10-2-2007

 

Garcia de Orta e os seus divulgadores

(1505 ? - 1568)

 

A vida e a obra de Garcia de Orta estão hoje bem documentadas, graças sobretudo à monografia publicada em 1934 por Augusto da Silva Carvalho (1861-1957), na Revista da Universidade de Coimbra. Os estudos de Francisco Manuel de Melo Breyner (1837-1903), Conde de Ficalho, são ainda hoje muito importantes para a compreensão da obra, assim como a sua edição dos Colóquios. Mas ele não se apercebeu que Garcia de Orta era cristão novo e, por isso, não consultou os documentos da Inquisição que o mencionavam; daí as falhas materiais na biografia que compôs, aliás, muito bem escrita.

Esta página pretende mais chamar a atenção para o grande número de obras ligadas, quer a Garcia de Orta, quer aos seus divulgadores, que se encontram acessíveis em bibliotecas digitais na Internet, sem cuidar de apresentar uma bibliografia completa ou uma lista exaustiva das edições.

Na realidade, os Colóquios apenas deverão ter sido estudados em Portugal e, mesmo aqui, por muito pouca gente. No mundo, apenas foi conhecida a versão resumida em latim de Charles de l’Ecluse (Carolus Clusius) (1525-1609), que adquiriu em Lisboa um exemplar dos Colóquios pouco tempo depois da sua publicação em Goa. Alguns méritos vão também para a obra de Cristóvão da Costa que, copiando de Orta aqui e ali, não se esquece de o referir. 

 

O pai de Garcia de Orta, Fernão de Orta, era espanhol e natural de Valência de Alcântara e veio refugiado para Portugal na altura da expulsão dos judeus, na sequência do edito dos Reis católicos, de 31 de Março de 1482. Estabeleceu-se como mercador em Castelo de Vide. Tinha um filho de uma castelhana de nome Brites Nunes, chamado Jorge de Orta, que se foi estabelecer em Elvas e para aí levou sua mãe.

Fernão de Orta casou depois com Violante Gomes, natural de Albuquerque, a 54 km. a noroeste de Badajoz,  e do casamento nasceram sucessivamente Garcia de Orta e as irmãs, Violante, Catarina e Isabel.  O nascimento dele deve ser fixado nos primeiros anos do século, já que sua irmã Catarina diz ter nascido em 1511 ou 1513.

Feitos os primeiros estudos, talvez em Elvas, foi para Salamanca e depois para Alcalá estudar medicina.  Quando regressou formado, por alturas de 1525, já seu pai tinha falecido em 1521.

Em 1526, foi a Lisboa, onde lhe foi concedida a 5 de Abril licença para andar de mula e a 10 do mesmo mês, carta permitindo-lhe o exercício da medicina. O Conde de Ficalho transcreve estes dois documentos.

No final do mesmo ano, regressa a Lisboa, tentando obter um lugar de professor na Universidade. Preterido em três concursos, em 20 de Fevereiro de 1527, 4 de Dezembro de 1529 e 31 de Outubro de 1530, o Conselho da Universidade entregou-lhe a 5 de Novembro de 1530 a cadeira de Filosofia Natural por um ano, dando duas lições por dia e vencendo anualmente vinte mil reais. Orta viveu, pois, em Lisboa, desde 1530 até à primavera de 1534.

Já então se prenunciavam maus tempos para os cristãos novos. D. João III envidava todos os esforços para estabelecer a Inquisição. Por isso Garcia de Orta valeu-se da amizade do capitão-mor Martim Afonso de Sousa e com ele embarcou para a Índia em 12 de Março de 1534. Ali estaria mais sossegado. Tinha lá familiares e, nessa altura,  não se falava ainda em criar a Inquisição em Goa.

Garcia de Orta começou por vender os cinco quintais de pau santo originário do Brasil, que trouxera de Lisboa e era empregue na cura da sífilis. Nos primeiros anos, acompanhou sempre o seu protector Martim Afonso de Sousa nas suas campanhas militares, ao mesmo tempo que ia conhecendo as gentes, os costumes, as línguas, as plantas e as doenças, um capital de conhecimentos que mais tarde verteu no seu livro.

Por questões políticas, Martim Afonso de Sousa regressa ao Reino no final de 1538, mas Garcia de Orta permanece na Índia. Já o Papa Paulo III expedira a bula Cum ad nihil magis, de 23 de Maio de 1536, estabelecendo a Inquisição em Portugal. A 5 de Outubro era nomeado fr. Diogo da Silva Inquisidor-mor, dando início a um dos períodos mais negros da história de Portugal. Orta tinha todas as razões para ficar na Índia.

No final de 1541 ou princípio de 1542, Orta casou com Brianda de Solis, pertencente a família originária de Alter, e acabada de chegar da metrópole.

Mais tarde, em Lisboa, suas irmãs Catarina e Isabel foram presas em Março de 1547 pelo Santo Ofício, por terem sido denunciadas como judaizantes. Negaram sempre e conseguiram ser libertadas em Outubro do mesmo ano, sendo mandadas fazer penitência às Escolas Gerais. Garcia de Orta insistiu então com elas apara que se lhe juntassem na Índia.  Assim, em 1548, Catarina e seu marido Leonel Peres, Isabel e o marido Francisco Vaz, com respectivos filhos e mãe de ambas, Violante Gomes, embarcaram na nau S. Filipe, chegando a Goa a 5 de Setembro. A mãe ficou na casa de Garcia de Orta, as irmãs e cunhados numa casa contígua.

Mesmo sem Inquisição, um colega de profissão de Garcia de Orta, o bacharel em medicina, Jerónimo Dias, que exercia em Goa, foi em 1543 acusado de judaizante e condenado a morrer na fogueira.

Na Metrópole, em 25 de Abril de 1561, foi preso como judaizante outro médico, Francisco de Orta, sobrinho direito de Garcia de Orta, pois era filho de seu meio irmão Jorge de Orta, acabando por sair reconciliado em auto-de-fé que se fez em Évora a 12 de Setembro de 1563. O processo deste (n.º 5217-Évora)  é importante porque na genealogia consta: “(Francisco de Orta) tinha um tio, meio irmão de seu pai, que andava na Índia e se chama o Doutor Garcia Orta”. Scripta manent  e este escrito foi certamente transmitido à Inquisição de Goa, quando esta entrou no auge da sua actividade.

O prestígio de Garcia de Orta  deveria ser muito grande, pois ninguém lhe tocou enquanto vivo e foi até testemunha de defesa de alguns acusados de judaismo (cf. Depoimento de 28 de Fevereiro de 1558, sobre Diogo Soares). Manteve sempre a aparência de cristão e, quando sua mãe faleceu em 1557, conseguiu que fosse enterrada na Sé de Goa.

Garcia de Orta foi sem dúvida amigo de Camões, que escreveu a poesia inserida nos Colóquios, a primeira dele a ser publicada em livro. Os Colóquios estão datados de 10 de Abril de 1563 e foram impressos por João de Endem, alemão que foi tipógrafo em Goa de 1561 a 1573.  O mestre tipógrafo estava ausente e quem compôs o texto foi um operário sem experiência, donde as gralhas e incorrecções que abundam na obra.  Alguns exemplares vieram sem dúvida para Portugal, entre os quais o que caiu nas mãos de Charles de l’Ecluse (Carolus Clusius), que foi o grande divulgador de Garcia de Orta, por o ter resumido e traduzido para latim.  Mas na Índia, todos desapareceram, provavelmente na fogueira dos inquisidores.

Em 28 de Outubro de 1568, Catarina de Orta foi presa pela Inquisição. Pelo processo (n.ºs 1282/3-Lisboa), ficamos a saber que Garcia de Orta falecera meses antes, devendo ter tido funeral católico, embora com alguns elementos do ritual judaico. À data da morte, Garcia de Orta aparentava mais idade do que a que tinha na realidade, possivelmente devido à sífilis de que sofria e que havia pegado a sua mulher.

Catarina de Orta confessou as suas convicções de judia, denunciou os familiares, entre os quais seu irmão, foi condenada a morrer na fogueira e foi queimada em 25 de Outubro de 1569.

O Santo Ofício não estava ainda satisfeito: era preciso também julgar e castigar os mortos. Seria difícil que o Inquisidor-mor Aleixo Dias Falcão o fizesse, depois de ter exarado a sua aprovação nos Colóquios. Mas este abandonara o serviço em 1572 e fora substituído por Bartolomeu da Fonseca. Este presidiu ao auto-de-fé de 4 de Dezembro de 1580, relativamente ao qual foi exarado: “Garcia dorta xpão novo português defunto morador que foi nesta cidade por judeu entregue seus ossos a justiça secular. Relaxado.”

Desenterraram-se os seus ossos e foram queimados na fogueira. As cinzas foram lançadas à água. Os exemplares do seu livro foram também certamente queimados.

 

 

EDIÇÕES

 

 

Coloquios dos simples, he drogas e cousas mediçinais da India, e assi dalgũas cousas tocantes amediçina, pratica, e outras cousas boas, pera saber , cõmpostos pelo Doutor Garcia dorta: físico del Rey nosso senhor, vistos pelo muyto Reverendo senhor, ho licenciado Alexos diaz: falcam desembargador da casa da supricaçã inquisidor nestas partes. Com privilégio do Conde viso Rey. Impresso em Goa, por Joannes de enden as x. dias de Abril de 1563 annos.

 

Em 1567, Charles de l’Ecluse publica uma revisão e tradução algo resumida - não está online.

 

Outra edição:

 

Aromatum, et simplicium aliquot medicamentorum apud indos nascentium historia, primum quidem Lusitanica lingua.per Diálogos conscripta, D. Garcia ab Horto, Proregis Indiæ medico auctore; nunc vero Latino sermone in Epitomen contracta, & iconibus ad vivum expressis, locupletioribusq[ue] annotatiunculis illustrata a Carolo Clusio Atrebate.

Antuerpiae : ex officina Christophori Plantini..., 1574, 227 pag.

 

Online: http://alfama.sim.ucm.es/dioscorides/consulta_libro_b.asp?ref=x532305360

 

3.ª edição:

 

Aromatum, et simplicium aliquot medicamentorum apud indos nascentium historia / primùm quidem Lusitanica lingua per Dialogos conscripta, D. Garcia ab Horto Proregis Indiæ medico auctore; nunc vero Latino sermone in Epitomen contracta, & iconibus ad vivum expressis, locupletioribusq[ue] annotatiunculis illustrata a Carolo Clusio ...

Antuerpiae : ex officina Christophori Plantini..., 1579, 217 pag.

 

Online: http://alfama.sim.ucm.es/dioscorides/consulta_libro.asp?ref=X532610023&idioma=0

  

Anotações à obra, escritas por Charles de l’Ecluse

 

Caroli Clusii Atreb,  Aliquot notae in Garciae Aromatum historiam

Antuerpiae : ex officina Christophori Plantini..., 1582, 43 pag.

 

Online: http://alfama.sim.ucm.es/dioscorides/consulta_libro_b.asp?ref=x533811731

  

4.ª edição:

 

Aromatum, et simplicium aliquot medicamentorum apud indos nascentium historia / primùm quidem Lusitanica lingua per Dialogos conscripta, à D. Garçia ab Horto Proregis Indiæ medico auctore; deinde Latino sermone in Epitomen contracta, & iconibus ad viuum expressis, Locupletioribusq[ue] annotatiunculis illustrata à Carolo Clusio, Quarta editio, Castigatior, & aliquot locis auctior. 

Antuerpiae : ex Officina Plantiniana, apud viduam, & Ioannem Moretum, 1593, 455 pag.

 

Inclui as obras de Cristóvão da Costa e de Nicolau Monardes:

 

Christophori a Costa... Aromatum & medicamentorum in Orientali India nascentium liber / Caroli Clusii... opera ex Hispanico sermone Latinus factus, in Epitomen contractus... (pp.[225]-312). - Simplicium medicamentorum ex nouo orbe delatorum, quorum in medicina usus est, historia / Hispanico sermone... descripta à D. Nicolao Monardis... ; Latio deinde donata, & in vnus volumen contracta... à Carolo Clusio... Tertia editio, auctior et castigatior... (pp.[313]-[407]). - Simplicium medicamentorum ex nouo orbe delatorum, quorum in medicina vsus est, historiae liber tertius / Hispanico sermone nuper descriptus à D. Nicolao Monardes... ; nunc verò primùm Latio donatus, & notis illustratus à Carolo Clusio... Altera editio, auctior & castigatior (pp.[409]-456)

 

Online: http://web.bg.uc.pt/BibliotecaDigital/Obras/RB-33-13/RB-33-13_item1/index.html

Online: http://alfama.sim.ucm.es/dioscorides/consulta_libro.asp?ref=X532262890&idioma=0

 

5.ª edição:

 

Caroli Clusii... Exoticorum libri decem : quibus animalium, plantarum, aromatum, aliorumque peregrinorum fructuum historiae describuntur ; Item Petri Belloni Obseruationes, eodem Carolo Clusio interprete

Leiden : in Officina Plantiniana Raphelengii, 1605

 

Online: http://alfama.sim.ucm.es/dioscorides/consulta_libro.asp?ref=x533407760

  

Esta edição contém (numeração do software)

 

Pag. 161 – Garcia da Orta      Notas: pag. 258

Pag. 269 – Cristóvão da Costa

Pag. 310 – Nicolau Monardes – Simplicium medicamentorum historia

Pag. 395 – Índex rerum

Pag. 404 – Nicolau Monardes – Magna medicinæ secreta

Pag. 484 – Petri Belonii Observationes

Pag. 706 – Petri Belonii – De neglecta plantarum cultura libellus

 

 

Traduções para italiano, a partir do resumo em latim feito por Charles de l’Ecluse

 

A 1.ª edição da tradução, feita por Annibale Briganti, saiu em 1576.

 

Due libri dell'historia de i semplici, aromati, et altre cose, che vengono portate dall'Indie Orientali, pertinenti alla medicina, di don Garzia dall'Horto, medico portughese; con alcune breui annotationi di Carlo Clusio. Et due altri libri parimente di quelle che si portano dall'Indie Occidentali, di Nicolò Monardes, medico di Siviglia. Hora tutti tradotti dalle loro lingue nella nostra italiana da m. Annibale Briganti, marrucino da ciuità di Chieti, dottore & medico eccellentissimo.

In Venetia : [al segno della Fontana], 1576 ([Venezia : Altobello Salicato]).

Contiene anche: Della historia de i semplici, aromati, et altre cose che vengono portate dall'Indie occidentali, pertinenti all'uso della medicina; scritta dall'eccellente dottore & medico, Nicolò Monardes di Siviglia.

Online: http://143.107.31.150/bibliotecaPdf/Lt-916_WEB.pdf

 

Houve duas edições em 1582.

 

Seguiu-se esta:

 

Dell'historia de i semplici aromati. et altre cose, che vengono portate dall'Indie Orientali pertinenti all'uso della medicina di don Garzia dell' Horto e annotazioni di Carlo Clusio. Due altri libri di quelle che si portano dell'Indie Occidentali di Nicolò Monardes, tradotti da Annibale Briganti.

In Venetia : appresso li heredi di Francesco Ziletti, 1589

 

Online: http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k59512j

 

Inclui textos de Nicolau Monardes, mas não a obra de Cristóvão da Costa.

 

A tradução italiana teve pelo menos oito edições, entre as quais esta:

 

Dell'historia de i semplici aromati. et altre cose, che vengono portate dall'Indie Orientali pertinenti all'uso della medicina di don Garzia da  L'Horto, Medico Portughese, con alcune brevi Annotationi di Carlo Clusio. Parte prima divisa in quattro Libri. Et due altri libri parimente di quelle cose che si portano dall'Indie Occidentali di Nicolò Monardes, Medico di Siviglia. Hora tutti tradotti dalle loro lingue nella nostra italiana da M Annibale Briganti.

In Venetia  M DXCVII: appresso l' Heredi di Girolamo Scotto

Online: http://fermi.imss.fi.it/rd/bd?lng=en

 

 

Tradução para francês

 

Histoire des Drogues, Espiceries, et de certains medicamens simples, qui naissent és Indes, tant Orientales que Occidentales, divisée en deux parties. La premiere composée de trois livres : les deux premiers de M. Garcie du Jardin, et le troisieme de M. Christophe de la Coste. La seconde composée de deux livres de M. Nicolas Monard, traitant de ce qui nous est apporté des Indes Occidentales, autrement appelées les Terres Neuves. Le tout fidelement translaté en nostre vulgaire François sur la traduction Latine de Clusius : Par Anthoine Colin Apoticaire Juré de la ville de Lyon, et par lui augmenté de plusieurs figures.

A Lyon, Par Jean Pillhotte, à l’enseigne du nom de Jesus, 1602, Avec Privilege.

 

Não está online ; na BNL existe a edição, praticamente igual, de 1619

 

Comentador e crítico :

 

Jacques de Bondt ou Jacobus Bontius (1592-1631)

Iacobis Bontii In Indijs Archiatri, De Medicina Indorv[m] Lib. IV. Lugduni Batavorum, 1642, Hackius

 

Liber I - Notæ in Garciam ab Orta

 

Animadversiones in Caput III. Garciae ab Orta quod inscribitur de Altiht, seu Assa foetida. Iavanis ac Malaiis hin' dicta

In Lib II. Graciae ab Orta. de Plantis quibusdam Indicis Iacobi Bontii animadversiones

 

Online: http://dz-srv1.sub.uni-goettingen.de/cache/toc/D269634.html

 

Plagiador:

 

Discursos de las cosas aromaticas, arboles y frutales, y de otras muchas medicinas simples que se traen de la India Oriental y sirven al uso de la medicina. Autor el Licenciado Juan Fragoso, medico e cyrugiano de Su Magestad.

Impresso en Madrid : En Casa de Francisco Sanchez : Vendese en Casa de Sebastian Yañez..., 1572

 

Online: http://bibliotecaforal.bizkaia.net/search/tDiscursos+de+las+cosas+aromaticas/tdiscursos+de+las+cosas+aromaticas/1,1,1,B/l962&FF=tdiscursos+de+las+cosas+aromaticas&1,0,,001890,-1

 

Edições modernas

 

Preparada por Francisco Adolfo de Varnhagen:

 

Colloquios dos simples, e drogas e cousas medicinais da India, e assi de algumas fructas achadas nella (Varias cultivadas hoje no Brasil) compostos pelo Doutor Garcia de Horta, Physico d’elRei D. João III / 2.ª Edição/ Feita proximadamente pagina por pagina, pela primeira, impressa em Goa por João de Endem no ano de 1563.

Lisboa, na Imprensa Nacional, 1872

 

Garcia da Orta, Colóquios dos simples e drogas da Índia, Ed. dirigida e anotada pelo Conde de Ficalho. Lisboa, Imprensa Nacional 1891-1895, 2 vols.

Online: www.archive.org

 

Colóquios dos Simples e Drogas da Índia, Imprensa Nacional, Lisboa, 1987 – Reedição em fac-simile da edição anterior do Conde de Ficalho, 2 vols.

 

Colóquios dos simples e drogas e cousas medicinais da índia, Lisboa, Academia das Ciências, 1963 – Reprodução em fac-simile da edição impressa em Goa em 10 de Abril de 1563, 217 pags.

 

Tradução para inglês da edição do Conde de Ficalho, com adaptações:

 

Colloquies on the simples & drugs of India, by Garcia de Orta, New edition (Lisbon, 1895) edited and annoted by the Conde of Ficalho, translated with an introduction and index by Sir Clements Markham (1830-1916). London, Henry Sotheran ; Printer – Edinburgh, R. & R. Clark, 1913, 509 pags.

 

Foi feita uma reimpressão em fac-simile desta edição em Dehli em 1979, editada pelo periodical Expert Book.

 

 

Cristóvão da Costa

 

(1530 ? - 1595?)

 

Cristóvão da Costa ou Cristóvão de Acosta deverá ter nascido por volta de 1530, em Tânger ou Ceuta. Alguns autores dão-no como nascido em Cabo Verde ou Moçambique, mas deve ser um equívoco. Nasceu em África, pois assinava por vezes, o Africano. Era cristão novo, filho de judeu que fugira para África. Também usou o nome de Boaventura, em espanhol, Christobal d’Acosta de Buenaventura, acrescentando, por vezes, Africano.

Há que não confundir com Christobal d’Acosta, missionário jesuíta espanhol, irmão do também jesuíta José d’Acosta, autor de Historia Natural y Moral de las Índias.

Nas Notícias de Portugal, Manuel Severim de Faria diz que estudou medicina em Coimbra, mas não foram encontrados documentos que o comprovassem.

Deverá ter exercido a profissão de médico em Portugal. Em 7 de Abril de 1568, parte para a Índia, como médico no séquito do vice-Rei D. Luiz de Ataíde. Chegou a Goa em 10 de Setembro de 1568 e já não encontrou Garcia de Orta que terá falecido no primeiro semestre desse ano. É certo porém que teve e estudou um exemplar do livro de Garcia de Orta.

Pouco depois ficou prisioneiro, quando exercia as suas funções num navio da armada comandada por Martim Afonso de Miranda. No segundo semestre de 1569, é médico do Hospital Real de Cochim, onde tratou grandes febres, como conta no cap. XXV do seu livro (pag. 206 e ss.).

Cristóvão da Costa era de feitio aventureiro e andou por muitas terras da Índia, mencionando Tanor, no Malabar e Maluco. Deverá ter regressado a Portugal com o seu protector Luiz de Ataíde, em 1572.

Decidiu partir para Espanha com a família, e instalou-se em Burgos, onde começou a exercer medicina privada, ao mesmo tempo que ia escrevendo o seu livro.

Em 7 de Abril de 1576, celebrou um contrato com as autoridades da cidade para desempenhar durante 3 anos as funções de médico municipal, com a remuneração anual de 47 500 maravedis.

Dois anos depois, publicou a sua obra principal, o Tractado de las Drogas y medicinas de las Índias Orientales, depois resumida e traduzida para latim por Charles de l’Ecluse (Carolus Clusius) em 1593.

Ao fim de quatro anos, a sua remuneração foi aumentada para 50 000 maravedis; mas em 1587, deixa de figurar como médico da cidade.  Tendo entretanto enviuvado, diz ele: “depues de viejo y biudo, com hijos y nietos dexado el mundo, me recogi a esta penna de Tyrces”. Terá falecido por volta de 1595.

Como diz Jaime Walter, a obra de Cristóvão da Costa não é, nem um resumo, nem uma cópia, nem uma tradução dos Colóquios de Orta. Foi a reescrita desta obra, acrescida dos dados recolhidos por Costa pessoalmente e dos desenhos que inseriu no Tractado. E conseguiu uma difusão através do mundo que a obra de Orta não teve, a não ser através do resumo latino de Clusius.

 

 

EDIÇÕES

 

 

Tractado de las drogas, y medicinas de las Indias Orientales : con sus plantas debuxadas al bivo por Christoval Acosta medico y cirujano que las vio ocularmente: en el qual se verifica mucho de lo que escrivio el Doctor Garcia de Orta.

Dirigido ala muy nobre y muy mas leal ciudad de Burgos, cabeça de Castilla y camara de Su Magestad

Burgos, por Martín de Victoria, impressor de Su Magestad, 1578, 448 pag.

  

Online: http://alfama.sim.ucm.es/dioscorides/consulta_libro_b.asp?ref=x531446734

 

Resumo de Charles de l’Ecluse

 

Christophori a Costa Medici et Chirurgi, Aromatum et medicamentorum in Orientali India nascentium liber : Plurimum lucis adferens iis quae a Doctore Garcia de Horta in hoc genere scripta sunt. CAROLI CLUSII Atrebatis opera ex Hispanico sermone Latinus factus in Epitomen contractus et quibusdam notis illustratus. Antuerpiæ, Ex officina Christophori Platini, 1582, In 8.º, 88 p.   

 

Online: http://alfama.sim.ucm.es/dioscorides/consulta_libro_b.asp?ref=x531446882

  

Tradução francesa do texto de Charles de l’Ecluse

 

Traicté de Christophle de la Coste  Medecin et Chirurgien, Des drogues et medicamens que naissent aux Indes, servant beaucoup pour l’eclaircissement et intelligence de ce que Garcie du Jardin a escrit sur ce sujet, traduit de l'espagnol au latin ; abregé & illustré de quelques notes par Charles de l'Ecluse d'Arras, et de nouveau mis en françois par Anthoine Colin, M. Apothicaire Juré de Lyon. Et par luy augmenté de plusieurs figures. Seconde Edition. A Lyon, aux depens de Jean Pillehote, à l’enseigne du nom de Jésus. M DC XIX

 

Online: http://alfama.sim.ucm.es/dioscorides/consulta_libro_b.asp?ref=b18817269

 

Tradução italiana do texto espanhol

 

Trattato di Christoforo Acosta africano medico, & chirurgo della historia, natura, et virtù delle droghe medicinali, & altri semplici rarissimi, che vengono portati dalle Indie orientali in Europa, con le figure delle piante ritratte, & disegnate dal vivo poste a' luoghi propri. Nuovamente recato dalla spagnola nella vostra lingua. Con due indici, uno de' capi principali, l'altro delle cose di più momento, che si ritrovano in tutta l'opera. In Venetia : presso a Francesco Ziletti, 1585., 342 pag.

 

Online: http://alfama.sim.ucm.es/dioscorides/consulta_libro_b.asp?ref=x53226883x

 

 

Edição moderna – Tradução para português

 

Tratado das drogas e medecinas das Indias Orientais, no qual se verifica muito do que escreveu o Doutor Garcia de Orta, por Cristoväo da Costa - versão portuguesa com introdução e notas de Jaime Walter, Lisboa, Junta Nacional de Ultramar, 1964, 356 pag. – Ed. comemorativa do 4o centenário da publicação dos Colóquios dos Simples de Garcia de Orta.

 

Outros livros do autor:

 

Tratado en loor de las mugeres : y de la castidad, onestidad, por Christoval Acosta...En Venesia : Por Iacomo Cornnetti, 1592

Online: http://bibliotecadigital.fl.ul.pt/ULFL036766/ULFL036766_item1/

 

Tratado en contra, y pro de la vida solitaria : con otros dos tratados, uno de la religion, y religioso, otro contra los hombres que mal viven...  por Christoval Acosta, in Venetia : Presso Giacomo Cornetti, 1592

 

Tratado de la religion y religioso, in 4.º, 64 fol.

 

Collacion à los mohatreros, usureros, aparceros tratantes y seducadores, 18 fol.

 

 

TEXTOS CONSULTADOS

 

Wikipedia - Colóquios dos simples e drogas da India

The Galileo Project

 

Bibliotheca lusitana historica, critica, e cronologica : na qual se comprehende a noticia dos authores portuguezes, e das obras, que compuserão desde o tempo da promulgação da Ley da Graça até ao tempo presente, por Diogo Barbosa Machado (1682-1772), 4 vols., 1741. Transcrições: Garcia de Horta ---- Cristóvão da Costa

 

Nicolau António, Bibliotheca Hispana noua : sive Hispanorum scriptorum qui ab anno MD ad MDCLXXXIV floruere notitia / auctore D. Nicolao Antonio ; tomus primus, Madrid, Apud Joachimi de Ibarra, 1783.  Online: Garcia de Orta (págs. 551 do software); Cristõvão da Costa (Pag. 278-279 do software)

 

Augusto da Silva Carvalho, Garcia d’Orta: comemoração do quarto centenário da sua partida para a Índia em 12 de Março de 1534, Coimbra, 1934, sep. Revista da Universidade de Coimbra n.º 12,  208 pags.

 

Conde de Ficalho (1837-1903), Garcia da Orta e o seu tempo, introd. Nuno de Sampaio, Lisboa, INCM, 1983, reprod. Fac-similada da 1.ª edição de 1886

 

Damiäo António Peres, Discurso proferido na sessão solene em 24 de Maio de 1963, comemorativo do IV centenário do aparecimento em Goa dos "Colóquios dos Simples" de Garcia d'Orta, Lisboa, 1963, sep. Boletim da Academia de Ciências de Lisboa n.º 35

 

Jaime Walter, Os Colóquios de Garcia de Orta no Tractado de las Drogas de Cristóvão da Costa, Lisboa, 1963, 34 pags.

 

Luis H. Roddis, New York : Paul B. Hocher, [1930]  Garcia da Horta the first european writer on tropical medicine, reprod. from Annals of Medical History. New Series, 1, 2.

 

“Garcia de Orta (c. 1501-1568)”,  por C.R.B.,  in Dicionário da História de Portugal, org. por Joel Serrão

 

Israel S. Revah (1917-1973), La famille de Garcia de Orta,  Sep. da Revista da Universidade de Coimbra n.º 19, 1960, 16 pags.

 

Augusto Isaac de Esaguy, Garcia Dorta and the Inquisition, sep. do Bulletin of the Institute of the History of Medicine, Vol. V, n.º 5, May, 1937.

  

Dr. Augusto d'Esaguy - Garçia Dorta, físico mór del rei, Lisboa  Editorial Ática, 1934 – Bib. Gulbenkian

 

Maximiano Lemos (1860-1923), História da Medicina em Portugal: doutrinas e instituições, 2.ª ed., Lisboa, D.Quixote, Ordem dos Médicos, 1992, 2 vols.

 

Joäo Manuel Pacheco de Figueiredo, Colóquios dos Simples de Garcia d'Orta 1563-1963, Porto, 1963, Sep. “O Médico”, A. 14

 

Luís de Pina e Maria Olívia Rúber de Meneses, Jacob Bóncio e as suas "animadversões" aos colóquios dos simples e drogas da Índia, Porto, Tip. Sequeira, 1972, Sep. de “O Médico” n.º 901-1968

 

António Jorge Andrade de Gouveia (1905-2002), Garcia d'Orta e Amato Lusitano na ciência do seu tempo, Lisboa, Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, 1985, Biblioteca Breve, 99 pag.

 

P.M. Laranjo Coelho (1878-1969), Três médicos cientistas naturais de Castelo de Vide: Garcia d'Orta, Francisco Morato Roma, José António Serrano, Coimbra, 1953, sep. de "O Instituto", v. 116

 

Miguel Colmeiro [y Penido], La botánica y los botánicos de la Peninsula Hispanolusitana, Imprenta y estereotipia de M. Rivadeneyra, Madrid, 1858.

 

Armando de Jesus Marques, João Cão e Cristóvão da Costa, sep, Boletim Cultural da Junta Distrital, 3, Lisboa,  1974, 14 pags.

 

Joaquín Olmedilla y Puig, Cristóbal Acosta  - estudio histórico de la vida y escritos del sabio médico, botánico y escritor del siglo XVI, Madrid, Impr. de los Hijos de M. G. Hernández, 1899, 92 pags.

  

Jaime Walter, Os Colóquios de Garcia de Orta no Tractado de las Drogas de Cristovão da Costa, Sep. Garcia de Orta, 11, Lisboa, 1963, 34 pags.

  

Humberto Julio Paoli  ou Umberto Giulio Paoli  (1876 – 1953), Il libro di Garcia da Orta : contributo alla storia della scienza lusitana, in Archivio di storia della scienza Vol. 2 (1921-1922), p. 202-210, ISSN 0393-9316

 

Umberto Giulio Paoli, "Cristobal Acosta e le sue opere," in Archeion, 19 (1937), 317-47, ISSN 0392-7865

Parte Prima  -  Vita ed opere del medico naturalista viaggiatore Christobal Acosta de Buenaventura africano (1515-1594);

Parte Seconda -  Piante descritte nelle opere di Christobal Acosta e di Garcia da Orta;

A - Droghe o piante descritte da Acosta e non da Orta

B - Droghe o piante descritte da Orta e non da Acosta

C - Droghe o piante descritte da Orta e da Acosta

Terza Parte -  Edizioni e traduzioni delle opere di Christobal Acosta

    

 

 

 

GARCIA DE ORTA natural da Cidade de Elvas donde depois de estar instruido com os primeiros rudimentos passou a Castella, e nas Universidades de Alcalà, e Salamanca frequentou o estudo da Medecina em que recebeo o grao de Licenciado. Restituido a Portugal foy Lente de Filosofia na Universidade de Lisboa até o anno de1534 em que se embarcou com o lugar de Medico delRey para a India na armada composta de sinco Náos de que era Capitão Mòr Martim Affonso de Souza de cuja familia era domestico, e com elle se achou no anno seguinte de 1535 na Fundação da Fortaleza de Dio, como escreve no Colloquio  35. Tendo adquerido a mais profunda noticia da Arte Medica practicada pela larga experiencia de quarenta annos assim na Europa, como na Asia, se aplicou à investigação das virtudes das plantas, e ervas que produzião as Regioens Orientaes devendose à sua incansavel deligencia manifestar as qualidades que estavão ocultas naquella vegetativa republica, das quais por falta de exame, e conhecimento tinhão escrito tantas fabulas muitos authores assim antigos, como modernos. O methodo com que triunfou das doenças mais rebeldes, e a vasta sciencia que tinha da Botanica lhes conciliarão a estimação não somente dos Governadores do Estado da India, mas ainda de muitos Reys Gentios principalmente do Nizamaluco que muitas vezes o chamou para o curar dando-lhe cada vez que vinha à sua prezença doze mil pardaos, e oferecendo-lhe quarenta mil de estipendio se quizesse assistirlhe quatro  vezes cada anno. Para utilizar o publico com as continuas vigilias, que aplicara na investigação das plantas medicinaes de que he fecundo terreno a India Oriental.

  

Compoz.

 

Colloquios dos Simples, e couzas medicinaes da India, e assi de algumas frutas medicinaes achadas nella, donde se tratão algumas couzas tocantes á Medecina practica, e outras couzas boas para saber. Goa por Joannes de Endem a X. de Abril de 1563 annos. 4. Esta obra que tinha escrito na lingua Latina a publicou na materna por satisfazer á suplica de alguns amigos empenhados em que fosse mais proveitoza a todo o genero de pessoas, e a dedicou a Martim Affonso de Souza havendo 18. annos que com elle se embarcara para a India quando já assistia em Portugal gozando o ocio da paz à sombra das palmas com que se coroou triunfante em o Oriente. A este grande Mecenas antes da Dedicatoria està hum Soneto cujo assumpto declara com este titulo. Do autor falando com ho seu libro, e mandao ao Senhor Martim Afonso de Souza.

  

Seguro livro meu, da qui te parte,

      Que com huma causa justa me consolo,

De verte oferecer ho inculto colo,

      Ao cutello mordás, em toda a parte.

E esta he, que da qui mando examinarte,

      Por hum Senhór, que de hum ao outro polo,

Sò nelle tem mostrado ho douto Apollo

      Ter competencia igual có duro Marte.

Ali acharás defensa verdadeira

      Com força de razoens, ou de Osadia,

Que huma virtude a outra não derrogua.

      Mas na sua fronte há Palma, e há Oliveira,

Te dirão que elle só, de igual valia

      Fez co sanguineo arnez, ha branca Togua.

 

Seja o primeiro elogio desta obra a erudita informação do Doutor Dimas Bosque Medico Valenciano, que naquelle tempo vivia em Goa, e sahio impresso no principio dizendo entre outros louvores.

Força tambem a authoridade do Autor aos que este seu livro lerem ter as couzas delle na conta, e estima, que ellas merecem, pois são de homem, que do principio da sua idade até a authorizada velhice nas letras, e faculdade de Medecina gastou seu tempo com tanto trabalho, e deligencia, que duvido achar na Europa quem em seu estudo lhe fizesse vantagem. O celebre Poeta Henrique Cayado lhe dedicou o seguinte epigramma em louvor de obra.

 

India quos frucus, gemmas, & aromata gignat,

      Garcia pescribit D'ortius illa brevi.

Hoc opus, ò medici, manibus versetur ubique

      Quod veteres olim non valuere viri.

Multa quidem vobis per quae medicina paratur

      Occurrent, tenebris, quae latuere diù.

Rarus honos, doctor, tantas aperire tenebras

      Plinius es terris, atque Dioscorides.

Qui quamvis ausi, magnis de rebus uterque

      Scribere, judicio cedet uterque tuo.

Namque potens herbis, toto Podalyrius orbe

      Diceris, & verá laude parare decus.

Forsitan & quaeras cur non sermone Latino

      Utitur, ò Lector: consulit indocili.

Floret utraque nimis lingua cum postulat usus,

      Excellens Medicus, Philosophusque simul.

 

Em diversa lingua, mas com mayor energia lhe corresponde o mais canoro Cisne do Parnasso Portuguez o divino Camoens assistente naquelle tempo em Goa na Ode 8. derigida a D. Francisco Coutinho Conde de Redondo, e Vicerey da India.

 

Favorecey a antiga

      Ciencia que já Aquilles estimou:

Olhay que vos obriga

O ver que em vosso tempo rebentou

O fruto de aquell'Ortaonde florecem

Plantas novas, que os doctos não conhece.

 

      Olhay que em vossos annos

Huma Orta produze varias ervas

      Nos campos Indianos

As quaes aquellas doctas, e protervas

Medea, e Circe nunca conhecerão

Posto que a Ley de Magia excederão.

 

E vede carregado

      De annos, e tras a

varia experiencia

Hum velho que ensinado

Das Gangeticas Musas na Ciencia

Podaliria sutil, e arte Sylvestre

Vence ao velho Chiron d' Aquiles Mestre

  

Christovão da Costa, de quem fizemos memoria em seu  lugar, no Tratado de las Drogas, e Medicinas de las Indias Orientales diz no Prologo.

 

Encontrè en las Indias Orientales con el Doctor Garcia de Orta medico Portuguez, y Varon grave de raro, y peregrino ingenio, cuyos loores dexo para mejor ocasion por ser tantos que quando pensasse aver dicho muchos serian más los que me auria dexado.  

 

Depois de relatar varias circunstancias porque se fazia digna de estimação a obra que imprimira o Doutor Garcia de Orta, conclue.

 

Pareciendome a mi, que en esta nuestra nacion seria aquel libro de grãde provecho se se diesse noticia de las cosas buenas que en el ay mostrandose con sus exemplos, y figuras para mayor conocerlas... zelozo del bien desta tierra con la charidad que a mis proximos devo deliberè tomar este trabajo, y debuxar vivo cada planta sacada de raiz abueltas de otras muchas, que yo vi, y el Doctor Garcia d'Orta nò pudo por las cauzas dichas.

 

Donde se colhe que traduzio a obra dos Colloquios de Garcia de Orta em Castelhano, assim como a verteo em Latim Carlos Clusio mais abreviadamente com este titulo.

 

Aromatum, et simplicium aliquot medicamentorum apud Indos nascentium Historia: primum quidem Lusitana lingua per Dialogos conscripta a D. Garcia ab Horto Proregis Indiae Medico auctore. Nunc vero Latino sermone in Epitomen contracta, & iconibus ad vivum expressis, locupletioribus annotatiunculis illustrata a Carolo Clusio Atrebate Antuerpiae apud Christophorum Plantinum 1567. 8. & ibi apud eumdem Typ. 1574. 8. et 1582. 8. 1584. 8. & ibi apud Viduam Joannes Moreti. 1593. 8. 

 

O Traductor na Epistola dedicatoria diz. Perlectum librum haud mendaci titulo insignitum esse deprehendi: etenim multarum plantarum meminit, quae á Veteribus haudquaquam descripta sunt; atque etiam de iis aromatibus agit quae veteribus quidem descripta, & non satis perspecta fuere. Sahio com humas doutissimas illustraçoens de João Boncio Medico de Leyden. Lugd. Batau. 1642 X. 12. João Posthio Medico Alemão louva com este epigrama ao Tradutor, e ao Traduzido.

 

Gratia magna tibi debetur Garcia: nec non

      Gratia debetur Carole magna tibi.

Tu quoniam nobis latio sermone dedisti

      Ille suis patrio, quae dedit ante sono.

Vestra simul vivent igitur praeconia, donec

      ndia fertilibus pharmaca mittet agris.

  

O Doutor Anibal Briganti Marracino de Chieti tradusio esta obra em a lingua Italiana com este titulo.

 

Dell' historia de i semplici aromati, e altre cose che vengono portate dell' Indie Orientali pertenente al uso de la Medecina scritta in lengua Portughese dell' excellente Doctore Garcia del Horto.Venetia por Francesco Ziletti. 1582. 4. & ibipor le heredi de Hyeronimo Scoti. 1605. 8. e na lingua Franceza por Antonio Colin. Pariz. 1609. 8. e 1615. com o apellido du Jardin.

 

Fazem illustre memoria de Garcia de Orta Nicol. Ant. Bib. Hisp.Tom. 1. p. 395. col. 1. eximio ingenio, & multa vir doctrina, rerumque imprimis Indicarum peritia instructissimus. Zacut. Lusit.de Med. Princip. Hist.  lib. 5. hist. 28.diligentissimus scriptor.Joan. Soar. de Brito Theatr. Lusit. Litter. lit. G. n. 6.Medicus clarissimus. O Doutor Dimas Bosque na Carta Latina escrita ao Doutor  Thomas Rodrigues da Veyga Cathedratico de Prima de Medecina do qual era seu discipulo, lhe chama  prudentissimus senex.Severim  Disc. de Var. Hist. fol. 50. "cujos livros são muito estimados. Leitão  Mem. Chronol. da Univ. de Coimb. pag.517.até 529.

 

 

 

 

 

CHRISTOVAM DA COSTA. naceo na Cidade de Tangere como querem huns, ou na de Ceuta, como escrevem outros, ambas celebres colonias dos Portuguezes na Região Africana. Foy insigne Botanico a cujo estudo se applicou com incansavel disvelo na sua patria, e depois passando à Asia com o partido de Medico do celebre, e claro Varão D. Luiz de Attayde Vice-Rey da India para adquirir mayor conhecimento das virtudes medicinaes das ervas, e plantas que produz aquella vasta Região, peregrinou por diversos Climas, onde padecendo fomes, e cativeiros não lhe servirão de obstaculo para desistir de investigar em beneficio dos homens os mayores segredos da natureza, assiim como o tinhão feito Platão, e Aristoteles observando a fabrica do universo. Não sómente exercitou com felicidade, e sciencia as faculdades da Medicina, e Cirurgia, mais ainda para defender o Estado da invasão dos inimigos desempenhou as obrigaçoens do Soldado mais disciplinado mostrando em varias occasioens que não era menos instruido na palestra de Esculapio, que na de Marte. Depois de ter discorrido pela mayor parte do mundo em que alcançou grande fama o seu nome, voltou a Portugal donde passou a Castella, e vendo-se livre do vinculo conjugal se recolheo a Solitaria Serra de Tyrses, onde escreveo as felicidades do estado da Solidão, podendo justamente gloriarse de ter illustrado com a sua sciencia, e pessoa as mayores tres partes do mundo como elegantemente o epilogou neste Dysticho huma discrete Musa.

 

Africa te genuit, te fertilis Asia pavit;

nunc Europa Doctor Acosta tenet.

 

He celebrado por Famoso Medico pelas penas de Gaspar Reys Franco Camp. Elys. Jucund. Quaest.  Quaest. 67. n. 27. Zacut. Lusitde Med. Princip. Histor. lib. 2. Hist. 45. Christian. Mentzelio in Ind. nom. Plant. Celeb. Ant. de Leon. Bib. Orient. Tit. 14. Sever. de Faria  Vid. de João de Barros  pag. 51. D. Nicol. Ant.  Bib. Hisp. Tom. 1. pag. 185. col. 2. Joan. Suar. de Brito  Theatr. Lusit. Litterat. lit. C. n. 3.  No livro intitulado Quinquaginta virorum D.D.  qui bene de studiis litterarum meruerunt cum eorum elogiis.  &c está o seu retrato, e na parte inferior tem estes quatro versos.

 

Noscendis multum tu Costa excellis in herbis

        Nominis at passim haud cognita fama tui est.

Sed mentis ut spero tuis tua gloria crescet,

        Et per te hortensi crescit honor studio.

 

Compoz.

  

Tratado de las drogas, y medicinas delas Indias Orientales .Burgos por Martin de Victoria .  1578 .

 Alguma parte desta obra foy extrahida da que neste mesmo argumento tinha escrito Garcia de Horta, de quem em seu lugar fallaremos, como o mesmo Christovão da Costa ingenuamente confessa. Sahio traduzido este Tratado por Carlos Clusio natural da Cidade de Arraz com o titulo seguinte.

 

Christophori a Costa Medici, et Chirurgi aromatum, et medicamentorum in Orientali India nascentium liber plurimum, lucis afferens iis, quae à D. Garcia ab Horto in hoc genere scripta sunt. Caroli Clusii Atrebatis operà ex Hispano Latinus factus &c.Antuerpiae,ex Officina Plantiniana apud Joannem Moretum 1582 .  8.& ibina mesma Officina 1593 .

 

Traduzido em Italiano Venetia por Ziletti 1585P. e em Francez juntamente com a obra de Garcia de Orta a quem o traductor chama du Jardin Lugd. 1619 .  8.

 

Tratado en loor delas Mugeres, y dela Castidad, Constancia, Silencio, y Justicia con otras muchas particularidades, y varias historias.Venetia por Giacomo Cornetti 1592 .  4.

 

No principio deste livro se lê huma advertencia de hum amigo do Author em que diz ter visto, e examinado as seguintes Obras de Christovão da Costa de cuja lição se podião extrahir muitos documentos, as quaes tinhão os titulos seguintes.

 

Tratado en contra, y pro dela vida Solitaria con otros dós tratados, uno dela Religion, y Religioso; otro contra los hombres que mal viven.Venetia por Giacomo Cornetti 1592 .  4.

 

Del Amor divino, del natural, y humano con un discurso del amor natural, y delo que devemos alos animales. Tres dialogos Theriacales, uno delos animales con la Justicia; otro dela Abeja con la Justicia; otro dela verdad con la justicia, y con los vivos; otro entre el Mosquito Arador, y Hormiga con la Justicia.

 

Discurso del Viage delos Indios Orientales, y lo que se navega por aquellas partes.

 

Tratado dela Vida Solitaria, y Religiosa de Mugeres, y otro dela Religion, y del Religioso

 

 

LUIS DE CAMÕES

  

Aquele único exemplo


Ode VIII

 


        Aquele único exemplo
de fortaleza heróica e de ousadia,
        que mereceu, no templo
da eternidade, ter perpétuo dia
o grão filho de Thétis, que dez anos
flagelo foi dos míseros Troianos;

        não menos ensinado
foi nas ervas e médica notícia
        que destro e costumado
no soberbo exercício da milícia:
assi qu’as mãos que a tantos morte deram,
também a muitos vida dar puderam.

        E não se desprezou
aquele fero e indómito mancebo,
        das artes que ensinou
para o lânguido corpo o intenso Febo
que, s’o temido Heitor matar podia,
também chagas mortais curar sabia.

        Tais artes aprendeu
do semiviro mestre e douto velho,
        onde tanto cresceu
em virtude, ciências e conselho,
que Télefo, por ele vulnerado,
só dele pôde ser depois curado.

        Pois a vós, ó excelente
e ilustríssimo Conde, do céu dado
        para fazer presente
de heróis altos o tempo já passado;
em que bem trasladada está a memória
de vossos ascendentes, honra e a glória:

        Posto qu’o pensamento
ocupado tenhais na guerra infesta,
        ou do sanguinolento

Taprobano ou Achem, que o mar molesta,
ou do Cambayo; oculto imigo nosso,
que qualquer deles treme ao nome vosso;

        favorecei a antiga
ciência, que já Aquiles estimou;
        olhai que vos obriga
verdes que em vosso tempo se mostrou
o fruto daquela horta, onde florecem
plantas novas, que os doutos não conhecem.

        Olhai que, em vossos anos,
uma horta insigne produze várias ervas
        nos campos indianos,
as quais aquelas doutas e protervas
Medeia e Circe nunca conheceram,
posto que as leis da Magica excederam.

        E vede carregado
d'anos, letras e longa experiência,
        um velho que, ensinado
das gangéticas Musas na ciência
podalíria subtil e arte silvestre,
vence o velho Quiron, d'Aquiles mestre;

        o qual está pedindo
vosso favor e ajuda ao grão volume
        que, agora em luz saindo,
dará da Medicina um novo lume,
e descobrindo irá segredos certos
a todos os antigos encobertos.

        Assi que não podeis
negar – como vos pede – benigna aura:
        que, se muito valeis
na sanguinosa guerra Turca e Maura,
ajudai quem ajuda contra a morte;
e sereis semelhante ao Grego forte.


Poema publicado na primeira edição do «Colóquio dos Simples e Drogas da Índia» de Garcia de Orta, em Goa no ano de 1563.