14-7-2019
La città e la casa, de Natalia Ginzburg, 1984
NOTA DE LEITURA
Dizem
alguns que este é o melhor livro de Natalia Ginzburg. Gostei muito do
livro, escrito e publicado pela autora em 1984, mas para mim o melhor
livro dela é ainda Lessico Famigliare de 1963; a seguir Le
voci della sera, de 1963 e este ficaria em terceiro lugar dos livros
que li da autora.
As
minhas impressões sobre o livro:
Entendo que literariamente é um excelente livro cheio de descobertas na
descrição dos personagens.
Acho,
porém, que a autora toma muitas liberdades literárias. Os acontecimentos
sucedem-se com grande rapidez e acho que são demasiado numerosos para o
período de quatro anos em que decorre a acção. Muitas das cartas são
demasiado extensas para serem escritas por pessoas comuns.
Acho
também que a Autora facilita as coisas quando se trata de os personagens
encontrarem o dinheiro de que precisam para a vida que querem. Ou herdam
uma casa que vendem, ou têm uma herança com que não contavam, ou têm
parentes ricos e assim por diante. O duvidoso filme de Alberico tem, não
se sabe como, um sucesso de bilheteira e os proveitos dão para ele
comprar a casa que fora de seu pai.
Finalmente, o retrato de Lucrezia parece-me mostrá-la demasiado aérea,
saltando de homem para homem, apaixonando-se com a maior das
facilidades. E Piero, o marido é realmente demasiado tolerante.
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Da biografia de Natalia
Ginzburg, escrita por Sandra Petrignani, com o título “La Corsara. Ritratto
di Natalia Ginzburg”, Editore Neri
Pozza, Dezembro de 2017:
La città e la
casa
considerado por alguns críticos o maior êxito na
narrativa de Natalia Ginzburg, é um romance epistolar que conta mais uma vez a
desagregação de um grupo de amigos e das suas famílias. Escrevem-se Giuseppe e
Lucrezia: ele vive em Roma, ela com o marido e cinco filhos numa casa de aldeia
chamada Le Margherite, que é o ponto de encontro de quase todos os personagens.
Escrevem-se entre eles, mas em particular escrevem a Giuseppe também os outros:
Ferruccio, seu irmão, Alberico, seu filho, Piero, marido de Lucrezia e assim por
diante. Giuseppe e Lucrezia tiveram no passado uma relação importante de que
nasceu uma criança. “Tivemos também um filho juntos, Graziano. Tu não queres que
eu o diga, mas é assim. Um filho juntos, e uma grande amizade”, diz ela num
balanço das relações deles. Giuseppe quer por sua vez convencer-se que Graziano
seja filho de Piero, porque é um pai que rejeita esse papel: “Talvez vem tu nem
eu alguma vez fomos adultos, nem Piero. Somos uma ninhada de meninos”, escreve
ele a Lucrezia. Nos quatro anos que decorrem entre a primeira e a última carta
do livro, sucedem muitas coisas. Giuseppe vende a sua casa romana e transfere-se
para Princeton para casa de Ferruccio, que entretanto se casa com Anne Marie,
uma colega: tal como ele ensina matérias científicas na Universidade. Põem-se a
viver todos os três juntos e Giuseppe, além de ensinar literatura italiana no
Campus, começa a escrever um romance que intitula
exactamente
Il nodo.
Escreve com os mesmos modos de Natalia: “À mão, sentado na poltrona, com um
livro grande nos joelhos, e as folhas pousadas sobre o livro. Nunca gostei de
escrever à máquina. Sim, escrevia à máquina os artigos, mas quando escrevia
outra coisa, algo que não era destinado aos jornais, preferia a esferográfica”.
Entretanto, Alberico faz um filme de sucesso,
Devianza, e vai viver com Salvador, seu
companheiro, e uma jovem que vive nas nuvens, Nadia, que faz uma filha sem pai a
quem Alberico decide dar o próprio cognome. “Quero dar aquilo que eu não tive, a
protecção de um pai”, escreve Alberico ao pai. “Fê-lo para ser o contrário de
ti”, escreve a Giuseppe Lucrezia, que entretanto se enamorou de um volátil
Ignazio Fegiz, ligado há anos a Ippolita, dita Ippo, muito mais velha que ele e
imprescindível. Lucrezia deixa o marido Piero, que se desespera e depois se
consola com uma rapariga muito jovem e muito bela. Nasce-lhe de Fegiz outra
criança, que porém morre dentro de dias. Escreve uma amiga a Giuseppe: “Depois
soubemos que havia qualquer coisa estranha no menino. Foi uma tarde tristíssima,
a tarde daquele domingo {…] Já tínhamos perdido a esperança, mas Lucrezia
obstinava-se em crer que nada daquilo que lhe diziam era verdade”.
Entretanto,
tudo se precipita. Na América, morre Ferruccio, de uma trombose cerebral, quando
proferia uma conferência. Giuseppe casa-se com a viúva Anne Marie, estabelecendo
uma relação totalmente desprovida de afecto que porém é do agrado de ambos. Por
motivos pouco claros mesmo à Polícia, numa rixa de rua, “estando gente que
estava a olhar, mas sem que alguém se movesse”, morrem num primeiro momento
Nadia e também Salvatore, assim como Alberico, que correra a ajudá-los.
Entretanto Anne Marie morre também ela, numa clínica, de leucemia. As últimas
palavras de Giuseppe a Lucrezia são: “Agora tudo parece incerto e não sei como
orientar-me no emaranhado dos meus pensamentos”.
“Vão abaixo os destinos, ficam as coisas. Os
objectos permanecem. Talvez estragados, mas ali estão”, é assim que Natalia
Ginzburg resume La città e la casa,
logo
depois de publicado pela Einaudi, a Severino Cesari que a entrevista para o
Manifesto
de 18 de Dezembro de 1984. E a Silvia Del Pozzo no número de
Panorama, que
fecha o ano, explica: “A cidade é o símbolo do cruzamento das relações, a casa
representa a intimidade da pessoa”. Escreveu de Maio a Setembro, nas primeiras
horas da manhã, com café e cigarros ao alcance da mão.
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Em La città e la
casa Giuseppe, quando toma conhecimento
do casamento de Ferruccio, escreve ao amigo
Piero: “Tinha imaginado eu e o meu irmão sozinhos, e afinal, não será assim. Num
átimo, esta imagem caiu em pedaços”. A imagem sonhada – o desejo – cai em
pedaços como um espelho que se parte, desfaz-se em muitos “pedacinhos de restos
do pão da vida”, a sua e a dos outros personagens. “Não há nada pior que pensar
no próprio rosto com raiva e evitar os espelhos”, porque os espelhos, quando
miraculosamente estão inteiros dão de volta uma figura inteira que já é
intolerável. Escreve Giuseppe a Piero:” Tens de saber que tens em mim um amigo
fiel, mesmo se no passado, embora permanecendo teu amigo, te traí, no sentido
que tu sabes. Não é que eu seja alguém que passa tendo o cuidado de não ferir,
não pisar, não destruir e nunca fazer mal a ninguém. Não é verdade. Também eu
destruí e pisei muito do que me aparecia pela frente. De facto, quando me
levanto de manhã, a primeira coisa que encontro em mim é um profundo desprezo
pela minha pessoa, pelos meus pés nas chinelas, pela minha cara triste no
espelho, pelas minhas roupas na cadeira”. Só a judia Anne Marie, cujo pai morreu
num campo de concentração na Alemanha e que reagiu entrincheirando-se numa
cómoda frieza, consegue ver-se ao espelho sem sofrer. “Diante do espelho da
entrada, Anne Marie, coloca na cabeça a boina e aperta-a contra a orelha”, com
um eterno sorriso, indiferente a tudo e a todos. Naturalmente Anne Marie tem uma
péssima relação com sua filha. Com os filhos não bastam sorrisos de
circunstância, não se pode olhar o espelho sem realmente se verem. Mas também é
verdade, explica à pressa Giuseppe tentando absolver-se como pai, que “em todo o
lado em que guardas coisas, encontras infâncias difíceis, insónias, nevroses,
problemas”. E “o afecto que nos dão”., diz um outro personagem, “é sempre pouco
para as necessidades que dele temos”.
La città e la
casa – resumo das 94 cartas
ANO 1
15 Outubro
Giuseppe –
protagonista – vai para os USA vendeu o apartamento aos Lanzara – tem um filho
Alberico que é homosexual
Ferruccio –
irmão de Giuseppe
Lucrezia – não vive em Roma – foi amante do
protagonista –tem 5
filhos: Augusto, Graziano, Cecilia, Daniele,
Vito, casada com Piero – tem muitos amantes .
Piero, casado
com Lucrezia
Serena -
solteira
Roberta –
vizinha de baixo --- prima de Giuseppe, vai à América quando o irmão morre
Adelmo, amigo
de Alberico
Zia Bice –
tia
Egisto –
amigo de Giuseppe e de Lucrezia e de Piero, é jornalista
Ignazio Fegiz
– restaura quadros. Tem uma amiga mais idosa (Ippolita) a quem está muito ligado
Albina –
solteira, vive em Luco dei Marsi
Rainer –
loiro realizador do filme de Alberico
Nadia,
grávida, tem pai rico
12 Novembro -
Ferruccio diz que se vai casar com Anne Marie Rosenthal, viúva, tem uma filha;
casa em Filadelfia
1 Dezembro
Giuseppe escreve de New York
Vai para
Princeton viver com o irmão e cunhada
Giuseppe
escreve um romance
Chantal,
filha de Anne Marie casada com Danny
ANO 2
15 Janeiro
Roberta escreve a Alberico
29 Janeiro –
têm a notícia que faleceu Ferruccio – Roberta vai à América
Início
Fevereiro – Lucrezia apaixona-se por Ignazio Fegiz
27 Fevereiro
- Giuseppe escreve a Alberico respondendo a uma sua carta
Marzo –
Roberta propõe a Giuseppe que volte para Itália
9 Marzo –
nasce a menina de Chantal
6 Junho –
Ignazio Fegiz escreve a Giuseppe
Alberico dá o
seu apelido à filha de Nadia, aporfilha-a
20 Julho –
Lucrezia apaixona-se por Ignazio Fegiz
25 agosto
-Piero diz a Giuseppe que Lucrezia foi embora de casa mas não sabe para onde
Decidiram
separar-se
30 Agosto
Giuseppe diz a Piero que ele e a viúva do irmão juntaram os trapinhos
22 settembre
– Roberta escreve a Giuseppe que o seu filho Alberico faz análise
10 Outubro –
Lucrezia escreve a Giuseppe que procura uma casa
20 Outubro –
Giuseppe escreve a Lucrezia che se vai casar com Anne Maria
12 Dezembro –
Lucrezia conclui que a paixão por Ignazio Fegiz valia pouco ou nada
Mas está
grávida dele
28 Dezembro –
Giuseppe a Lucrezia – Chantal filha de Anne Marie separou-se do marido
ANO 3
22 Janeiro –
Albina escreve a Egisto as razões por que se casa com Nino Mazzetta
"Avere il
letto difficile", diz Albina
2 Fevereiro –
Giuseppe escreve a Lucrezia que foi visitar Danny a New York
5 aprile – a
criança de Lucrezia nasceu mas morreu passados dois dias
25 Junho –
Giuseppe felicita o filho pela estreia do seu filme
4 Julho –
Roberta escreve a Giuseppe sobre o filme de Alberico
10 Julho –
Lucrezia idem
20 Julho –
Morre Nadia, a mãe solteira. Os pais de Nadia levam a netinha.
15
Outubro – Giuseppe escreve a Lucrezia.
Conta
que teve uma relação uma vez com Chantal, a filha da sua mulher Anne Marie.
22 Dezembro –
Lucrezia escreve a Giuseppe.
Conta que Alberico quer comprar a casa que fora do pai
27 Dezembro –
Alberico escreve ao pai
ANO 4
7 Janeiro –
Giuseppe escreve ao filho Alberico. Diz que Anne Marie tem leucemia
13 Janeiro –
Piero escreve a Giuseppe.Giuseppe veio a Roma só 3 dias.
15 Janeiro –
Egisto escreve a Ignazio Fegiz – Morreu Alberico assassinado a 7 de Janeiro . Na
rixa morreu também Salvador. Giuseppe veio da America para o funeral.
2 Fevereiro –
Egisto escreve a Albina. Encontrou no funeral Giuseppe muito envelhecido
20 Fevereiro
– Giuseppe escreve a Lucrezia.
Diz que Anne Marie morreu a 16 de Fevereiro. Convive com Danny.
5 Marzo –
Lucrezia escreve a Giuseppe