8-2-2006
PAPA JOÃO XXI (Pedro Julião)
(1215 ? - 1277)
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TEXTOS CONSULTADOS
Rectificacion Historica, La nacionalidad portuguesa de Pedro Hispano, por Joaquin Carreras Artau, in Anales de la Asociación Española para el progreso de LAS CIENCIAS, Revista Trimestral, Año I, num. 2, 1934. Valverde, 24 - Madrid
Karl Sudhoff, Pedro Hispano ou, melhor, Pedro Lusitano, Professor de Medicina e Filosofia e, finalmente, Papa João XXI, in IIIe Congrès International d’Histoire des Sciences tenu au Portugal du 30 septembre au 6 octobre 1934. Actes,Conférences et Communications, Lisboa, 1936
Fr. António Brandão – Quarta Parte da Monarquia Lusitana, Oficina de Pedro Craesbeeck, Lisboa, 1632, Livro XV, Cap. XXXXII, Online: http://bibliotecaforal.bizkaia.net/search/abrand{228}ao/abrandao/1,2,8,B/l962&FF=abrandao+antonio+o+cist&1,,4,006283,-1 (págs. 499 a 506 do software)
Novos elementos sobre Pedro Hispano: contribuição para o estudo da sua biografia, por Francisco da Gama Caeiro (1928-1994), Sep. Rev. Portuguesa de Filosofia, 1966 p. 158-174, Faculdade de Filosofia, Braga.
Une nouvelle monographie sur Petrus Hispanus Portugalensis, le Pape Jean XXI, est-elle nécessaire ? , J. M. Da Cruz Pontes, in Recherches de Théologie ancienne et médiévale, Rome XLIV, 1977, Janvier-Décembre, Abbaye du Mont César, Louvain
A obras filosóficas e teológicas de Pedro Hispano (texto policopiado), Manuel António Filipe dos Santos, Tese de Mestrado de Filosofia Medieval – Universidade do Porto, 1994.
A fundamentação do conhecimento na Scientia libri de anima de Pedro Hispano Portugalense (texto policopiado), José Francisco Preto Meirinhos, Tese de Mestrado de Filosofia Medieval – Universidade do Porto, 1989.
Pedro Hispano (texto policopiado) Século XIII, José Francisco Preto Meirinhos, Tese de Doutoramento de Filosofia Medieval – Universidade do Porto, 2002, 1.º vol. 505 pags., 2.º vol. 659 pags.
Petrus Hispanus, O.P., Auctor Summularum (I), Angel D’Ors, in Vivarium, XXXV/1 (1997), pags. 21-71 e DICENDA, Cuadernos de Filología Hispânica, (2001), 19, 243-291.
Petrus Hispanus, O.P., Auctor Summularum (II), Angel D’Ors, Further documents and problems, in Vivarium, 39,2 (2001), 209-254
Petrus Hispanus, O.P., Auctor Summularum (III), Angel D’Ors, “Petrus Alfonsi” or “Petrus Ferrandi”?, Angel d’Ors, in Vivarium, 41, 2 (2003), pags. 249-303.
Petrus Hispanus: Comments on Some Proposed Modifications, Simon Tugwell OP., in Vivarium, 37,2 (1999), págs. 103-113.
MEIRINHOS, J. F., Pedro Hispano Portugalensis? Elementos para uma diferenciação de autores, Revista Española de Filosofia medieval, 3 (1996) pp.51-76
MEIRINHOS, J.F., GIOVANNI XXI, in Enciclopedia dei Papi, Roma : Istituto della Enciclopedia Italiana, 2000, 3 vols., 2.º vol., págs. 427-437, Tradução de Vittoria lo Faro.
Comentadores de A DIVINA COMÉDIA que não identificam Pedro Hispano como Papa |
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Comentadores de A DIVINA COMÉDIA que identificam Pedro Hispano como o Papa João XXI |
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Estes quadros foram feitos a partir de dados colhidos em The Dartmouth Dante Project
LINKS:
Ángel D'Ors: Petrus Hispanus O. P., Auctor Summularum (I) - DICENDA, N° 19 , 2001 |
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(Algumas) OBRAS ONLINE
Petri Hispani summulae logicales, impresso em Veneza em 1586, por Floravantem a Patro,
http://gallica.bnf.fr/document?O=N058864
Clarissimi bonarum artium ac philosophie monarche parisiensis magistri Johannis de Magistris summularum / Petri Hispani glosule exactissime ad mentem doctoris subtilis felici sydere, com comentários de João de Magistris, impresso em Veneza em 1490, por ordem e à custa de Octaviano Scoto, cidadão de Modoetia (Monza). - http://gallica.bnf.fr/document?O=N060721
Textus et Copulata omnium Tractatuum Petri Hyspani etiam Parvorum logicalium et tractatus syncathegorematum (quem aliqui octavum vocant) cum quibusdam aliis sagaciter adiunctis. iterum atque iterum diligentissime correcta secundum doctrinam irrefragabilem divi Thome Aquinatis ac iuxta frequens exercitium magistrorum Colonie infra sedecim domos in bursa Montis regentium: in hunc unum librum congesta, com comentários de Lamberto de Monte, impresso em Nuremberga em 1494, por António Koberger. http://inkunabeln.ub.uni-koeln.de/ - Suchen + Verfasser "Petrus Hispanus" ou "Johannes XXI"
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Comentários:
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Pedro Tartaret, Expositio super summulis Petri Hispanis, impresso c.1500 em Ludgunum (Lyon) por Nicolaus Wolf http://gallica.bnf.fr/document?O=N053195
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Georges de Bruxelles, Expositio super summulas Petri Hispani, cum notis Thomae Bricot, impresso em 1497 em Ludgunum (Lyon), por Franciscus Fradin e Johannes Pivard - http://gallica.bnf.fr/document?O=N052896
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Georges de Bruxelles, Expositio Georgii super Summulis magistri Petri Hispani, 1490, sem indicação de local ou tipografia, http://gallica.bnf.fr/document?O=N052859 |
Thesaurus Pauperum, em latim, impresso em Lugdunum (Lyon), em 1525, por Jacobum Myt
http://gallica.bnf.fr/document?O=N054059 (Pág. 502-540 .pdf)
Tesaurus pauperum, em tradução italiana, impresso em Veneza em 1500, por Giovanni Alvisi de Varesi
http://gallica.bnf.fr/document?O=N058481
Le Trésor des Pouvres, em tradução francesa, impresso em Lyon, por Olivier Arnoullet, em 1567
http://gallica.bnf.fr/document?O=N079064
Segunda parte da
HISTÓRIA ECLESIÁSTICA DOS
Arcebispos de Braga, e dos Santos, e Varões ilustres que floresceram neste Arcebispado.
Por Dom Rodrigo da Cunha Arcebispo e Senhor de Braga, Primaz das Espanhas, nomeado Arcebispo de Lisboa
Ano 1635
Em Braga com todas as licenças necessárias, por Manuel Cardoso impressor e mercador de livros.
D. PEDRO JULIÃO, ou Hispano V do nome e 75.º Arcebispo de Braga.
Capítulo XXXV
Seu nascimento, e dignidades até ser Sumo Pontífice.
1 Nasceu Pedro Julião na cidade de Lisboa, na freguesia de S. Gião (outros dizem de S. Mamede) donde, ou do nome de seu pai Julião, parece tomou o sobrenome. Hispano lhe chamaram por ser de Portugal, um dos Reinos de Espanha. Acabados os estudos das letras humanas, saiu de sua pátria, com ânimo de estudar as outras ciências maiores. Sua inclinação o levou a Medicina, assim por ser naqueles tempos, e nos mais atrasados, ocupação de nobres, como por assim lho ordenarem seus pais. Para estudar, escolheu a Universidade de Montpellier em França. Dali, acabados já seus cursos, se recolheu outra vez a Lisboa, onde naquela Sé lhe foi dado um benefício, por respeito do qual, e por um aniversário lhe doou umas casas suas, que ainda hoje possui aquele Cabido. Escreveu em Lisboao livro que chamam Súmulas da Lógica, que em muitas Universidades de Espanha, e fora dela, se leram, como hoje nas de Portugal, e outras escolas da Companhia se lê o curso Conimbricense, e nas de S. Domingos as Súmulas de Soto, e por ventura, que um ,e outras, entraram em lugar das de Pedro Julião. Escreveu também vários problemas filosóficos à imitação de Aristóteles, e na sua própria faculdade certas regras gerais de Medicina, donde depois tomou muito a escola Salernitana. Compôs mais um livro de vários remédios intitulado Tesouro dos Pobres, para que nele tivesse esta sorte de gente médico, que sem despesas a curasse.
2 Todas estas obras fizeram no Reino, e fora dele, famoso a Pedro Julião, e lhe trouxeram a casa, sem ele as pretender, as maiores dignidades eclesiásticas da Igreja Católica. Digamos primeiro da primeira de Espanha, isto é, do Arcebispado de Braga, no capítulo seguinte diremos do Sumo Pontificado. Morto o Arcebispo D. Martinho Giraldes na cidade de Viterbo no ano de 1271. movido este Cabido das grandes letras de Pedro Julião o elegeu para seu Prelado já no princípio do ano 1272. Faziam nesta ocasião menos cobiçadas as dignidades eclesiásticas do Reino, a cobiça de El-Rei D. Afonso o III e pertinácia, com que tudo queriam meter na Coroa Real seus ministros. Não bastavam queixas, nem censuras, para os compor, ou moderar, assistiam por este respeito na Corte Romana, e solicitavam o remédio, quase todos os Bispos de Portugal, e se bem o Papa Gregório X. que de novo era eleito, escrevia a El-Rei, e lhe mandava seus Legados, a nada deferia, e cada hora se iam as coisas da Igreja totalmente a perder. Fazia tudo isto ao eleito D. Pedro Julião recusar a carga, e escolher antes viver entre os seus livros, que com obrigações de almas alheias, e ocasiões de quebrar com El-Rei, e seus validos, que grandemente se lhe mostravam afeiçoados.
3 Mas como esta resolução respeitava mais ao bem particular, que ao da pátria: e também, porque esta era a última determinação de El-Rei, que desejava mandá-lo autorizado com a dignidade de Primaz ao Concílio de Leão (publicara-se naquele comenos, para o ano de 1274.) houve finalmente de aceitar. A única memória que dele achamos antes de se partir a França ao Concílio, é em 11 de Maio, era 1311. e de Cristo 1273. confirmando a doação feita em Santarém por El-Rei D. Afonso o III a seu genro, e Alferes D. Gonçalo Garcia, de certas herdades em S. Estêvão, diz a firma.
Petrus Julianus electus Bracharensis, confirmat. E sem dúvida, que ainda antes da confirmação, e sagração se partiu ao Concílio, onde deu raríssimas mostras de sua eminente sabedoria. Estando aqui lhe deu o Sumo Pontífice Gregório X, o Capelo de Cardeal, com o Bispado Tusculano, no mesmo dia, em que também fazia Cardeais ao Seráfico Doutor da Igreja S. Boaventura, e a fr. Pedro de Tarantazia Geral da Ordem dos Pregadores, e pouco depois Sumo Pontífice Inocêncio V. o que não é vulgar recomendação do nosso Arcebispo, ser escolhido para aquela dignidade, com dois varões tão eminentes em letras, e virtude.
4 Mas porque dos Autores antigos nenhum, nem levemente acena ser D. Pedro Julião Arcebispo de Braga, e nós também, com alguma dúvida o contamos entre nossos predecessoras no Catálogo, que pusemos no fim da Primazia, necessário será apontarmos aqui alguns dos fundamentos por que agora o admitimos. Seja o primeiro, aquela doação (fica no número passado) feita por El-Rei D Afonso o III. a seu genro, e Alferes D. Gonçalo Garcia, que traz o Cronista mor Fr. António Brandão, e anda no livro do mesmo Rei, que se guarda na Torre do Tombo, fol. 120. Seja o segundo uma carta, que o mesmo Arcebispo, sendo já Cardeal, escreveu da cidade de Perosa, aos Oficiais de Braga, em que assina Eleito de Braga. Achou esta carta, entre os mais papeis do mosteiro do Pedroso, o Doutor João de Barros natural do Porto, e desembargador de El-Rei, na ocasião, que por ordem do Cardeal D. Henrique, Comendatário daquele mosteiro, punha em ordem seu cartório, como ele próprio o certifica na carta, que escreve ao Cardeal, e põe no princípio do livro, em que recolheu todas as escrituras autênticas, pertencentes aos bens daquela casa. Guarda-se este livro no Cartório da fazenda do Colégio da Companhia de JESUS de Coimbra. É a matéria da carta mostrar a sua Alteza, como os engenhos dos Portugueses cultivados, prestaram sempre para muito, principalmente fora do seu natural. E entre outros, traz por exemplo ao nosso D. Pedro Julião, e Sumo Pontífice João XXI. começa assim a carta.
5 Ao mui Sereníssimo Príncipe, e mui ilustríssimo Senhor, o Senhor Infante D. Henrique, eleito Arcebispo, e Senhor de Braga, Primaz das Espanhas, e administrador do Mosteiro de Pedroso, o Doutor João de Barros cidadão do Porto, humilde servidor de Sua Alteza, E depois de outras coisas acrescenta: Da cidade de Lisboa foi natural o Papa João XXI. que primeiro se chamou Mestre Pedro Hispano, e primeiro foi Físico, e fez as Súmulas da Lógica, que hoje se lêem, e assim outras muitas obras. Do qual Pedro Hispano, eu achei neste Cartório uma Epístola selada com seu selo, que ele escrevia sendo Cardeal, estando em Perusio, aos Oficiais de Braga, sendo também eleito Arcebispo de Braga. É este Doutor João de Barros, o que escreveu a Descrição de Entre Douro, e Minho, pela grande noticiam que teve pelos principais cartórios de seus mosteiros, onde fez a mesma diligência, que no do Pedroso. Anda esta obra até agora só de mão, com ser digníssima da estampa.
6. Seja o terceiro, os Autores, que nos certificam, pelas grandes diligências, que nela fizeram. Dos impressos, o Doutor frei António Brandão Cronista mor destes Reinos, em todo o capítulo 32. do livro 15 da Monarquia Lusitana. Dos não impressos, o Doutor João de Barros, que agora acabamos de alegar, e que em sua mão teve a carta do mesmo Arcebispo Cardeal escrita aos Oficiais de Braga. O Padre Cosme de Magalhães da Companhia de JESUS, natural desta cidade, o que escreveu sobre S. Paulo, sobre os Cânticos de Moisés, sobre o livro de Josué, e Juízes, diz ele assim em uma breve memória dos Arcebispos desta Igreja. Petrus ex Archiepiscopo Bracharensi, et postea Cardinali Tusculano, Papa creatus est, et Joannes 21. vocatus a Platina, e Onufrio in Chronico. O Licenciado Gaspar Alvares Lousada escrivão da Torre do Tombo, tão erudito nas antiguidades do Reino, e em especial nas desta Igreja escreve na forma seguinte ao cronista M. Gil Gonçales de Ávila na carta em que lhe vai nomeando por ordem os Prelados de Braga. A D. João sucedeu imediatamente o Arcebispo D. Martim Giraldes, segundo se acha em uma bula de Alexandre IIII. Por sua morte entrou aquele grande, e insigne varão Pedro Hispano, que nasceu em Lisboa e sucedeu a D. Martim Giraldes sendo Cardeal, e depois foi Papa João XXI.
7 Mais dificuldades tem averiguar em que ano entrou neste Arcebispado e se era já então Cardeal da Igreja Romana, ou o foi depois? O que nos aqui embaraça, é aquela doação que fica nos números 3 e 4 de El-Rei D. Afonso o III. a seu genro D. Gonçalo Garcia, em 11 de Maio de 1273, onde anda assinado com título de Eleito de Braga. Logo no ano seguinte de 1274. achamos outra. feita pelo mesmo Rei de certos casais junto a Azambuja, a este seu próprio genro D. Gonçalo Garcia, e a sua filha D. Leonor, onde confirmam D. Vicente Bispo do Porto, D. Domingos eleito de Lamego, D. Mateus de Lisboa, D. Durando de Évora, D. Vasco da Guarda, D. Bartolomeu, de Silves. E se diz: Ecclesia Bracharensis, vacat, Ecclesia Conimbricensis, vacat, Ecclesia Visensis, vacat. O que pode mal estar com a carta, que de Perosa escreveu depois de Cardeal e ainda eleito, aos Oficiais desta cidade, o Arcebispo D. Pedro Julião. Porque o Concílio em que lhe foi dado o Capelo, começou pelo mês de Maio de 1274. e havia de durar pelo menos auele ano, e parte do seguinte. Nem é de crer se sairia neste tempo o Cardeal, da cidade de Leão e se viria a Perosa. Salvo se dissermos, o fez mandado a algum negócio pelo Sumo Pontífice, logo que começou o Concílio, e se lhe deu o Capelo, e que dentro do mesmo ano de 1274. voltou de Perosa a Leão, renunciou o Arcebispado de Braga, fez a saber ao Reino da renúncia, e em Braga se deu Sé vagante, como dia a doação do ano 1274. Mas parece muita pressa em matéria de tanta importância, e que inclui lugares tão distantes, e meses tão poucos, quantos vão de Maio, até Dezembro.
8 Com tudo ele parece foi assim, que de Portugal saiu já Arcebispo de Braga D. Pedro Julião, e que não reteve o Arcebispado mais, que até Julho, ou Agosto do ano de 1274, ou porque se contentava com a nova dignidade de Cardeal, e Bispo Tusculano: ou porque via lhe não podia ser o Arcebispado de Braga de proveito, pois El-Rei tinha lançado mão de suas rendas, depois da morte do Arcebispo D. Martinho Geraldes, que se saíra do Reino a requerer contra ele, e morrera em Viterbo, segundo o que lhe deu depois em culpa o Papa Gregório X. Nem para isto devem parecer poucos três meses, menos de três bastavam para semelhantes negócios se concluírem. Teve logo este Arcebispado pouco mais de dois anos, deixando-o por renúncia, na cidade de Leão em França, onde no mesmo ano de 1274, o Sumo Pontífice Gregório X. lhe deu por sucessor a D. Sancho, o qual assistia no Concílio, como em sua vida diremos.
CAPÍTULO XXXVI
É eleito Sumo Pontífice, chama-se em sua assunção João XXI, escreve a El-Rei sobre a liberdade da Igreja neste Reino, morre dentro de poucos meses.
1 Morto Gregório X (o que deu o Capelo de Cardeal ao nosso Arcebispo) na cidade de Arezzo, da Província de Toscana, em 3 de Fevereiro de 1276. lhe foi logo dado, dentro dez dias por sucessor o Cardeal Fr. Pedro de Tarantasia, Religioso de S. Domingos, e que em sua coroação se quis chamar Inocêncio V. Durou até os 22 de Junho do mesmo ano. E em seu lugar elegeram brevemente os Cardeais a Adriano V. Mas nem a receber a sagração chegou, porque aos 17. do Agosto seguinte, estando em Viterbo, passou desta vida, não tendo mais, que ordens de Evangelho.
2 Entrados no mesmo ano a terceira vez os Cardeais em conclave, já em 13 de Setembro, tinham eleito em Sumo Pontífice ao nosso Cardeal D. Pedro Julião, que se quis chamar João XXI. Foi sua eleição festejada com universal aplauso de toda a Cristandade, porque todos prognosticaram a seus merecimentos aquela suprema dignidade, todos o desejavam nela, porque cada um se tinha por interessado, e se prometia grandes felicidades naquele Pontificado. O que sobre todos os festejou foi El-Rei D. Afonso o III. Mandou por todo o Reino fazer grandes demonstrações de alegria, enviando-lhe logo seus Embaixadores, os quais à volta dos parabéns, lhe fizessem saber o miserável estado em que os Sumos Pontífices seus predecessores tinham deixado este Reino, com censuras e outras penas Eclesiásticas, do qual sua Santidade por Pai universal da Cristandade, e por natural, devia compadecer-se. Respondeu a El-Rei por palavras gerais o Sumo Pontífice, dizendo que nenhuma coisa trazia mais nos olhos, que compor as coisas de Portugal, senão, que para o poder fazer era necessário, que El-Rei levantasse a mão das violências com que trazia oprimida a liberdade Eclesiástica, e pusesse termo aos ministros nesse particular, porque de seus excessos estava cheia a Cúria Romana, e de seus exemplos poderiam aprender outros Reis da Cristandade, quando vissem, que com o de Portugal, onde a fé tanto florescia, se passava com dissimulação. Com isto lhe dava também conta, de como determinava conquistar a Jerusalém, ajuntando em uma santa Liga os Príncipes de Europa, entre os quais o tinha a ele, e a seus vassalos, pelo demais importância, assim pela qualidade de suas forças, como pela generosidade de seu ânimo, e prudência militar.
3 Persuadiu-se El-Rei, com estas palavras do Sumo Pontífice, que tudo o passado acerca das censuras parava, e se podia já levantar o interdito: não advertindo, que nem o Sumo Pontífice ordenava tal, nem que o ordenasse, era sem aquela condição, que ele também cessasse de avexar a Igreja, e lhe restituísse todo, o que lhe tinha usurpado. Eram já àquele tempo mortos em Viterbo os dois Bispos de Coimbra, eleito de Compostela D. Egas, e D. Rodrigo Bispo da Guarda. Apertavam os outros, que ficaram, com o Sumo Pontífice, e ele com El-Rei, sem nunca poder acabar nada. Até que mandou ao seu Núncio, que em Portugal tinha, Fr. Nicolau da Ordem dos Menores, intimasse de novo a El-Rei as bulas dos Sumos Pontífices seus antecessores Gregório X e Inocêncio V. as quais queria estivessem em seu vigor. Assim o fez o Núncio, não só na presença de El-Rei, e de sua corte, mas também por todas as cidades do Reino, como no-lo certifica um instrumento público, que aqui temos, e vai relatando dia por dia, as acções do Núncio fr. Nicolau.
4 Estava entretanto o Sumo Pontífice em Viterbo atendendo ao governo da Igreja Católica. Mas porque o Imperador de Constantinopla Miguel Paleolego, o que no Concílio próximo de Leão tinha dado obediência ao Sumo Pontífice Gregório X, com toda a mais Igreja Grega, começava de novo a vacilar, escreveu-lhe uma alegante carta, animando-o a perseverar no que prometera e convidando-o, a querer também entrar na liga dos Príncipes de Europa acerca da recuperação da terra santa.
5 Repartia além disto o Sumo Pontífice suas rendas com grande liberalidade entre todo o género de necessitados. Provia os benefícios eclesiásticos em pessoas conhecidamente beneméritas, sem respeitar a outras qualidades, que às da virtude, e ciência. Enfim ele se avia no tocante ao governo público, e doméstico, com satisfação: se bem no trato, e autoridade de sua pessoa, guardava às vezes menos gravidade, por ser de condição pouco altivo, e vão e ter muito da bondade, e singeleza, tão própria dos Portugueses daquele tempo. Estranhavam os Romanos, como gente mais dobrada, Pontífice tão humano, ficando-lhe menos aceite, por onde o deveram mais estimar. Deu isto ocasião aos Autores, que depois lhe escreveram a vida de o tratarem em seus escritos com menos decoro, sendo o principal Platina, aquele, que do Pontífice, a quem teve maiores obrigações, deixou escritas maiores calúnias. Mas nem assim, lhe pode negar o muito de letras, e virtudes, que o Céu lhe comunicou.
6 Veio a morrer o Sumo Pontífice ali mesmo na cidade de Viterbo, pouco mais de oito meses, depois de ser eleito, e no tempo que, segundo ele frequentemente dizia, pela ciência da Astrologia, em que era eminentíssimo, se prometia largos anos de vida. Puderam neste particular bem desenganar aquela tão certa, e tão aprovada experiência por todos seus predecessores, que não chegaria nunca aos anos de S. Pedro, como nenhum deles até sua eleição, tinha chegado. Ordenando assim Deus, como a Alexandre segundo escrevia o Cardeal Pedro Damião. Ut humano generi metum mortis incutiat: et quam despicienda sit temporalis vitae gloria, in ipso gloriæ principatu evidenter ostendat: quatenus, dum prædum præcipuus hominum tam augusti temporis compendio moritur, tremefactur quisque as præstolandi sui obitus custodia provocetur: et arbor humani generis, dum cacumen, ac verticem suum tam facile corruisse considerat, flatu concussa formidinis, in suis undique ramusculis contremiscat. A fim de atemorizar os homens com os assombramentos da morte, mostrando-lhe a olhos vistos no mais alto da glória mundana, quão apressada corre a se acabar: pois vendo durar tão pouco o maior dos homens, qualquer outro de menor condição tenha donde aprenda a se velar, e acautelar, contra as incertezas da morte. E quando se vir a árvore da humana geração assim quebrada nos ramos mais altos, tema, e trema a mesma tormenta nos mais baixos.
7 Faleceu (como já começávamos a dizer) na cidade de Viterbo em 20 de Maio de mil e duzentos e setenta e sete, oito meses, e oito dias, depois de Sumo Pontífice. Originou-se-lhe a morte de cair sobre ele, e o apanhar debaixo a ruína de um quarto, que edificava nos paços Pontificais de Viterbo. Na mesma noite do desastre, navegando certo mercador Florentino pelo Mediterrâneo, viu em sonhos um homem agigantado, negro, de medonha acatadura, o qual com uma grande maça, que nas mãos trazia, descarregava sobre uma coluna, que sustentava um grande edifício, e a poucos golpes o fazia ir abaixo. Acordou todo medroso, e sobressaltado o Florentino, advertiu no sonho, e no tempo dele, e depois ouvindo da morte do Sumo Pontífice, ficou entendendo fora prognóstico, e representação, do que lhe sucedera. Seu corpo foi enterrado na Catedral de Viterbo, onde também jazem outros Sumos Pontífices. Dele escrevem Platina, Onufrio, Genebrardo, Chacon, Mariana, Illiescas, Zovio, e outros.
Reinava ainda neste tempo em Portugal, D. Afonso o III.