12-12-2009
D. Francisco de Sousa Coutinho
(1597 - 1660)
Francisco de Sousa Coutinho foi o principal Embaixador de D. João IV. Colocado no poder pela Restauração da Independência, o Rei tinha necessidade de se afirmar perante as potências europeias, nomeadamente a França e a Holanda. Tinha ainda que ganhar a guerra da Restauração contra a Espanha e conseguir o reconhecimento da Santa Sé, tarefa que exigia um grande tacto diplomático.
Francisco de Sousa Coutinho era um antigo conhecimento de D. João IV. Desde 1623, representara a Casa de Bragança em Madrid, junto da Corte dos Filipes, com o título de “regedor”. Foi ele que negociou o casamento de D. João com D. Luisa de Gusmão em 1632, casamento depois celebrado em 12 de Janeiro de 1633. Foi por isso de toda a lógica que, assumido o poder, o Rei escolhesse Sousa Coutinho como seu Embaixador; deu-lhe poderes acrescidos, de primeiro entre iguais, e atribuiu-lhe o título de Embaixador extraordinário às partes setentrionais.
Francisco de Sousa Coutinho nascera em 1597 nos Açores, na Ilha de S. Miguel, filho de Gonçalo Vaz Coutinho, Governador de Angola e dos Açores e de Maria Jerónima de Morais. Teve um tio paterno célebre, Manuel de Sousa Coutinho (1555-1632), que, depois ingressou na vida religiosa, ficando conhecido como o escritor Frei Luis de Sousa.
Casou em Madrid com Maria de Herédia y Aguila, de quem teve uma única filha, Joana Teresa Coutinho, que casou em primeiras núpcias com Diogo Fernandes de Almeida, Alcaide mor de Santarém e Golegã, de quem teve dois filhos, e em segundas com Francisco de Contreras, de quem não teve descendência.
Não frequentou a Universidade, mas foi educado em casa, pois escrevia e podia exprimir-se em Latim. Mais tarde, quando partiu para a Suécia, aprendeu Francês e, quando foi mandado para Roma, aprendeu Italiano.
Não foi um literato, mas deixou centenas de longas cartas, das quais muitas permanecem em manuscritos e que são do maior interesse para a história daquela época.
SUÉCIA
A 18 de Março de 1641, partiu de Lisboa para os países nórdicos, Dinamarca e Suécia, uma embaixada chefiada por Francisco de Sousa Coutinho. Levava por secretário o Dr. António Moniz de Carvalho, Juiz e bom latinista. Tinha por missão conseguir que aqueles dois países reconhecessem a recém-conquistada independência de Portugal e o seu Rei, D. João IV; e estabelecer relações comerciais, para obter os produtos de que o nosso País necessitava.
Ainda antes de ele partir, tinha-se dado um infausto acontecimento que ensombrou o reinado de D. João IV. Em meados de 1634, o irmão de D. João IV, o Infante D. Duarte, decidira partir para a guerra para combater no exército imperial na Guerra dos Trinta Anos, também ao lado de Espanha. Participou ele em várias batalhas nos anos de 1635 a 1638. Nesse ano, veio a Portugal, mas ficou muito pouco tempo. Regressado às fileiras, foi nomeado Coronel de um Regimento de Cavalaria. Ninguém o avisou da Restauração. Quando a notícia desta chegou a Madrid em 7 de Dezembro de 1641, Filipe IV pediu ao Imperador que o prendesse, o que este fez em 4 de Fevereiro de 1641. Mais tarde, Fernando III vendeu-o aos espanhóis por 40 000 cruzados. Acabou por morrer no cativeiro em Milão, em 3 de Setembro de 1649, quando já estava negociada a compra da sua liberdade. Até essa altura, tinham sido em vão todos os esforços feitos para o libertar.
Em Copenhaga, onde chegou a 12 de Abril, Sousa Coutinho foi muito bem acolhido, mas não conseguiu ser recebido oficialmente pelo Rei Cristiano IV. Este tinha recomendações dos seus aliados espanhóis para o prender, se para isso tivesse oportunidade. Ofereceu-lhe no entanto um banquete, por amabilidade. A 9 de Maio, prosseguiu a viagem para a Suécia.
Na Suécia, aliada da França, tudo correu bem. Foi recebido a 10 de Junho solenemente pela Rainha Cristina, a quem saudou em Latim, tendo-lhe o chanceler respondido na mesma língua. Nos dias seguintes, decorreram a bom ritmo as negociações para a redacção do tratado de amizade e de livre comércio e navegação, embora o título fosse apenas o de um tratado de paz (Colecção, pags. 50-81).
Sousa Coutinho tentou conseguir o auxílio sueco em dois pontos: que, no tratado de paz com o Imperador fosse incluída uma cláusula a respeito de Portugal, e que fossem feitas diligências para a libertação do Infante D. Duarte. O governo sueco manifestou boa vontade, mas não tomou qualquer compromisso formal. Sousa Coutinho publicou então a 24 de Julho um manifesto, em forma de carta aberta à Dieta de Ratisbona (Anexo 1), pedindo a libertação do Infante. O manifesto foi mais tarde publicado em Lisboa em tradução portuguesa.
O tratado foi assinado a 29 de Julho; e a 3 de Agosto, o embaixador foi recebido pela Rainha em audiência de despedida. São mencionadas nos artigos 5.º e 6.º as mercadorias que mais interessam aos dois países:
- Armas, munições e cereais suecos podem entrar em Portugal, livres de direitos, mas os artigos para equipamento de navios são sujeitos aos direitos pagos por outras nações amigas;
- Os súbditos suecos podiam adquirir em Portugal sal, especiarias, perfumes, vinhos e prata, em troca das suas mercadorias e podiam levar o saldo em dinheiro; mas os portugueses que comprassem mercadorias na Suécia pagariam direitos.
Sousa Coutinho negociou ainda uma larga compra de armamento. Finalmente, em 20 de Agosto, partiu para Portugal, acompanhado pelo embaixador sueco recém-nomeado para Lisboa. Aqui desembarcou em 5 de Novembro.
PAÍSES BAIXOS
Logo após a Restauração surgiu a necessidade urgente de negociar com os holandeses, ou melhor, as Províncias Unidas, como se chamava a Federação. Eram um país pequeno, mas poderoso, porque muito ousado. Inimigos dos espanhóis, tinham estado à vontade para atacar as colónias portuguesas, enquanto Portugal esteve ligado a Espanha.
Ao contrário dos portugueses que eram lentos na exploração dos territórios coloniais, os holandeses eram rápidos e eficientes. Fundaram duas Companhias, uma para as Índias Orientais (1602) e outra para as Índias Ocidentais (1624), que se ocupavam não apenas do comércio, mas também da conquista dos territórios por todos os meios, legítimos ou não.
No Brasil, tinham mesmo tomado a capital, a Baía, que a seguir perderam. Tomaram Pernambuco e mais quatro capitanias. Em 1637, foi para o Brasil um grande governador, Maurício de Nassau e diz-se que, se tivesse recebido meios para isso, poderia ter conquistado o Brasil inteiro. Para além da exploração da terra, faziam pirataria no mar às claras e assaltavam navios espanhóis e portugueses, que esvaziavam.
No Oriente, tiveram ainda mais sucesso, tendo conseguido apoderar-se da maior parte do comércio das especiarias. Ocuparam as Molucas e estavam a preparar-se para tomar conta de Ceilão, aliando-se com os locais contra os Portugueses, até que dali nos expulsaram em 1658.
Após a Restauração, Portugal tinha todo o interesse em chamar a atenção dos holandeses para que agora já não éramos seus inimigos, mas que deveríamos fazer uma frente comum contra os espanhóis. Logo a 21 de Janeiro de 1641, D. João IV, em carta dirigida aos Estados Gerais, nomeou Embaixador Tristão de Mendonça Furtado. Os Estados Gerais corresponderam e a 27 de Fevereiro ordenaram aos seus súbditos que não fizessem guerra aos portugueses, nem lhe tomassem os seus navios.
Depressa, porém, se concluiu que diziam uma coisa e faziam outra. Sobretudo, não tinham nenhuma intenção de abdicar dos territórios conquistados no ultramar. Tristão de Mendonça Furtado, porém, negociou como se isso ainda fosse possível. E Portugal não quis um Tratado de paz, mas apenas uma trégua de dez anos, para depois se negociar a paz (Tratado que só veio a ser assinado em 30 de Julho de 1669).
Foi o Tratado assinado a 12 de Junho de 1641 (Colecção dos tratados, vol. I, pags. 25-49). Mas havia nele uma cláusula segundo a qual, os holandeses poderiam prosseguir as conquistas até que chegassem ao ultramar notícias das tréguas.
Possivelmente, já se desconfiava em Lisboa da boa fé dos holandeses. E, de facto, a 25 de Agosto de 1641, uma frota holandesa tomava Luanda, obrigando toda a população branca a fugir para Massangano. Era mais um passo no caminho para a conquista de todo o território do Brasil, já que, para cultivar o açúcar, era preciso ir buscar a mão-de-obra escrava a Angola.
Assim, se tudo lhes corresse pelo melhor, os holandeses tomariam conta do Brasil e de Angola e estariam prontos a declararem-se amigos de Portugal, por nos deixarem o Continente. Felizmente, as coisas melhoraram, não só pelos méritos da diplomacia, mas sobretudo pelos heróicos combatentes de Pernambuco, com destaque para os combatentes pretos e índios que se portaram como heróis na luta para expulsar os holandeses.
Era preciso, porém, vigiar os holandeses muito de perto. D. João IV enviou o embaixador residente em Haia, Francisco de Andrade Leitão, à Dieta de Munster, juntamente com Luis Pereira de Castro, na esperança de conseguir resultados da paz, e ainda a libertação de seu irmão D. Duarte. Esperanças vãs, como se viu.
No intuito de prosseguir as negociações com vista a um tratado de paz, foi D. Francisco de Sousa Coutinho enviado em Maio de 1643 para Haia, onde chegou no princípio de Julho. Segundo a sua instrução “secreta”, os assuntos a tratar pela sua missão seriam:
a) Conseguir que os plenipotenciários portugueses fossem admitidos à Dieta de Munster, e que Portugal fosse incluído em qualquer tratado de paz que fosse assinado com Castela;
b) Negociar uma paz perpétua com a Holanda;
c) Obter a devolução pelos holandeses das praças por eles tomadas antes e depois da Restauração.
Era portador de elevadas somas para subornar quem desse mais jeito, nomeadamente o Príncipe de Orange. Na pretensão da restituição das praças em poder dos holandeses, poderia abandonar a reivindicação das praças da Índia, de que os holandeses tiravam grandes proveitos e os portugueses, muito pequenos, e fazer convergir os seus esforços sobre a recuperação do Brasil, podendo oferecer para esse fim dois milhões de cruzeiros à Companhia das Índias Ocidentais.
Sobre o pedido de restituição das praças, os holandeses responderam que isso não era com eles mas com as duas Companhias.
Logo a seguir, Sousa Coutinho ficou furioso, quando se soube que em Angola, os holandeses tinham atacado em 17 de Maio de 1643 os portugueses refugiados em Bengo e feito prisioneiro o governador da colónia, Pedro César de Menezes. Na realidade, o ataque ofendia o tratado de tréguas celebrado dois anos antes com Portugal. Para além do mais, os holandeses roubaram aos portugueses do Bengo um valioso tesouro em ouro e prata no valor de cerca de 100 000 cruzados.
A concessão da Companhia Oriental terminou em Janeiro de 1644 e a da Ocidental em 1645. Sousa Coutinho queria evitar a renovação dos respectivos contratos sem que se chegasse a acordo com Portugal.
No Oriente, os holandeses nunca tinham observado a trégua; pelo contrário, tencionavam expandir as suas conquistas, nomeadamente em Ceilão, onde tinham apenas a fortaleza da Galé.
A um protesto de Sousa Coutinho em 1644, haviam eles respondido com um memorial em Junho do mesmo ano dirigido ainda a Francisco de Andrade Leitão, diziam considerar legítimas as conquistas de Angola, S. Tomé e Maranhão.
Em Outubro, Sousa Coutinho recebeu a resposta aos seus memoriais: os holandeses não queriam cessar as hostilidades na Índia, sem primeiro averiguar se a fortaleza da Galé tinha terras adjacentes. Diziam eles que, nos termos do art.º 12.º do Tratado de 1641, eram legítimos possuidores das terras entre as fortalezas de Galé e de Colombo, ou seja, metade das mais ricas terras de toda a ilha. Sousa Coutinho propôs a submissão do caso à arbitragem de Luis XIV, ao que se opuseram os Estados Gerais.
Entretanto, valeu ao embaixador a ajuda de um novo enviado francês o Conde d’Estrades, que chegou a Haia em Janeiro de 1645.
Estabeleceu-se um acordo nos termos seguintes:
a) Cessação das hostilidades na Índia;
b) Entrega por Portugal, de uma certa quantidade de canela à fortaleza da Galé, até se decidir a causa principal;
c) Os holandeses da Galé apenas terão as terras que estavam na sua posse aquando da publicação das tréguas;
d) Serão restituídas as terras tomadas depois da data da trégua.
Na minuta do contrato, apareceu depois outra cláusula, segundo a qual os holandeses da Galé teriam acesso às terras em litígio. Sousa Coutinho conseguiu que a cláusula fosse retirada, mas em sua substituição, aceitou uma outra, em virtude da qual, se as autoridades locais das duas nações na Índia tivessem realizado qualquer acordo, seria válido o contrato lá celebrado no que tocava a Ceilão e restituições (art.º 9.º).
Sousa Coutinho pensou que esta era uma hipótese impossível; mas enganou-se e foi enganado pela Companhia.
O tratado foi assinado a 27 de Março de 1645 (Colecção, pags. 118-129). Foi muito mal recebido em Lisboa, onde não havia consciência do enorme poder dos holandeses e da fraqueza de Portugal.
Meses mais tarde, mas ainda em 1645, soube Sousa Coutinho que as autoridades portuguesas da Índia tinham acedido a dar aos holandeses metade da canela produzida nas terras situadas entre as fortalezas das duas partes. Este acordo está datado de 10 de Novembro de 1644 e, por isso, os holandeses já o conheciam quando foi assinado o tratado de 1644. Este tratamento, mais favorável do que o previsto no Tratado, acabou por prevalecer em virtude do já referido art.º 9.º.
Quando, em Lisboa, D. João IV soube do ocorrido, ordenou a paragem de todas as negociações. Parecia que Sousa Coutinho seria demitido a seguir.
Chegavam entretanto a Haia as notícias das primeiras vitórias no Brasil contra os holandeses. Estes consideravam o facto uma infracção grave ao tratado das tréguas (1641) e Sousa Coutinho ficou no meio de um ambiente muito hostil. Propôs então às Províncias Unidas a compra dos territórios ocupados pela Companhia no Brasil, mas não obteve resposta. Depois, de acordo com o Padre António Vieira, defendeu a entrega de Pernambuco à Companhia, mantendo Portugal o domínio de todo o restante território brasileiro. Era perder um braço para salvar a vida. Esta proposta foi muito mal vista em Lisboa e ainda mais na Baía e no Rio de Janeiro, onde Sousa Coutinho passou a ser chamado o "Judas do Brasil".
Uma das tácticas holandesas no Brasil, foi enviar para lá como colonos judeus portugueses; Lúcio de Azevedo diz que em 1642, para lá foram da Holanda, 600.
Toda a questão das negociações foi, porém, alterada pelas vitórias conseguidas nas duas batalhas de Guararapes, a primeira a 19 de Abri de 1648 e a segunda em 19 de Fevereiro de 1649. Havia agora a possibilidade de derrotar os holandeses e expulsá-los do Brasil pela força das armas, embora Sousa Coutinho não acreditasse nessa hipótese.
Fora entretanto enviada para Angola uma frota sob o comando de Salvador Correia de Sá.
A 31 de Julho de 1648, recebeu Sousa Coutinho ordem de Lisboa mandando-o retirar e nomeando D. Luis de Portugal (1601-1660), neto do Prior do Crato, embaixador extraordinário, com Francisco Ferreira Rebelo, como agente. Mas, pouco depois, Sousa Coutinho recebeu ordem para continuar em Haia.
A 29 de Dezembro de 1648, chegou a Haia a notícia de que Salvador Correia de Sá havia tomado Luanda aos holandeses em 26 de Agosto anterior, o que indispôs ainda mais os holandeses contra o Embaixador. Cinco províncias votaram por uma declaração de guerra contra Portugal.
Fora entretanto celebrada a 24 de Outubro de 1648, a paz de Vestfalia, que terminou a Guerra dos Trinta Anos, agregando os tratados de Osnabrück e Munster. A guerra prosseguiu, porém, entre a França e a Espanha, e só acabou em 1659, com o Tratado dos Pirenéus.
A posição de Sousa Coutinho era cada vez mais delicada, até porque ele estava convencido da necessidade de fazer concessões aos holandeses. Isto não era totalmente verdade, porque se augurava a possibilidade de obter uma completa vitória militar no Brasil. E, de facto, chegou depois a notícia da segunda batalha de Guararapes, a 19 de Fevereiro de 1649, como referido. Também em S. Tomé, os habitantes tinham expulso da ilha os invasores holandeses.
Em 20 de Abril, Sousa Coutinho recebeu uma carta régia mandando-o recolher e retirando-lhe todos os seus poderes. A 9 de Julho fez as suas despedidas, mas teve de permanecer, esperando que lhe mandassem dinheiro de Portugal, para pagar as suas dívidas, pois o seu ordenado estava treze meses atrasado.
Em Novembro do mesmo ano (1649), recebeu instruções para continuar no seu posto. Mas em Janeiro de 1650, insistiu pela sua retirada. Verificava ele que a opinião pública em Portugal era contra qualquer composição com os holandeses, confiando na derrota total destes no Brasil. Isto considerava Sousa Coutinho inexequível. Só em Setembro de 1650 é que chegou António de Sousa de Macedo para tomar conta da Embaixada.
De Edgar Prestage, cito a apreciação sobre o trabalho de Sousa Coutinho em Haia:
“À coragem e talento diplomático de Sousa Coutinho ficou devendo Portugal em grande parte a reconquista definitiva da sua mais importante colónia e os brasileiros o verem-se livres dum domínio estranho, que lhes era antipático.
Evitou que os Estados enviassem socorros quando estes podiam salvar a causa da Companhia e deu tempo a que os colonos, auxiliados pela metrópole, ficassem em condições de alcançar a vitória.”
FRANÇA
No início de 1651, Francisco de Sousa Coutinho é mandado para Paris, levando ainda como Secretário o Dr. Feliciano Dourado.
Em termos de negociações com o a França na altura, estava em causa a possibilidade de uma liga Portugal – França – Suécia contra a Espanha, mas D. João IV não se queria empenhar muito em tal aliança e sobretudo não estava disposto a qualquer tipo de acções ofensivas. A França sugeria-lhe que colaborasse num ataque a Nápoles, cidade que estava pronta a revoltar-se contra Filipe IV de Espanha. Queria também que Portugal pagasse 2 400 000 escudos franceses. Nessa altura, por volta de meados de 1652, Sousa Coutinho veio a Lisboa para receber ordens. Apenas lhe prometeram 100 000 cruzados e com tão pouco recusou-se a regressar a Paris.
Regressou depois a Paris em Setembro de 1653, prometeu fazer um primeiro pagamento para a Liga, mas nunca o chegou a fazer.
O Cardeal Mazarino foi às nuvens com o procedimento português. Enviou para Portugal o Cavaleiro de Jant, com a missão de conseguir o dinheiro que queria para a Liga e desde logo, pedir a substituição de Sousa Coutinho
Diz Tessier na sua biografia do Cavaleiro de Jant:
« La seule satisfaction que Jean IV entendait accorder à la France, était le changement de D. Francisco de Souza Coutinho. Le Roy... dit hautement qu'il n'est point satisfait dudit ambassadeur, mais il nous faut d'autres victimes que le sacrifice que l'on veut faire de celui qui est encore à Paris, n'y ayant que l'eau del Ryo de la Plata ou las Pastillas del Pyrou qui puisse laver et parfumer les mauvaises odeurs qu'il laissera de sa personne à sa sortie de France».
ROMA – SANTA SÉ
Após a Restauração, considerou D. João IV de imperiosa necessidade que a Santa Sé reconhecesse a independência de Portugal, de novo adquirida, enviando para Lisboa um Núncio Apostólico e recebendo em Roma com toda a dignidade um Embaixador da Nação Portuguesa. Infelizmente, a tarefa não era assim tão fácil como primeiro se julgava. A Espanha continuava a ser uma nação muito poderosa e o Vaticano pensava que o poderio deles conseguiria esmagar Portugal como se fosse um gafanhoto.
Não faltaram, porém, as tentativas de normalizar as relações com a Santa Sé. O primeiro Embaixador nomeado foi D. Miguel de Portugal, Bispo de Lamego, que chegou a Roma em 20 de Novembro de 1641; como secretário, levava o Desembargador Rodrigo Rodrigues de Lemos e como agente na cúria, o Cónego Pantaleão Rodrigues Pacheco.
D. Miguel nunca chegou a ser recebido pelo Papa Urbano VIII (6-8-1623 a 29-7-1644). E a sua comitiva foi mesmo assaltada nas ruas de Roma em 20 de Agosto de 1642, resultando da refega mortos e feridos. A 18 de Novembro do mesmo ano, abandonou Roma.
As partidas pregadas pelos espanhóis e as desventuras de D. Miguel de Portugal são narradas com grande pormenor por Teodoro Ameyden, agente da Coroa de Espanha “mezzo tedesco, mezzo romano e tutto spagnolo”, como diz Alessandro Ademollo (mas afinal ele era holandês do Brabant). Nos seus escritos, ele manifesta um evidente ódio a Portugal e aos portugueses.
A representação ficou depois a cargo de agentes na cúria, Ferdinando Brandão, P.e João de Matos, Dr. Nicolau Monteiro, Fr. Manuel Pachedo, P.e Nuno da Cunha e, em 1648, o Dr. Manuel Álvares Carrilho, este oficialmente como agente do clero, mas tratando, na realidade, dos negócios do Rei.
Faltando o Núncio em Lisboa, as numerosas Ordens e Congregações de frades e freiras faziam-se representar individualmente junto do Papa, o que originava enormes confusões na transmissão de orientações para Portugal.
Mais grave e irresolúvel era a questão da nomeação dos Bispos, pois o Rei não queria dispensar o seu privilégio de os apresentar (isto é, de os nomear), nem podia permitir que o Papa os nomeasse de motu proprio, como chegou a ser alvitrado.
O Rei tentou todos os expedientes, nomeadamente dando peitas, como na altura se dizia, a torto e a direito. Havia um protector de Portugal, o Cardeal Virginio Orsini (1615-1676), que se diz ter recebido de Portugal 66 000 cruzados em dois anos. Sousa Coutinho acusa-o às claras de traidor de Portugal.
Outra tentativa de D. João IV foi a nomeação como Embaixador de Francisco de Sousa Coutinho, na esperança de que o seu prestígio e a sua experiência alcançassem êxito onde todos os outros tinham falhado. O Embaixador corria riscos sérios ao aceitar o lugar. Para além das dificuldades do lugar e da missão, ele já não era novo e tinha criado muitos anti-corpos em Lisboa, onde muita gente não gostava dele; entre estes, o Secretário do Governo, Pedro Vieira da Silva.
Recebeu ele a ordem para partir em Agosto de 1655. A 12 de Outubro partiu de Paris e a 20 de Novembro entrava em Roma. Era então Papa, Alexandre VII (7-4-1655 a 22-5-1667) que efectivamente o recebeu em audiência, como privado e não como Embaixador. Foi este o único resultado palpável da missão de Sousa Coutinho. Do que se passou no encontro, faz ele um minucioso relato no vol. XIII do CDP – Corpo Diplomático Português, pags. 223-228. Pediu licença ao Papa, para lhe enviar um memorial (CDP, vol. XIII, pags. 235-258), que este se prontificou a ler para depois lhe dar resposta. Na verdade, o Papa reenviou-o ao Núncio em Madrid, para que o mostrasse ao Rei Filipe IV de Espanha e este lhe respondesse; o Papa não tinha coragem para o fazer (CDP, vol. XIII, pag. 279). Os espanhóis responderam com um panfleto escrito em espanhol, depois traduzido para latim (Idem, pag. 336 e ss.).
Para demonstrar o mau ambiente que os seus inimigos lhe criavam em Lisboa, conta Sousa Coutinho ao Rei na carta de 12-2-1656 (Idem, pag. 265) um episódio que bem o demonstra. Quando Sousa Coutinho, ainda em França, recebera a nomeação para Roma, fora-lhe dito que estava à sua disposição um crédito para as despesas da Embaixada junto do Cavaleiro Rui Lopes da Silva, residente em Roma, para quem fora transferido por Duarte da Silva, de Lisboa. Chegado a Roma, dirigiu-se a Rui Lopes da Silva, levantou o dinheiro e depositou-o no Monte di Pietà. Passado algum tempo, foi surpreendido com uma carta recebida por Rui Lopes da Silva de Duarte da Silva, onde se dizia que o crédito a favor de Sousa Coutinho só poderia ser descontado depois que ele fosse recebido como Embaixador e tratado como tal. Pergunta-se ele se o queriam matar à fome.
Em 1656, segundo se julga, porque o documento não tem data, fez Coutinho lavrar em Roma solene protesto contra a falta de provimento dos bispados em Portugal (CDP, vol. XIII, pag. 374).
A 6 de Novembro de 1656, falecia D. João IV, ficando Regente do Reino a Rainha, D. Luísa de Gusmão. A substituição não alterou o modo de proceder de Sousa Coutinho, que se dirigia à Rainha com a mesma familiaridade que ao Rei, se possível ainda mais à vontade.
Em Agosto de 1657, quis o embaixador pôr luminárias no dia em que El-Rei D. Afonso VI perfazia 14 anos, maioridade para governar em Portugal; mas o governador de Roma ordenou-lhe que não o fizesse, com o pretexto de evitar ajuntamentos. Foi também proibido que a Igreja de Santo António e os portugueses festejassem a data (Idem, pags. 457-464).
Sousa Coutinho ficou furioso. Publicou então uma ordem, datada de 20-8-1657, intimando todos os portugueses de qualquer condição para, no prazo de três meses, regressarem ao Reino, sob pena de confiscação de bens e de ficarem desnaturalizados (Idem, pag. 456). A ordem não teve seguimento, mas demonstra bem a fúria com que ele ficou.
Em Março de 1658, recebia Sousa Coutinho ordem para regressar a Lisboa, o que naturalmente o magoou.
No final do ano, ainda se encontrava em Roma, cada vez mais hostil ao Cardeal Orsini e ao Secretário Pedro Vieira da Silva. Certamente a seu pedido, o cardeal Antonio Barberino escreveu ao Rei louvando o seu procedimento em Roma (CDP, vol XIII, pag. 511).
Deverá ter regressado a Lisboa em Janeiro de 1659.
Apesar das suas qualidades diplomáticas e da benevolência pessoal do Papa, Sousa Coutinho não poderia ter obtido melhores resultados, tal a pressão que os espanhóis ali faziam. Como diz Ademollo “il Papa gli usò bensì paterne carezze, ma il fece stare con privato titolo e modesto trattamento”.
Faleceu a 22 de Junho de 1660.
CONCLUSÃO
Francisco de Sousa Coutinho foi um grande diplomata e nisso estão, sejam os seus méritos, sejam as suas limitações. Tinha muito orgulho em ser português e tinha também orgulho nas missões que desempenhou ao longo da sua vida. A sua não era uma prosápia balofa, mas sim baseada no seu trabalho que era o de defender os interesses do seu País. Para isso empenhava-se a sério. Aprendeu francês e italiano, porque dessas línguas necessitava para o exercício das suas funções. Rodeou-se do luxo possível que lhe permitiam os seus proventos e os meios financeiros que lhe eram proporcionados.
A história da sua vida dá-nos conta, porém, das limitações da diplomacia. Os seus êxitos foram sempre limitados. Ao fim e ao cabo, o que resolveu a independência de Portugal foi a guerra da Restauração e a Santa Sé só reconheceu a nova dinastia reinante em Portugal após a celebração do Tratado de paz com a Espanha (1668). Do mesmo modo, não foi a diplomacia que segurou o Brasil, evitando que ficasse definitivamente nas mãos dos holandeses, mas sim as sangrentas batalhas ganhas por chefes vindos das classes mais baixas da colónia:
João Fernandes Vieira - comandou o principal terço de infantaria.
André Vidal de Negreiros - brasileiro de origem portuguesa.
Felipe Camarão - índio brasileiro da tribo potiguar.
Henrique Dias - filho de escravos.
Como pessoa, Francisco de Sousa Coutinho tem merecido os maiores encómios, apesar de uma certa impetuosidade que às vezes o levava a fazer asneira, como quando quis obrigar todos os portugueses dos Estados Pontifícios a vir para Portugal.
Tinha a vantagem de conhecer D. João IV desde os tempos da juventude deste, tal como muito bem diz João Lúcio de Azevedo:
“foi uma das mais interessantes personalidades da Restauração, e à luz dos documentos realiza bem o tipo de português antigo, brusco de modos, solto no falar, impetuoso, valente, chalaceador e astuto. Com o Rei, a quem servira desde que era ainda Duque de Bragança, tinha liberdades de criado velho, certo de lhas não tomarem a mal; discutia as ordens, desobedecia, ralhava, escrevia com rude franqueza, a queixar-se, a dar conselhos, a repreender.» (História de António Vieira, vol I, pag. 131).
Francisco de Sousa Coutinho não era um escritor, mas tinha facilidade em escrever. Escreveu muito, tudo descrevia até aos ínfimos pormenores. Dizia tudo o que lhe ia na alma, era completamente desassombrado, como se pode ver pelo que diz da Inquisição numa muito citada carta à Rainha, de 13-8-1657 (CDP, 13.º vol., pag. 450 e ss.):
"Senhora, Escrevo a El-Rei meu Senhor que Deus guarde a carta que será com esta com o sobrescrito a sua mão real, que o mesmo (sic) que mandá-la à de Vossa Majestade, para que, sendo servida e a ler, ou mandar ler pela pessoa que a entregara, que é o Bispo eleito do Japão, parecendo-lhe a Vossa Majestade se possa ver ou não em Conselho de Estado, ainda que terei meus perigos se nele se vir, porque estão tão soberanos os Inquisidores, que não duvidarão a se me atreverem pelo que falo na prisão dos homens de nação e no desfazer-se a Companhia por causa sua, como estou vendo que pode e há-de suceder se Vossa Majestade com a mão forte o não atalha, e remedeia. Este tribunal, Senhora, é praça que nesse Reino está ainda por conquistar, e a mais perigosa que nele temos, porque demais da sua antiga liberdade, a fortificam todos os Bispos eleitos, inimigos hoje dele e de Vossas Majestades...............................................
“Com capa de zelo pio e cristão trataram sempre os inquisidores desde o princípio do novo reinado encaminhá-lo para a sua ruína,.........................................................................................................................
A titulo de despacho da Inquisição, foram a Castela muitas e muitas cartas encaminhadas por esta Cúria, e quem duvida que ainda vão. Estava eu na Holanda quando prenderam Duarte da Silva, e sendo que viveu toda a sua vida em Lisboa, nunca foi judeu senão quando passou um crédito de 300 000 cruzados para em Holanda se fazerem umas fragatas para a nossa armada, e chegou ali primeiro o aviso que o crédito com que não teve efeito a obra; cinco anos esteve preso, soube ele que o queriam prender, avisou a Sua Majestade e lhe respondeu que se deixasse prender, que o livraria, e sendo a culpa só por saber segredos da Inquisição puderam mais os Inquisidores que o Rei e não saiu dos cárceres, se não para o cadafalso que Vossa Majestade viu. O Villa Real que foi de França com o Marquês de Niza esteve meses e meses em Lisboa onde já suas culpas se deviam saber, não foi preso se não quando estava para partir com uma comissão de fazer ir alguns navios a corso contra os de Castela.
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Reverendissimis, Celsissimis, Illustrissimis, Illustribus, Magnificis, Spectabilibus, et Nobilibus Dominis, Ordinibus Sacri Romani Imperii, et eorum Legatis, Ratisbonæ Congregatis, Dominis, et amicis observandis, honorandis, et plurimum colendis: Franciscus de Sousa Coutinius, a consiliis Serenissimi Regis Portugalliae Joannis, nomine quarti, Eques militiæ ordinis Christi, eiusque Commendatarius, et custos Major arcis de Sousel, et ipsius Regiæ Majestatis Legatus extraordinarius in partes septentrionales, humillime, et debito cultu felicitatem, et salutem precor, et ab omnibus simul per has literas dicendi licentiam reverenter imploro.
Notorium est, Sacri Romani Imperii patres gravissimi et omnibus titulis dignissimi, Principem Eduardum Brigantinum, qui fideliter Imperio inservierat, in illo violenter hodie detineri, ablata libertate in patriam, et Lusitaniam proficiscendi, arresto, et represaliis factis ejus personæ suorumque servorum, et familiarium. Res quidem nova fuit, et eo admirabilior quo Celsissima Congregatio Ratisbonae justissima, et æquissima, et nusquam Principibus liberis, nisi sub hoste hoc fieri consuevit.
Notum est omnibus, quod ille Celsissimus Princeps, relicta patria, deserto fratre, tunc Principe, et Duce Brigantiæ, hodie Lusitaniæ Rege, domino meo, relictis bellis, et exercitibus aliorum Regum, et Principum vicinorum, Sacrum Romanum Imperium adiisset, ut ei sua officia, servitia, operas, et sumptus offeret. Nemo negabit, et quod ipsi Potentissimi Sueci, et Galli hostes publice protestantur, quod emuli fateri non recusant, quod tota Germania novit, illum semper strenuum, et egregium bellatorem, et ducem in omnibus locis, et imperii muneribus sibi commendatis se gessisse, multisque quotidianis oblatis occasionibus, vitam, et pericula despexisse, sive in urbibus obsidione cingendis, sive eisdem ab illa liberandis, vel aperto campo, vel castris metatis, victorem multoties exivisse, et semper pro Imperio gloriose pugnasse, et hoc quidem non illius sumptibus, sed suis, per septennium libentissime peregisse.
Ecce ille ingenuus Dux, et Princeps, solius imperii servitor, non alterius, qui se liberavit ab hostibus, jam captivus habetur ab amicis, et ubi libertatem quæsivit, invenit servitutem, ubi præmia expectabat, repressalia patitur, et arrestum. Et ei non solum omnis communicatio humana prohibetur, sed et potestas, ut ei pro alimento, et victu suppeditentur necessaria, denegatur. Quid amplius hostis faceret, si eum caperet? certe minus: nam hodie liber esset.
Quæ principibus in tota Europa securitas dabitur ab Imperio? Qui poterunt illi se offerre, et libere inservire? Quo exemplo allicientur animi, dum illud meritorum exemplar jam exemplum considerant servitutis? Ubi est iuris gentium et fidei publicæ, sub qua ille militaverat, observatio? Ubi est illa Sacra Imperialis, vel Germanica libertas quæ etiam fugatis ab aliis Regnis, et criminosis datur, si de imperio benemerito Principi innocenti et inculpabili denegatur? Ubi est peregrinorum et exterorum favor? ubi præmia benemerentium? Sic solvitur effusus egregii militis, et Duci sanguis? sic septemnalis labor indefessus, sic electio servitii Sacri Romani Imperii æstimatur? Si in aliquo circa munera, et obligationes suas offendit Imperium, libellus criminum offeratur, convincatur, et legitime veniat puniendus: sed si Imperii nec pacem publicam fregit, nec aliquid contra eam moliebatur, imo totis viribus pro ea defendenda pugnabat, quid restat culpæ, quid flagitii restat ? nisi habeantur officia, et beneficia pro injuriis; et unum idemque sit defendere, quod offendere.
Si ad instantiam Regis Castellae; et forsitan per ministros, qui a domo Brigantina panem, et honorem obtinuerant, opponatur, quod Principis Eduardi frater, serenissimus Rex Portugalliae, omnium sui Regni procerum, et populi acclamationi consentiens, injuste a Rege Castellae discesserit, et rebellaverit, hoc contra veritatem est, neque enim rebellio dicitur, restitutio; neque violentiæ repulsa appellari poterit injustitia. Omnibus patet, quod catholicus Rex, Philippus secundus armis invadens Lusitaniam, eam majori vi oppressam; non ut hæres, sed hostis occupavit; nec resistere poterat serenissima domina, Domina Catherina: hæc enim, si tunc jura valerent, jam regnaret, nam a jure per beneficium repræsentationis in locurn infantis Eduardi, patris sui ingressa, ut agnata ad successionum Regis Henrici, ipsum patrem, ac si viveret, repræsentabat, et Catholicus Rex, Philippus Secundus, ut cognatus Imperatricem Dominam Elisabetam Matrem fœminam referebat, et uterque non ex propria persona, sed ex persona parentis concurrebat, ac proinde quemadmodum Eduardus, si viveret, Elisabetam sororern excluderet, sic etiam sua filia Catherina, ut agnata illum repræsentando, Catholicum Regem qui cognatus erat, et Elisabetam fæminam repræsentabat, excludere jure merito debuit. Et præter hanc veritatem, tritæ, et notissimæ leges sunt, secundum quas, et causæ, et possessionis jus ammittit, qui jura desertit, et armata manu contendit, sic ex illis sit certum, quod Catholicus Rex, si aliquod jus haberet (quod negatur) illud amiserit, ubi primum, relicto juris ordine, sumpsit arma, quorum viribus inniti non potuit ad præscriptionem, nam præterquam contra legitimos Regni successores nulla præscriptio currit, quis titulus, quæ bona fides, quis partium consensus pro illo, et suis successoribus poterant considerari, exortis Lusitanis vasallis, et majore vi oppressis contendentibus, præsidiato regno, ubi omnes arces, Castella, et fortalitia armato Castellano milite compleverunt. Ultra hæc aliud insuperabile obstaculum opponebatur Catholico Regi, ex lege Comitiali Lusitana, in Lamecensi Civitate edita, jam a tempore primi Portugalliæ Regis, Alfonsi Henriques, quæ quasi Salica, vel Gallica fuit, ex ea enim prohibetur Regnum Lusitaniæ ad Reges exteros pervenire, et sic, quod per infantes filias Regum Portugalliæ non posset ad eorum maritos externos jus aliquod ad Regnum pertinere; et jam hoc, et suæ acclamationis jure usus Joannes primus, Rex Lusitaniæ, cum tamen nothus Regis Petri filius esset, exclusit Beatricem filiam legitimam Regis Ferdinandi, cui ille succesit, et prædictæ Dominæ Beatricis maritum Joannem Regem Castellæ debellavit.
His, et aliis fundamentis, quæ melius, et uberius eo jam tempore explicarunt omnes juris prudentiæ professores, libris editis in celeberrima Academia Conimbricensi, et aliis, conscius sui juris erat Serenissimus Brigantiæ Princeps, sed inter arma Castellæ, quamvis Lusitanorum amori fideret, non tamen ei aperte de illorum voluntate constabat: et ita nihil moliebatur: sed Deus optimus maximus, per quem Reges regnant, et Legislatores justa decernunt, sumpsit Castellæ ministrorum tyrannidem, pro libertatis et justitiæ instrumento, nam eo tyrannides, et injustitiæ duorum potentium ministrorum, Generi et soceri, Didaci Soares, et Michaelis de Vasconcellos, qui Regii status Portugalliæ Secretarii erant, Madrithi, et Olisipone, intolerabilia ab eis arbitrata tributa, despectus, et extirpatio nobilitatis, honorum, locorum, justitiae, et militiæ equestrium insignium venditiones, velut in hasta publica pervenerunt, ut solum residuum esset quod jam moliebantur, ut antiquissimum Lusitaniæ regnum foralibus, et legibus fractis reduceretur in miseram provinciam. Quibus et allis multis incitati omnes Prælati Ecclesiastici, omnis nobilitas, et populus., nemine discrepante, acclamarunt, restituerunt, et jurarunt Regem suum Joannem quartum, cui per breve temporis spatium omnes arces, et præsidia, in quibus Castellanæ cohortes erant, obedierunt, et omnes regiones, et insulæ Portugalliæ, absque ensium ictu, vel armorum strepitu tradita sunt.
Ecce quomodo serenissimus Rex meus, Joannes quartus, pro tuendo jure suo, pro suorum vasallorum tuenda libertate gubernat, et regnat, nec sui juris defensio, et restitutio ei in culpam poterit imputari: et si contrarietur Catbolicus Rex, et ad jus provocet armorum, quasi illo ceperit Lusitaniam, illud ipsum pro Rege domino meo est, quod enim armis extorsit, hoc licet armis regnum repetere, et sic inter sese uterque jura, et uterque arma revolvat.
Sed dato, et nunquam concesso, quod Serenissimus Rex Portugalliae aliquam injustitiam, et hostilitatem cornmitteret contra Catholicum Castellae Regem, quæ culpa, quis dolus, quæ machinatio considerari potest, in innocenti Principe Eduardo? Filius ipse obligationibus paternis, si non sit hæres, exuitur uxor mariti debitis, nisi per successionis vincula non tenetur: clamant jureconsulti, quod crimen, vel pœna paterna nullam maculam filio infligere potest, narn unusquisque ex suo admisso forti subjicitur, nec alieni criminis successor constituitur, et alibi, quod satius est impunitum relinquere facinus nocentis, quam innocentem damnare. Quomodo igitur frater innocens ex culpa alterius obligabitur? Non ne fuit motionis Portugalliae, et fratris sui particeps Eduardus? Respondet veritas, nullo modo, nam si sciret, et in ea, vel scientia, vel ope concurreret, juxta liberas civitates erat, quo petere, et ubi se recipere poterat; sed nihil scivit, conscius ipse sibi nihil timuit, et externa securitas satis interiorem demonstravit.
Sed ulterius pergendo, permissa (et nunquam concessa) quacunque alia præsumptione, juxta quam censeretur, illi gratos fuisse Lusitaniæ motus, et eis consensisse, et voluisse ab Imperio exire, quod negatur, quid deinde sequitur contra Imperium? llli Princeps Eduardus, non Castellæ inserviebat: et secundum regnorum diversitates, aunt etiam dominia et possessiones: nihil Imperio, et Germaniæ est commune curn Castella, nihil cum Portugallia. Undo quamvis pro offensis Imperii posset etiam innocens detineri, nihil debet ratione Imperii Eduardus, nec Serenissimus Rex Joannes, frater ejus, aliquod cum Imperio debitum contraxit, nec a Germania aliquid abstulit. Si pacem Castellæ fregit, non fregit Germaniæ pacem: et si adhuc a contrario illa antiquissirna accusantium allegatio repetatur, quod omnis qui se Regem facit, contradicit Cæsari, non habet locurn in utroque fratre, nec debet audiri, nec valere apud Sacram, Catholicum, et Cæsarearn Majestatem.
His, et aliis juris, æquitatis, et rationis monumentis instructus ante celsitudines, illustrates, et dominationes vestras, et ante ipsam Sacram, et Cæsaream Majestatem præsentialiter adesse desiderabam, ut justitia ab omnibus humiliter implorarem: sed jam non conceditur ire, et quæ mihi securitas servabitur de jure gentium, si in persona tanti Principis frangitur? Quæ mihi ipsius servo libertas dabitur, si et ipsi Domino denegatur ?
Juste igitur per has literas, a Celsitudinibus, Illustratibus, et Dominationibus vestris, nomine Serenissimi Portugalliæ Regis Joannis quarti, domini mei, peto, ut Princeps Eduardus ejus frater innocens liberetur, et in pristinam et debitam libertatem restituatur: et ad meliorem promotionem ejus effectus, innocentis Ducis, et Principis justitia suæ Sacræ Cæsareæ Majestati a Congregatione CeIsisima proponatur, ut suis ipsius legibus obligetur, et satisfactionem præbeat actioni, in quam omnes alii Reges, et Principes prospiciunt, et mirantur, ita ut in causa Celsissimi Ducis, et Principis Eduardi, justitiæ, non sanguini deferatur, et non fiat quod unde jus oritur, oriantur injuriæ: Et sic confido, et spero firmissime me assecuturum a tanta Congregatione, in qua generaliter omnibus, et particulariter singulis dominis congregatis, et gratulationem Regis, Domini mei, et officia mea humiliter offero præstaturus. |
Aos Reverendíssimos, muito sublimados, Ilustríssimos, Ilustres, Magníficos, Expectáveis e Nobres Senhores Ordens do Sacro Império Romano, e seus Legados Congregados em Ratisbona, Senhores e amigos muito dignos de respeitar, honrar e venerar.
Francisco de Sousa Coutinho, do Conselho do Sereníssimo Rei de Portugal Dom João IV, do nome Cavaleiro da Milícia da Ordem de Cristo, e Comendador dela, e Alcaide mor da Fortaleza de Sousel, Embaixador extraordinário às partes setentrionais, peço muito humildemente felicidade, e saúde e com a devida veneração, a todos peço reverentemente licença de tratar por estas letras.
«Notório é, ó padres do sacro império romano, gravíssimos e digníssimos de todos os títulos, que o príncipe D. Duarte de Bragança, tendo servido fielmente ao império, está hoje retido violentamente nele, negando-se-lhe a liberdade de ir para Portugal, sua pátria, fazendo-se retenção e represália de sua pessoa, e de seus criados e familiares, de certo coisa nova e tanto mais para admirar, quanto a excelentíssima congregação de Ratisbona é a mais justa e igual, e quanto jamais costumou fazer-se coisa semelhante a príncipes livres, senão por inimigo declarado.
«Sabido é de todos que aquele sereníssimo príncipe, deixando sua pátria, deixando seu irmão, a esse tempo príncipe e duque de Bragança, e hoje rei de Portugal, meu senhor, deixando as guerras e exércitos de outros reis e príncipes vizinhos, se veio ao sacro romano império a oferecer sua pessoa, seus serviços, trabalhos e despesas. Ninguém negará o que até os próprios inimigos, os poderosíssimos suecos e franceses protestam publicamente, o que os mesmos émulos não deixam de confessar, o que toda a Alemanha sabe, que ele se portou sempre valoroso e excelente guerreiro e capitão, em todos os lugares e cargos do império, que se lhe encomendaram, e que desprezou a vida e perigos, em muitas e quotidianas ocasiões que se ofereceram, assim no sitiar das cidades, como em as livrar do cerco, e que, por muitas vezes, saiu vencedor em campo descoberto, ou em arraiais assentados, pelejando sempre pelo império gloriosamente, e que isto praticou por sua livre vontade, por tempo de sete anos, não á custa e despesas do império, mas às suas próprias.
Eis agora este sincero capitão e príncipe, servidor unicamente do império, e não de outrem, depois de se livrar dos inimigos, cativo dos amigos; onde buscou a liberdade achou o cativeiro, onde esperava prémios sofre represálias e retenção, proibindo-se-lhe não só toda a comunicação humana, mas negando-se também poder e faculdade para lhe ser dado o necessário á sua sustentação e mantença. Que faria mais um inimigo, se o cativasse? Menos em verdade, porque hoje estivera livre.
«Que segurança se dará aos príncipes em toda a Europa? Quais se lhe poderão oferecer e servi-lo livremente ? Com que exemplo se moverão os ânimos, quando considerarem aquele exemplar de merecimentos, exemplo de cativeiro? Aonde 413 está a observância do direito das gentes e da fé publica, debaixo da qual ele tinha militado ? Aonde está aquela liberdade sacra e imperial ou germânica que até se concede aos que vem afugentados de outros reinos, e aos criminosos, se se nega a um príncipe tão benemérito do império, inocente e inculpável? Aonde está o favor dos peregrinos e estrangeiros? Aonde estão os prémios dos que os bem merecem? Assim se paga o sangue derramado do excelente soldado e capitão? Assim se estima o trabalho incansável de sete anos? Assim a eleição do serviço do sacro império romano? Se ofendeu em alguma coisa ao império, no tocante aos seus cargos e obrigações, dê-se libelo dos crimes seja convencido e castigado legitimamente; mas, se não quebrou a paz do império, nem a pública, nem contra ela maquinava coisa alguma, antes, com todas suas forças, pelejava por a defender, que culpa, que crime lhe ficam? a não ser que os serviços e benefícios sejam tidos por injúrias e que seja o mesmo defender e ofender.
«Se se opuser à instância de el-rei de Castela, e por ventura por ministros que da casa de Bragança alcançaram sustento e honra, que o sereníssimo rei D. João de Portugal, irmão do príncipe D. Duarte, acedendo á aclamação de todos os nobres e povo do seu reino, se apartou injustamente de Castela e se rebelou contra o rei dela, diremos que não é verdade, porque a restituição não é rebelião, nem o rebater a violência se poderá chamar injustiça. A todos é notório que o rei católico Filipe II, entrando por armas em Portugal, o ocupou com grande força, não como herdeiro, mas como inimigo; nem podia a sereníssima senhora D. Catarina resistir, porque esta, se as leis então valessem, já reinaria porque ela por direito, entrando à sucessão de El-Rei D. Henrique, por o benefício da representação, em lugar do Infante D. Duarte seu pai, como agnada, representava seu próprio pai, como vivo. El-Rei Católico Filipe II, como cunhado, representava a Imperatriz D. Isabel sua mãe fêmea, e um e outro concorriam, não por suas próprias pessoas, mas por as pessoas do pai, ou mãe; e portanto da maneira, que o Infante D. Duarte, se vivera, excluiria a sua Irmã a Imperatriz Dona Isabel, assim também sua filha D. Catarina, como agnada, representando-o a ele, em bom direito, deveu excluir a El-Rei Católico, que era cunhado, e representava a Imperatriz D. Isabel, fêmea. E além desta verdade, vulgares e assaz conhecidas, são as leis, conforme às quais perde o direito da causa, e da posse, quem deixa as leis e contende com mão armada: assim segundo elas é certo que El-Rei Católico, se tivesse algum direito (o que se nega), o perdeu, tanto que, deixada a ordem do direito, tomou as armas, de cujas forças não pode usar para a prescrição: porque, além de que não corre alguma prescrição contra os sucessores legítimos do Reino, que título, que boa fé, que consentimento das partes se podia considerar por ele, e seus sucessores, contendendo os vassalos Portugueses forçados, e oprimidos de mais força, estando o Reino presidiado aonde encheram todas as detenções, Castelos e fortalezas da soldadesca Castelhana armada. Além destas coisas, se opunha outro impedimento invencível a El-Rei Católico pela lei feita nas Cortes de Portugal na Cidade de Lamego, já desde o tempo de El-Rei Dom Afonso Henriques, o primeiro de Portugal, a qual foi quase Sálica, ou Gálica, porque por ela se proíbe vir o Reino de Portugal a Reis Estrangeiros, e assim, que por às Infantas filhas dos Reis de Portugal, não pudesse pertencer algum direito ao Reino a seus maridos Estrangeiros. E já usando El-Rei D. João o I. deste direito, e do de sua aclamação, sendo contudo filho bastardo de El-Rei Dom Pedro, excluiu a Dona Beatriz, filha legítima de El-Rei Dom Fernando, a quem ele sucedeu, e desbaratou por guerra a El-Rei Dom João de Castela, marido da sobredita Dona Beatriz. "
«Por estes e outros fundamentos que, melhor e mais largamente, já naquele tempo mostraram todos os professores de jurisprudência, por livros impressos, na celebérrima universidade de Coimbra, e em outras, sabia bem do seu direito o sereníssimo príncipe de Bragança; porém, cercado pelas forças de Castela, ainda que confiava no amor dos portugueses, contudo não lhe constava descobertamente da vontade dele, e assim nada pretendia. Mas Deus todo poderoso, por quem reinam os reis e os legisladores decretam coisas justas, tomou a tirania dos ministros de Castela por instrumento da liberdade e justiça; porque chegaram a tanto as tiranias e injustiças de dois ministros poderosos, genro e sogro, Diogo Soares e Miguel de Vasconcelos, secretários do estado real de Portugal em Madrid e Lisboa, assim como os tributos intoleráveis, arbitrados por eles, o desprezo e extirpação da nobreza, a venda das honras, dos lugares da justiça e da guerra, e das comendas das ordens militares, feita quase em almoeda publica, que só faltava, o que já tratavam, reduzir-se o antiquíssimo reino de Portugal a mísera província, quebrados seus forais e leis. Incitados por estas coisas, e por outras muitas, todos os prelados eclesiásticos, toda a nobreza e todo o povo, sem discrepância alguma, aclamaram, restituíam, e juraram por seu rei a D. João IV, ao qual, em breve espaço de tempo, obedeceram todas as fortalezas e presídios em que estavam terços castelhanos, e se entregaram todas as regiões e ilhas de Portugal, sem golpe de espada nem estrondo de armas.
«Eis aqui como o meu sereníssimo rei D. João o IV governa e reina para defender o seu direito, e defender a liberdade de seus vassalos; nem à defensão e restituição do seu direito se lhe poderá atribuir culpa: ainda que o rei católico, contrariado, apele para o direito das armas com que tomou Portugal, o que também faz por el-rei meu senhor, porque é licito recuperar por armas o reino que ele tomou por armas, e assim um e outro, entre si, resolvam os direitos e as armas.
«Porém dado, e nunca concedido, que o sereníssimo rei de Portugal cometesse alguma injustiça e hostilidade contra el-rei católico de Castela, que culpa, que engano, que maquinação se pode considerar no inocente príncipe D. Duarte? O filho fica livre das obrigações do pai, se não é herdeiro; a mulher não está obrigada ás dividas do marido, se não for pelos vínculos da sucessão; clamam os jurisconsultos que o crime ou pena do pai não pode causar afronta alguma ao filho, porque cada um fica sujeito á sorte por sua culpa, e não se constituo sucessor do crime alheio, e, em outra parte, que melhor é deixar sem castigo a maldade do culpado que condenar o inocente. Como se há de pois obrigar o irmão inocente pela culpa do outro? Porventura foi D. Duarte participante da alteração de Portugal e da de seu irmão? Responde a verdade: de nenhum modo; porque se o soubera, ou nela concorrera com ciência ou ajuda, perto estava de cidades livres, para onde se pudera ir, e onde podia recolher-se; mas nenhuma coisa soube, fiado na sua consciência, não temeu nada, e a segurança exterior mostrou bem a interior.
«Mas, indo mais avante, permitida e nunca concedida qualquer presunção, conforme a qual se julgasse que lhe agradaram as alterações de Portugal, e que consentiu nelas, e se quis sair do império (o que se nega), que se segue daqui contra o império? O príncipe D. Duarte servia a este, e não a Castela, e, segando as diversidades, senhorios e possessões dos reinos, nenhuma coisa têm de comum o império e Alemanha com Castela, nenhuma coisa com Portugal. E ainda que pelas ofensas do império se pudesse reter um inocente, D. Duarte não deve nada com respeito ao império, nem o sereníssimo rei D. João, seu irmão, contraiu divida alguma com o império, nem tomou coisa alguma a Alemanha. Se quebrantou a paz de Castela, não quebrantou a paz de Alemanha; e se ainda, em contrario, se repetir aquela antiquíssima alegação dos acusadores, que todo o que se faz rei contradiz a César, não tem ela lugar em um ou outro irmão, nem deve atender-se ou valer ante a sacra católica e cesárea majestade.
«Instruído com estas memorias de direito, justiça e razão, desejava comparecer ante vossas altezas, ilustríssimas e senhorias, e ante a mesma sacra e cesárea majestade, para pedir a todos humildemente justiça; mas já se me não concede a passagem; e que segurança se me guardará pelo direito das gentes, se se quebra na pessoa de tão grande príncipe? Que liberdade se dará a mim, seu criado, se até ao mesmo senhor se nega?
«Portanto peço com justiça, por estas presentes letras, a vossas altezas, ilustríssimas e senhorias, em nome do sereníssimo rei D. João IV, meu senhor, que se solte o príncipe D. Duarte, seu irmão, inocente, e se restitua á sua antiga e devida liberdade, e, para melhor promoção do seu efeito, se proponha pela muito sublimada congregação a sua sacra cesárea majestade a justiça do inocente capitão e príncipe, para que por suas próprias leis se obrigue e dê satisfação a um acto, em que tem posto os olhos todos os outros reis e príncipes, e de que todos eles se espantam, de sorte que, na causa do excelentíssima capitão e príncipe D. Duarte, se defira á justiça e não ao sangue, e não aconteça que d' onde nasce o direito nasçam as injurias. Assim confio e espero muito firmemente que hei-de conseguir de tão excelente congregação, na qual a todos geralmente, e em particular a cada um dos senhores congregados, ofereço humildemente tanto o agradecimento d'el-rei, meu senhor, como os meus serviços.
Estocolmo, vinte e quatro de Julho de mil seiscentos e quarenta e um».
[1] Manifesto e protestação feita por Francisco de Sousa Coutinho, enviado á dieta de Ratisbona sobre a injusta retenção e liberdade que requer do sereníssimo infante D. Duarte. Lisboa. 1641. 4. Id., em latim nas provas da Hist. genealógica.
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TEXTOS CONSULTADOS
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Giovanni Battista Birago Avogadro, Historia della disunione del Regno di Portogallo dalla Corona di Castiglia, scritta dal Dottore Gio. Bat. Birago Avogaro...; novamente corretta, emendata et illustrata; con l'aggionta di molte cose notabili dal molto P. Maestro Fra Ferdinando Helevo dell'Ordine de Predicatori; con l'Apendice di una scrittura d'un Ministro di Spagna, Amsterdam, Niculau van Ravesteyn, 1647.
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Alessandro Ademollo (1826-1891), Giacinto Gigli e i suoi Diari del Secolo XVII, Firenze, Tipografia della Gazzetta d’Italia, 1877
Online: www.archive.org
Alessandro Ademollo, La questione della indipendenza portoghese a Roma dal 1640 al 1670, Firenze, Tipografia della Gazzetta d’Italia, 1878
Colecção dos Tratados, Convenções, Contratos e Actos Públicos celebrados entre a Coroa de Portugal e as mais Potências desde 1640 até ao presente, compilados coordenados e anotados por José Ferreira Borges de Castro, Tomo I, Lisboa, Imprensa Nacional, 1856.
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FRANCISCO DE SOUZA COUTINHO nasceu na Ilha de S. Miguel onde teve por Pais a Gonçalo Vaz Coutinho Comendador de Santa Maria de farinha podre, Governador da Ilha de S. Miguel, e a D. Jeronima de Moraes filha de Sebastião de Moraes Tesoureiro mor do Reino, e por Tio paterno a Fr. Luiz de Souza claro esplendor da Ordem Dominicana chamado no Século Manoel de Souza Coutinho. Instruido na primeira idade com a noticia das letras humanas, e preceitos da Poesia, que cultivou com igual elegância, que facilidade se dedicou em anos mais maduros à lição da Historia sendo versado em todos os idiomas, e erudito em varias faculdades. O seu profundo talento, grande capacidade, e suma prudencia o constituiram hum dos mais celebres Politicos, que respeitou a sua idade tendo por teatros das suas negociações as Cortes de Suecia, Dinamarca, Olanda, França, e Roma onde com o caracter de Embaixador da Magestade delRey D. João o IV representou a justiça do seu Soberano novamente elevado ao trono de Portugal, triunfando com artificiosa sagacidade das cavilaçõoes dos Olandezes, e concluindo Tratados de que resultou igual gloria, que conservação a esta Monarchia, em cujo ministerio consumiu o largo espaço de quinze anos.
Foi Comendador de Santa Maria de farinha podre, Alcaide mor de Souzel, Conselheiro de Estado, e nomeado Governador do Brazil. Cazou em Madrid com D. Maria de Aguila, e Heredia filha de Francisco Gonçalves del Aguila, e de D. Sabina de Heredia de quem teve a D. Joanna Thereza Coutinho, que cazou com D. Diogo Fernandes de Almeida Alcayde mòr de Santarem, Golegãa, e Almeirim Comendador de Santo Andre de Villa-Boa de Quires, de quem não teve filhos. Faleceu em Lisboa a 22 de Junho de 1660 e jaz sepultado no Convento da Santíssima Trindade.
O seu nome celebram diversos Escritores. Fr. Francisco de Santo Agostinho Macedo Philip. Portug. pag. 197. E en quien compite la sangre con el valor, la prudencia con la cortezia, & in Propugn. Lusit. Gall. p. 198. D. Francisco Manoel Carta dos AA. Portug. tão luzido Escritor, como grave Ministro Joan. Soar. de Brit. Theatr. Lusit. lit. F. n. 74. le Clede Hist. Gen. de Portug. Tom. 2. pag. mihi 434. at 448. 532. 560. 571. 593. Menezes Portug. Rest. Tom. 1. pag. 158. 161. 191. 440. 640. 734. 754. e 885. e Fr. Joan. Giusep. di S. Theres. Istoria del Brasile.Part. 2. pag. 51. e 52. 127. e 162. e seguinte.
Publicou o seguinte Manifesto pela liberdade do Senhor Infante D. Duarte apresentado na Dieta de Ratisbona, ao qual chama eloquente, e bem fundado D. Luiz de Menezes Portug. Restaurad. Tom. 1. pag. 191. e sahio com este titulo
Propositio facta Celsis praepotentibus Dominis Ordinis generalibus confæderatarum Provinciarum Belgii in consessu publico 16. Augusti 1641. Holmiae 1641 . 4. Saiu segunda vez impresso na Hist. di Portogallo composta pelo Doutor João Bautista Birago liv. 5. pag. mihi 400. at 405. Foi vertido em Portuguez, e impresso em Lisboa por Jorge Rodrigues . 1641.4.com este titulo Manifesto, e protestação feita por Francisco de Souza Coutinho Comendador da Ordem de Christo, Alcaide mòr da Villa de Souzel, e do Conselho delRey D. João o IV. e seu Embaixador às partes Septentrionaes, e Enviado à Dieta de Ratisbona sobre a injusta retenção, e liberdade, que requere do Serenissimo Infante D. Duarte Irmão do dito Senhor.
Engaños y desengaños de la vida. Sylva moral dedicada a la Señora Luiza Ponce de Leon Dama de la Serenissima Reyna de Portugal . 4. Não tem o nome do Author, nem do Impressor, e lugar da edição mas do caracter se conhece ser feita em Pariz, ou Olanda.
Memorias Historicas das suas Embaxadas.M. S. às quaes chama celebres D. Francisco Manoel de Mello Cart. dos AA. Portuguezes escrita ao Doutor Themudo.
Carta em Verso escrita a D. Francisco Manoel de Mello à qual respondeu com este discreto Soneto que é o 18. da Tuba de Calliope dasObras Metricas.
Senhor a vossa carta é já de guia
Para mi que perdido ando vivendo
Mais me cativa quando a vou mais lendo
Não tem jeito de ser a d'alforria.
Será de marcar á fantezia
Que sem rumos também se vai perdendo.
e tudo, mas é mais segundo entendo
A da examinação da Poesia.
Ouço Platão em termos eloquentes
Homero escuto em Versos inauditos
Chore Grécia as Athenas, e as Espartas;
Vivam vossos escritos sobre as gentes,
Que enfim quem conhecer vossos escritos
Não pode esperar menos, que estas cartas.
De:
Bibliotheca lusitana historica, critica, e cronologica: na qual se comprehende a noticia dos authores portuguezes, e das obras, que compuserão desde o tempo da promulgação da Ley da Graça até ao tempo presente, por Diogo Barbosa Machado (1682-1772), 4 vols., 1741.