except through this extent --
The Realm of you --

 

 

Não tenho mais Vida –

Que a que chega aqui –

Nem Morte – a não ser

Fugida dali.

 

A Terras por vir –

Não presos os pés –

E só neste espaço –

O Reino que és.

 

 

  I lost a World -- the other day!
  Has Anybody found?
  You'll know it by the Row of Stars
  Around its forehead bound.
  
  A Rich man -- might not notice it --
  Yet -- to my frugal Eye,
  Of more Esteem than Ducats --
  Oh find it -- Sir -- for me!
 
 

Um Mundo perdi – há dias!

Será que Alguém o encontrou?

Por Um Diadema de Estrelas,

Se conhece onde ficou.

 

Um Rico – nel’ não repara –

Mas é de tanto Valor

Para os meus Olhos frugais –

Procurai-mo – por favor!

 

 

I'm Nobody! Who are you?
Are you—Nobody—Too?
Then there's a pair of us!
Don't tell! they'd advertise—you know!

How dreary—to be—Somebody!
How public—like a Frog—
To tell one's name—the livelong June—
To an admiring Bog!

 

 

Não sou Ninguém! Quem és tu?

Também – tu não és – Ninguém?

Somos um par – nada digas!

Banir-nos-iam – não sabes?

 

Mas que horrível – ser-se a Alguém!

Uma Rã que o dia todo –

Coaxa em público o nome

Para quem a admira – o Lodo.

 

 

Wild nights! Wild nights! 

Were I with thee, 

Wild nights should be 

Our luxury! 

 

Futile the winds         

To a heart in port, 

Done with the compass, 

Done with the chart. 

 

Rowing in Eden! 

Ah! the sea!         

Might I but moor 

To-night in thee!

 

 

Noites loucas! Noites loucas!

Sozinha contigo

Tais noites seriam

O nosso aconchego!

 

Inócuos – os Ventos –

Dentro do porto –

Fora a Bitácula –

Fora com os Mapas!

 

Remando no Éden –

Ah! O mar!

Se esta Noite – em Ti –

Eu pudesse ancorar!

 

 
   
 

Traduções de JORGE DE SENA, extraídas de "80 poemas de Emily Dickinson", Edições 70, Lisboa, 1978

 

 

I'm Nobody!  Who are you?
Are you -- Nobody -- Too?
Then there's a pair of us!
Don't tell!  they'd advertise -- you know!
 
How dreary -- to be -- Somebody!
How public -- like a Frog --
To tell one's name -- the livelong June --
To an admiring Bog!
 
 
 

Eu sou Ninguém! E tu quem és?

Também tu és – Ninguém?

Então somos dois? Não digas nada!

Haviam de apregoar – sabes!

 

Como é aborrecido – ser – Alguém!

Como é púlico – qual rã –

Dizer-se o nome – Junho fora –

A um Charco admirador!

 

 

 

It was not Death, for I stood up,
And all the Dead, lie down --
It was not Night, for all the Bells
Put out their Tongues, for Noon.
 
It was not Frost, for on my Flesh
I felt Siroccos -- crawl --
Nor Fire -- for just my Marble feet
Could keep a Chancel, cool --
 
And yet, it tasted, like them all,
The Figures I have seen
Set orderly, for Burial,
Reminded me, of mine --
 
As if my life were shaven,
And fitted to a frame,
And could not breathe without a key,
And 'twas like Midnight, some -
 
When everything that ticked -- has stopped --
And Space stares all around --
Or Grisly frosts -- first Autumn morns,
Repeal the Beating Ground --
 
But, most, like Chaos - Stopless -- cool --
Without a Change, or Spar --
Or even a Report of Land --
To justify -- Despair.
 

 

 

 

Não era a Morte, pois eu estava de pé

E todos os Mortos estão deitados –

Não era a Noite, pois todos os Sinos,

De Língua ao vento, tocavam ao Meio-Dia.

 

Não era a Geada, pois na minha Carne

Sentia Sirocos – rastejarem –

Nem Fogo – pois só por si os meus pés de Mármore

Podiam manter frio um Presbitério –

 

E contudo sabia a tudo isso ao mesmo tempo;

As Figuras que eu vi,

Preparadas para o Funeral,

Faziam-me lembrar a minha –

 

Como se me tivessem cortado a vida

E feito à medida de moldura,

E eu não pudesse respirar sem chave,

E foi um pouco como a Meia-Noite –

 

Quando todos os relógios – pararam –

E o Espaço olha à volta –

Ou Terríveis geadas – nas primeiras manhãs de Outono,

Revogam o Palpitante Solo –

 

Mas foi sobretudo com o Caos – frio – Sem-Fim –

Sem Ensejo nem Mastro –

Nem mesmo Novas de Terra -.

A justificar – o Desespero.

 

 

Bloom -- is Result -- to meet a Flower
And casually glance
Would scarcely cause one to suspect
The minor Circumstance
 
Assisting in the Bright Affair
So intricately done
Then offered as a Butterfly
To the Meridian --
 
To pack the Bud -- oppose the Worm --
Obtain its right of Dew --
Adjust the Heat -- elude the Wind --
Escape the prowling Bee
 
Great Nature not to disappoint
Awaiting Her that Day --
To be a Flower, is profound
Responsibility --
 
 

Florescer – é Resultar – quem encontra uma flor

E a olha descuidadamente

Mal pode imaginar

O pequeno Pormenor

 

Que ajudou ao Incidente

Brilhante e complicado,

E depois oferecido, tal Borboleta,

Ao Meridiano –

 

Encher o Botão – opor-se ao Verme –

Obter o que de Orvalho tem direito –

Regular o Calor – escapar ao Vento –

Evitar a abelha que anda à espreita,

 

Não decepcionar a Grande Natureza

Que A espera nesse Dia –

Ser Flor é uma profunda

Responsabilidade -

 

 

   
 

3 últimos poemas: tradução de João Ferreira Duarte, em "LEITURAS, poemas do inglês", Relógio de Água, 1993. ISBN 972-708-204-1 

 

 

 

 

Poet's Choice

By Mary Karr
Sunday, May 18, 2008; BW12

It pains me to say it, but I used to hate Emily Dickinson. Her voice once struck me as cutesy and coy: "I'm Nobody! who are you?/Are you nobody too?" Her meek posture reflected what the Victorian age demanded of women, and I couldn't get past it. (Plus, you can sing most of her opening lines to the tune of "The Yellow Rose of Texas." Try it: "Because I could not stop for death/He kindly stopped for meeee!")

How do you know if your antipathy to a poet is deafness to difficult but rewarding work? Listen to the poet's fans. If they invariably talk about the poet's ideas or historical role, they are steering away from the page, perhaps toward some ideology. Celebrating such a writer may make you feel smart or morally righteous or roguishly avant garde, but chances are, it's work you can skip.

By contrast, Dickinson devotees always seem to reach for a book of her poems. So I listened, learning that Dickinson's prolific, experimental oeuvre results in a low batting average: a few solid thwacks among many pinging mis-hits. Yet in the 1970s, every Dickinson poem seemed to get hallelujahed by the feminist critics then in ascendancy. Bless them for prying open the canon to Dickinson's genius, but they did praise some of her most tiresome noises.

There is constriction in Dickinson's work. Women in her day were corseted to live extra-small. Her finest poems force the reader to a crawl, creating a cramped, psychological space best traversed slowly. As you're trying to figure out what she means, the poem works its emotional alchemy. Here she creates the void of love lost through death or disaffection:

After great pain, a formal feeling comes --

The Nerves sit ceremonious, like Tombs --

The stiff Heart questions was it He, that bore,

And Yesterday, or Centuries before?

The Feet, mechanical, go round --

Of Ground, or Air, or Ought --

A Wooden way

Regardless grown,

A Quartz contentment, like a stone --

For the Nerves to "sit ceremonious like Tombs" blends three ideas in one puzzling phrase. Then from that stasis comes a mechanical move from Earth to open space to "Ought" (ought also suggesting what one should do). This freefall is countered by a heaviness "like a stone" echoing the Tombs of the first stanza.

This is the Hour of Lead --

Remembered, if outlived,

As Freezing persons, recollect the Snow --

First -- Chill -- then Stupor -- then the letting go --

The final line is broken into a stumbling step -- two beats, then three beats, then five. The beloved is wrenched away through paralyzing cold, for which the poem is warming balm.

("I'm Nobody!," as reprinted in "The Life of Emily Dickinson," by Richard B. Sewall. Harvard Univ. Press, 1974. Copyright 1974 by Richard B. Sewall. "After Great Pain" is reprinted in "The Norton Anthology of Modern and Contemporary Poetry," edited by Jahan Ramazani, Richard Ellmann, Robert O'Clair. Copyright 2003 Norton. )

Mary Karr has published four books of poems, most recently "Sinners Welcome."

 

 

                             

 

 

     Emily Dickinson