2-4-2018

 

ESTUDOS FINANCEIROS

Inova-Artes Gráficas, Porto - 1980, separata de Portugal Judiciário

Portugal Judiciário n.º 19, de 15-4-1978, pgs. 8 a 14

Portugal Judiciário n.º 20, de 15-5-1978, pgs. 11 a 13

 

A decisão financeira e as suas condicionantes

 

1.                    PREÂMBULO

O Estado liberal afastava como indesejável toda a intervenção do Estado na vida económica; a atitude daquele devia ser a de uma abstenção total: laissez -faire laissez-contracter, laissez-aller. Era o mercado quem assegurava a produção máxima e a distribuição mais desejável do rendimento.

Por isso, as finanças deviam ser neutras, isto é, não deviam alterar as regras do funcionamento de mercado; a cobrança dos impostos devia ser proporcional ao rendimento de cada contribuinte, de modo a afectar todos par igual. E quanto menor fosse a montante dos impostos cobrados tanto melhor, pois desse modo haveria menos perigo de interferir no livre jogo do mercado.

No final do sec. XIX, constatamos uma significativa mudança: verifica-se que o Estado, através da cobrança dos impostos, dos empréstimos que consegue, da manipulação da moeda e das despesas que efectua, interfere cada vez mais na economia privada: são as finanças intervencionistas.

Esta intervenção do Estado na vida económica tem vindo a crescer em todos as países de economia capitalista, não apenas em termos absolutos, mas também em termos relativos, isto é, na percentagem do respectivo rendimento nacional (1). As razões deste aumento variarão conforme o critério que adoptarmos para a decisão financeira: adiante exporemos algumas doutrinas respectivas.

As modernas finanças intervencionistas desempenham determinadas funções na vida económica da sociedade; e por isso também se Ilhes chama funcionais.

Costumam indicar-se quatro principais funções para as finanças públicas (2):

 

1) Alteração de recursos:

Atribuição dos recursos de que o Estado se apropriou, à satisfação de necessidades públicas.

2) Distribuição de Rendimentos:

Efeitos da obtenção dos recursos pelo Estado na distribuição da riqueza entre os cidadãos.

 3) Estabilidade económica:

Manutenção do nível satisfatório da actividade económica, sem convulsões sociais, e assegurando a plena utilização dos recursos. A estabilidade e a confiança na moeda do país.

 4) Desenvolvimento económico:

Aumento do rendimento total da Nação, garantindo a expansão pelos períodos mais longos possíveis.

 

Enumeradas as funções das modernas finanças públicas, verificamos quão longe estamos das finanças neutras (ou que como tais se pretendiam) dos economistas clássicos.

Hoje todos os Estados precisam de poderosos meios financeiros para ocorrer a todas as múltiplas tarefas que assumiram. Verificamos, aliás, que a carga fiscal é muito mais elevada nos países mais adiantados, isto é, com um rendimento mais elevado per capita: 45,8 % na Dinamarca, 43,7 % na Suécia, 30,6 % na Itália e 22,2 % em Portugal, em 1973 (relação entre o total da tributação, incluindo contribuições para a Segurança Social e o Produto Nacional Bruto) (3). Daqui a constatação empírica de que o montante da intervenção do Estado na economia aumenta em termos relativos com o crescimento económico.

 É verdade, porém, que surgem hoje algumas reacções em sentido contrário, como é o caso, nos U. S. A., do prémio Nobel, Milton Friedman, e da chamada Escola de Chicago: eles pretendem ver diminuído o papel do Estado, deixando maior liberdade às forças do mercado, esperando conseguir assim uma economia mais equilibrada. Mas falta-lhes a verificação prática das suas teorias (4).

 

 2. A DECISÃO FINANCEIRA

 

 À decisão financeira segue-se à decisão económica. Esta resolve genericamente a utilização dos produtos escassos: terra, capital, trabalho. Dir-nos-á, pois:

   — Quais os bens económicos que devem ser produzidos?

   — Em que quantidade deverão ser produzidos?

 

 Mas há duas maneiras de afectar os recursos escassos à produção de bens: uma com base no mercado, e efectuada pelo que chamaremos o sector privado; e outra, efectuada pelo Governo que chamaremos sector público. Qual a justificação para que os bens sejam produzidos pelo sector público? É este o nosso problema, a que chamaremos de decisão financeira, ou de escolha da produção pública. A resolução do nosso problema dir-nos-á como se repartem os recursos entre o sector público e o sector privado e como se estabelecem as prioridades entre as diversas necessidades públicas (5).

 O problema da decisão financeira ou, mais genericamente, da escolha da produção pública tem sido encarado sob diversas perspectivas, que têm na base diferentes conceitos de Estado.

 Poderemos classificar as doutrinas expandidas em quatro grupos:

 1) Teorias individualistas (analise micro-económica) — Finanças positivas.

 Embora elas não coincidam perfeitamente (6), as doutrinas compreendidas nestas duas classificações partem do mesmo conceito de Estado: uma reunião de indivíduos plenamente livres, que vivem juntos, empenhados em relações de troca, quid pro que  (7).

 2) Teorias intervencionistas ou de constrangimento (análise macro-económica) — Finanças normativas.

 Partem da visão do Estado como uma entidade orgânica, separada da sociedade e que, como veremos, procura maximizar o bem de todos os cidadãos. São normativas porque pressupõem determinados fins para a economia financeira.

 3) Teoria institucional: tentativa de síntese das análises micro e macro-económicas.

 Alain Wolfelsperger (8) tenta sintetizar os dois pontos de vista das doutrinas anteriormente referidas acentuando o peso da classe politica na decisão colectiva, isto é, remetendo a escolha para a vontade das instituições políticas.

 4) Teoria marxista-leninista do capitalismo monopolista de Estado.

 O Estado como “instrumento de opressão da classe assalariada nas mãos da classe dirigente capitalista” (9) utiliza os recursos financeiros como meio de evitar a sua própria destruição.

 

 3. TEORIAS INDIVIDUALISTAS

 

 Os autores que defendem estas doutrinas procuram explicar de que modo são repartidos os sacrifícios necessários para a produção dos bens sociais e de que modo são reveladas as preferências individuais em relação à produção de bens públicos.

 Neste campo, encontram-se, antes de mais, dois pontos de vista: um será a ÓPTICA DO BENEFÍCIO, que vem desde Adam Smith e nos leva à teoria da troca voluntária de Lindahl; o outro consiste na ÓPTICA DA CAPACIDADE PARA PAGAR (10), e conduz as recentes formulações de Pigou e Dalton. Estas duas teorias que se referiam prioritariamente a tributação, foram convertidas em doutrinas da afectação de recursos, respectivamente.

   — óptica do benefício — teoria da troca voluntária na afectação de recursos a bens públicos.

   —óptica da capacidade para pagar—teoria da utilidade marginal da afectação de recursos a bens públicos.

 Antes, porém, teremos de dizer algo sobre o chamado “óptimo de Pareto”, isto é, sobre a melhor afectação de recursos intersectorial (sector publico a sector privado). Pareto diz-nos que uma afectação de recursos económicos contribui, de modo não equivoco, para a melhoria do bem-estar colectivo, se o bem-estar de pelo menos um individuo e aumentado sem que o de nenhum outro seja diminuído. Por isso existirá o óptimo de Pareto, quando a afectação de recursos é tal que não pode ser aumentado o bem-estar de ninguém sem que se tenha de reduzir o de pelo menos um individuo. Trata-se de uma teoria do equilíbrio geral, que não serve nem para a estudo dos problemas do crescimento, nem da conjuntura.

 Além disso, pressupõe uma competição perfeita no sector privado, a ausência de economias ou deseconomias externas e a total unanimidade eleitoral na aprovação da direcção do sector público(11).

 Importante é a consideração das situações que não são óptimas no sentido de Pareto, mas dele se aproximam: serão todos os pontos que se situam no interior da curva de afectação óptima intersectorial de recursos.

 

 A) Teoria da utilidade marginal da afectação de recursos e bens públicos

 

 Diz-nos Pigou que a utilidade marginal dos bens públicos deve ser igual à desutilidade marginal dos impostos pagos: deste modo, seria maximizado o bem-estar da sociedade. Seria este o ponto de equilíbrio geral, pois se o Governo aumentasse os impostos e as despesas públicas, a desutilidade marginal da tributação passaria a ser superior à utilidade marginal dos bens públicos; se diminuísse o orçamento, a utilidade marginal dos bens públicos seria superior à desutilidade marginal dos impostos, que deveriam ser aumentados com vista a conseguir o equilíbrio.

 A esta teoria, põem-se duas objecções: a) Não existem meios de quantificar a utilidade ou a desutilidade marginal; b) Ao tomar a sociedade como um todo (no que toma uma certa feição macro-económica), deixa de nos dizer como são distribuídas entre os cidadãos as utilidades numa base individual.

 

 B) Teoria da troca voluntária na afectação de recursos e bens públicos

 

 Esta teoria analisa o sector público par analogia com as leis do mercado: cada cidadão estaria na disposição de pagar um certo preço (um certo montante de impostos) por bens públicos e a procura agregada forneceria o ponto de equilíbrio na intersecção com a curva de produção. Mas de que maneira é que o individuo revelará as sues preferências? Tal só será possível através do voto, isto é, do processo politico.

 A análise da oferta e da procura tanto dos bens públicos como dos bens privados começa no mesmo ponto. O “comprador-contribuinte” é um “contribuinte-votante” que deve revelar as sues preferências por bens públicos ou quase-públicos, através do processo politico: tal como o consumidor o faz através do mercado, em relação aos bens privados ou quase-privados.

 É pois também importante ter em conta as instituições fiscais através das quais as preferências por bens públicos ou quase-públicos podem ser reveladas, como o sistema de preços para os bens privados.

 A politica do bem-estar ou a teoria da escolha da produção de bens públicos é referida sumariamente a seguir na alínea D) e constitui uma continuação natural da teoria dos bens públicos.

 

 C) O modelo da afectação de recursos a bens públicos, de Samuelson (12)

 

 Em Bowen (‘teoria da troca voluntária), o problema da afectação de recursos de acordo com o óptimo de Pareto é separado totalmente do problema de uma repartição óptima: há uma repartição justa, pré-concebida, mas não nos é dito de que modo pode ela ser obtida. Para alem disso, ignora-se o facto de que qualquer medida de produção ou fiscal da parte do Estado altera sempre a repartição inicial e, se esta era dada coma justa, nada nos diz que  o será após a decisão de afectação tomada.

 Samuelson propõe um modelo que procura simultaneamente determinar a repartição e a afectação do recursos.

 Trata-se ainda do uma óptica individualística mas onde se aceite já a possibilidade do comparação das utilidades interpessoais. Se esta possibilidade é rejeitada então apenas se considera o óptimo de Pareto em que  se se aceita aumentar o bem-estar social se uma pessoa ganha em virtude da medida da afectação do recursos, sem que nenhuma outra pessoa diminua o seu bem-estar. Não há possibilidade de valor, o caso em que uma pessoa ganhar enquanto outra perde.

 A possibilidade de comparação das utilidades interpessoais significa que é possível efectuar julgamentos éticos ou do valor em relação a juncão dos “bem estar” individuais para a aquisição do bem-estar social.

 A apresentação de Samuelson utiliza curvas de indiferença pelo consumo.

 Na figura 1, algumas curvas de indiferença representam as preferências do individuo A por um bem público e um bem privado. Cada curva é, portanto o lugar das combinações do bem público (no eixo horizontal) e do bem privado (no eixo vertical) correspondentes a um nível de utilidade dado. As curvas de indiferença entre os mesmos bens para um outro individuo B são dadas na figura 2. Supõe-se que na sociedade apenas existem estes dois indivíduos.

 

 
 

 

A fig. 3 dá-nos as restrições materiais que limitam as possibilidades de satisfazer as necessidades dos indivíduos. São representadas par uma curva de transformação (bloco de possibilidades de produção) que indica em que medida o carácter raro dos recursos disponíveis na economia obriga a sacrificar a produção de um bem para obter uma quantidade suplementar de um outro bem. A concavidade da curva em relação à origem explica-se pela presença de rendimentos decrescentes.

O nosso problema é saber qual a afectação de recursos entre um bem público e um bom privado a entre indivíduos A e B, que pode ser considerada óptima no sentido do Pareto  do ponto de vista ideal de uma repartição justa. Por outras palavras, qual o ponto da curva de transformação que pode responder a estes dois objectivos? Para dar resposta à pergunta é necessário comparar as utilidades individuais. Para isso, fixemos arbitrariamente o nível de grau de satisfação (ou do bem-estar que poderá atingir a individuo B, por exemplo, o que é indicado pela curva de indiferença B2 B2 na figura 2. Tendo em conta a raridade dos recursos disponíveis, qual o ponto da figura I que corresponde à maximização da utilidade do individuo A? Tracemos na figura 3 a curva B2 B2, ou seja B’2 B’2. A subtracção na figura 3, entre esta última curva e a curva das possibilidades de produção, dá-nos a quantidade de bem público e privado que fica disponível para o individuo A Essa diferença pode ser levada para a figura 1 e representada pela curva b b. 0 individuo A colocar-se-á então no ponto K de tangência entre a curve b b e a mais alta curva da indiferença que ela pode atingir. O ponto K indica a afectação óptima dos recursos para A, entre o bem público e o bem privado, depois de ter sido fixado o nível de utilidade que B pode atingir. Neste ponto, uma quantidade OL do bem público é consumida por A e um montante equivalente é consumido por B, ou seja, OM na figura 2. O óptimo é para B o ponto I indicado sabre a curva de indiferença fixada inicialmente, que corresponde a uma quantidade IM de bem privado consumido. Concluindo, no conjunto desta economia em que existem apenas dois agentes, a afectação óptima dos recursos é dada pelo ponto J na figura 3 que corresponde à quantidade ON, igual a OL (na figura 1) e a OM (na figura 2) do bem público e à quantidade JN do bem privado que é igual à soma das duas quantidades consumidas pelos dois indivíduos.

Mediante fixação arbitrária de um nível de utilidade para o individuo B, a situação representada pelas três figuras óptimas no sentido de Pareto, porque seria impossível melhorar o nível do bem-estar de um indivíduo sem reduzir o do outro.

Note-se porém que haverá tantas soluções óptimas no sentido de Pareto, quantas curvas de indiferença onde se colocar o individuo B, isto é, tantas quantas as repartições concebíveis de rendimento entre A e B. Não é que todos os pontos sejam equivalentes; mas para os comparar, é preciso recorrer a um julgamento de valor, a uma comparação interpessoal de utilidade.

O julgamento de valor é-nos dado por Samuelson pela função de bem-estar social, que permite comparar o bem-estar de cada individuo e saber se o bem-estar colectivo é ou não aumentado, quando o bem-estar de outro indivíduo ou dos dois (em sentido contrário) variou. Trata-se de uma visão mais ampla que o critério de Pareto: este é incapaz de nos elucidar sobre a variação do bem-estar colectivo, quando o bem-estar de um individuo foi melhorado, com prejuízo de um outro. Mas ao recorrer à função social do bem-estar sai-se do domínio da teoria da troca; o julgamento de valor tem de ser fruto de uma decisão politica ou então por referência a um eventual interesse geral superior às vontades individuais.

A função de bem-estar social pode ser representada graficamente como na figura 4, por meio de curvas como ‘W1 W1 onde, cada uma, correspondendo a um nível dado do bem-estar colectivo, mostra qual o aumento da utilidade de um individuo que se supõe compensar a diminuição de utilidade que daí resulta para um outro individuo. Para a mesma figura, transporta-se a fronteira da utilidade dos pontos óptimos no sentido de Pareto, isto é, o conjunto de combinações de utilidade de cada um dos dois indivíduos, comparáveis com uma afectação óptima dos recursos: é a curva xy. Para atingir um máximo de bem-estar social é preciso adoptar a repartição entre os dois “bem-estar” individuais concorrentes, ao longo da fronteira de utilidade que permite atingir a curva mais alta de indiferença social, ou seja, o ponto T na figura 4. Este ponto T corresponde a um óptimo de Pareto, mas, ao mesmo tempo, como se encontra no ponto mais elevado da curva que representa os diferentes valores que pode tomar a função de um bem-estar social, temos a certeza de que a repartição é a mais justa possível.

Como dissemos, a função de bem-estar social não pode revelar uma verdadeira ordenação de preferencias através da análise económica. Um julgamento social de valor deverá estabelecer o autêntico estado da repartição que torna aplicável uma função de bem -estar social especifica aplicável (tangente) à fronteira de utilidade.

 

D) As instituições politicas e a escolha da produção pública

Se na revelação das preferências dos cidadãos, nos contentarmos com uma maioria, é certo e sabido que alguém ficará descontente. Por isso, só a unanimidade seria equivalente à eficiência do mercado; mas como a unanimidade é impossível do conseguir, teremos do nos contentar com uma maioria qualificada. Para além disso, é possível que os votantes não revelem as suas preferências optando por votos estratégicos, pondo de parte a sua própria acção de modo a apoiar uma “menos má” que outra.

Numerosas teorias, até interdisciplinares (que nos abstemos de referir aqui), têm estudado as múltiplas possibilidades de o voto revelar a escolha da produção dos bens públicos. Uma das mais interessantes é a que se baseia em dados da experiência, isto é, que constrói modelos politico-econométricos que  dão a relação entre uma situação económica e o comportamento dos votantes (13). Trata-se pois de escolher uma política governamental, de investigar quais as despesas públicas a efectuar e qual o seu montante, do modo a ganhar na eleição seguinte o maior número possível de votos.

 

4. TEORIAS INTERVENCIONISTAS OU DE CONSTRANGIMENTO

 

Como dissemos, nestas teorias, o Estado é concebido como uma realidade superior aos indivíduos que compõem o grupo social, e que se considera totalmente distinto deles (doutrina organicista do Estado).

Os fins que o Estado prossegue são totalmente diferentes dos do individuo. Enquanto este no mercado, procura maximizar o interesse individual, o Estado prossegue fins do interesse geral, o bem comum, que é distinto do soma aritmética dos interesses individuais.

Nas teorias intervencionistas, o equilíbrio é dado pela vontade do Estado que  constrange os cidadãos a pagar os seus impostos, com vista a cobrir as despesas públicas. E como são estas determinadas? Pelos postulados do bem-estar ou do bem comum.

E daqui não passam as teorias intervencionistas. Falta-lhes uma base. Como diz Elisabeth Vessilier: “Nada do mais corrente do que a intervenção do Estado, nada de menos preciso na sua finalidade”(14).

Estas teorias adoptam determinados postulados correspondentes ao que é tido geralmente por interesse geral a dai partem para o estudo da inserção do sector público na economia nacional, sobretudo através dos mecanismos financeiros. Tal exige estatísticas perfeitas actualizadas, bom como a sua divulgação público, o que  não sore bom o caso do nosso País.

Nos últimos anos, as teorias intervencionistas, baseadas sobretudo em Keynes, tem vindo a deparar com um facto anómalo ainda não suficientemente explicado: a ‘stagflation”, isto é, a falta de preços (elemento da inflação), conjuntamente com o desemprego (elemento da recessão). Como podem coexistir estes dois elementos contrários? Haverá meios financeiros do curar os dois ao mesmo tempo? (15).

  

5. TEORIA INSTITUCIONAL

 

As doutrinas individualistas levaram-nos a concluir pela instabilidade, irracionalidade e imprevisibilidade dos cidadãos votantes; a doutrina do constrangimento leva-nos à impossibilidade de demonstrar o bem-estar. Que fazer?

Alain Wolfelsperger tenta uma síntese, partindo das instituições politicas. O cidadão escolhe pelo voto as instituições: estas tomam as decisões relativas escolha da produção de bens públicos.

Quanto aos critérios na escolha dos bens públicos, o autor insiste também sobre o interesse geral como ponto de referência, mas temperado e aferido pelo controlo politico, seja dos leaders uns sobre os outros, seja dos não leaders (vulgares cidadãos) sobre os leaders (16) Uma achega a este modo de ver, é a doutrina italiana que figura o Estado como representante do interesse geral e, no Estado, as classes dirigentes, exercendo a poder no seu próprio interesse (17).

 

6. A TEORIA MARXISTA-LENINISTA DO CAPITALISMO MONOPOLISTA DO ESTADO

 

Por força da lógica da acumulação capitalista, pelo desenvolvimento das forças produtivas e da técnica, acentua-se desde o fim do século passado a concentração e a centralização do capital. 0 mercado perde a sua força e as suas características; falha já como “mão invisível”.. Por isso o Estado tem de intervir (18). Dedica-se a produzir determinados bens que não interessam ao sector privado; é o policia da actividade económica privada, expande as despesas militares. o capitalismo monopolista de Estado, já que actua em conjunto com os monopólios.

Como diz A. L. Sousa Franco (19), aderirá a esta doutrina quem lhe aceitar os pressupostos, designadamente a sua concepção do Estado. Mas dela se podem extrair alguns elementos válidos, como, por exemplo, a necessidade de financiamento pelo Estado de uma parte importante dos investimentos, sobretudo os que são muito elevados ou de rendimento baixo ou longínquo, que não atraem o sector privado.

 

 7. ANÁLISE DO PROBLEMA EM PORTUGAL

Um dos resultados mais evidentes da Revolução de 25 de Abril de 1974 foi, a extensão do sector público e, mais genericamente, do papel do Estado. Em 1976, a sector público representava 24,4 % do valor acrescentado e 45,4 % da formação bruta de capital (20). Resta porém saber ate que ponto o Estado não largará mão de parte das suas participações em empresas.

 Parece que da Constituição não é possível extrair directamente um modelo económico, tanto mais que dirigentes políticos declararam estar suspensa a transição para o socialismo.

 Foi aprovada a Lei de separação entre a sector público e o sector privado (Lei n.° 46/77, do 8 de Julho), mas esta ainda não foi regulamentada, apesar de esgotado há muito o prazo para o fazer (21).

 Diremos pois que, entre nós, a futuro é incerto, dependendo totalmente de decisões politicas.

 É possível, porém, que se acentue a tendência para a redução do sector público, já que este é caracterizado par um alto índice de ineficácia, pois a uma alta percentagem do despesas, corresponde uma parte muito menor do receitas na estatística do rendimento nacional (22).

 

 8. O ORÇAMENTO DO ESTADO —A POLÍTICA ORAMENTAL

 Esquematicamente, a politica orçamental comporta duas categorias do problemas: por um lado decidir das despesas e por outro, determinar o modo de as cobrir. Geralmente, é a segundo o problema mais frequentemente objecto da politico orçamental

 Haverá então que verificar a inserção do modo de financiamento na vida económica nacional: há que saber a sua incidência sobre o consumo e o investimento; trata-se do exame dos circuitos financeiros.

Quanto ao modo do financiamento propriamente dito, podemos dividi-lo em três espécies:

1)       Impostos taxas e outras receitas efectivas;

2)        Empréstimos;

3)        Criação de moeda.

Enquanto os primeiros dois costumam ser inseridos no estudo da economia financeira, já o último faz parte geralmente do estudo da economia pública.

 

 NOTAS:

 

 Nas observações. as obras citadas são referidas pelo número de ordem na lista inserida a final indicado entre parênteses.

 

(1) Entre 1946 a 1974, o total da despesa pública governamental (federal, estadual e local) nos U.S.A. subiu do 13 % para 22 %, como refere Mueller (17), págs. 396. Adiante referiremos o caso português.

(2) Só as primeiras três correspondem às divisões referidas por R. A. MUSGRAVE (1), págs. 6-28: Allocation. Distribution, Stabilization.

No entanto, em introdução especial à edição (ISE) para o Oriente, ele recomenda “to treat growth as a separate objective, pursued by an additional branch” (em (1), págs. 2, extra texto).

(3) Em A. CAVACO SILVA e BENTO MURTEIRA 05), págs. 67.

(4) Recentemente, no Estado da Califórnia (U. S. A.), foi aprovada a Proposition 13 ou Emenda Jarvis-Gann à Constituição do Estado, pela qual, em acto eleitoral, os votantes baixaram de 3 para 1 % do valor venal das construções a Property Tax, desfalcando assim em 7 mil milhões de dólares o orçamento do Estado que era de 24 mil milhões. Esta posição dos votantes mereceu o inteiro aplauso de Milton Friedman (Newsweek, June 19, 1978, pgs. 29), mas deixou a América perplexa, em face do que se poderá seguir. Friedman é o co-fundador do National Tax Limitation Committee. Como em todo o mundo, também o contribuinte americano “seems to want it both ways — lowy taxes and ample services” (revista citada, págs. 27).

(5) Conforme refere A. L. SOUSA FRANCO (4), pags. 109, nota 3, a decisão financeira responderá ainda a estes problemas:

   — Que tipos do bens são necessariamente criados pelos entes públicos em função da sua forma do satisfação, dos seus fins e do seu custo?

   — Que tipos de bens podem ser vantajosamente criados pelos sujeitos públicos?

   — De que formas de financiamento (ou meios de obtenção de recursos) podem os sujeitos públicos (só eles ou eles e outros) socorrer-se para cobrir os custos desta actividade financeira?

   — Para que fins podem servir estas colectividades do obtenção de recursos, afectação o gestão dos bens existentes?

 (6) TEIXEIRA RIBEIRO (3), págs 24, refere as finanças positivas, como as que fazem a “teoria da realidade’, observando e explicando a uniformidade do comportamento do Estado”. No texto, segue-se mais o conceito do MUELLER (17), pags. 422-423, onde “teoria positiva” significa a tentativa da construção científica de um conjunto de princípios para a decisão sobre produção pública.

 (7) MUELLER (17), págs. 396, nota 3.

 (8) in (8), págs. 2b, ss.

 (9) EUSABETH VESSILLIER (6), págs. 72.

 (10) R. A. MUSGRAVE (1), págs. 61.

 (11) B. P. HERPER (22), págs. 14, nota 13.

 (12) R. A. MUSGRAVE (1), págs. 80, ss.; R. A. MUSGRAVE (2), págs. 112, ss.; A. WOLFELSPERGER (5), págs. 111, ss.; o S. P. HERBER (22), pays. 73, ss.

 Originariamente, esta teoria apareceu em PAUL A. SAMUELSON (The pure theory of Public Expenditure), in Review of Economics and Statistics, November 1954, pays. 387-389; “Diagramatic Exposition of a Theory pf Public Expenditure” in Review of Economics and Statistics, November 1955, pays. 350-356; e “Aspects of Public Expenditure Theories” in Review of Economics and Statistics, November 1858, pays. 322-338.

 (13) MUELLER (17), págs, 415.

 (14) in (6), págs. 93.

 (15) Elisabeth Vessillier (6), pâgs. 45.

 (16) Alain Wolfelsperger (5), págs. 79, as.

 (17) A. Wolfelsperger (5), págs. 86.

 (18) VITAL MOREIRA (24), pags. 55.

 (19) in (4), pags. 174

  (20) in OCDE (20), pags. 6. O Anuário Estatístico de 1976 apenas indica o sector público não empresarial (11,19 %) do rendimento nacional de 1975) não discriminando a sector público produtivo.

 (21) Deveria ter sido regulamentada no prazo de 90 dias. Sobre o assunto, António Rebelo de Sousa, “Para quando a regulamentação da Lei de delimitação dos sectores público e privado", no EXPRESSO) de 12-11-1977.

 (22) Segundo lemos algures e é muito plausível; faltam-nos, porém, estatísticas comprovativas.

 

 

BIBLIOGRAFIA

 

1— RICHARD A. MUSGRAVE—The Theory of Public Finance. Mc-Graw-Hill Kogakusha Tokio — Intemational Student Edition

2 — RICHARD A. MUSGRAVE — Teoria das Finanças Públicas. 2 vols. Editora Atlas. S. A. São Paulo (Brasil). 1794.

3 — TEIXEIRA RIBEIRO — Lições de Finanças Públicas. Coimbra Editore, 1977.

4—A. L. SOUSA FRANCO — Manual de Finanças Públicas e Direito Financeiro, Lisboa. 1974.

5—ALAIN WOLFELSPERGER—Les biens collectifs. PUF, Paris. 1969.

6 —ELISABETH VESSILLIER — Fondements de l’économie financière. Dossiers Thémis. PUF. 1972.

7 — RICHARD A. MUSGRAVE — Fiscal Systems. New Haven and London. Yale University Press. 1975.

8—H. BROCHIER, P. LLAU, CH. A. MICHALET—Economie financière. Paris. PUF. 1975.

9 — MAURICE LAURÉ — Traité de politique fiscale. Paris. PUF    1965.

10—JOHN KENNETH GALBRAITH—A sociedade da abundância. Tradução do Henrique do Barros. Liv. SA da Costa, 1963.

11 — MAURICE DUVERGER — Finances Publiques. 8. Edição. Paris. PUF. 1975.

12— MAURICE DUVERGER — Los finances publiques. 4. Edição. Que sais-je n.º 415. Paris. PUF. 1967.

13 — MAURICE DUVERGER — Elements do fiscalité. PUF. Thémis. Paris. 1976.

14— PEDRO SOARES MARTINEZ—Esboço do uma teoria das despesas públicas. Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal.

15—A. CAVACO E SILVA e BENTO MURTEIRA—Nivel e estrutura da fiscalidade: Portugal o os outros países da O.C.D.E. in Economia, Vol. II, n.9 1, do Janeiro do 1978.

16— RICHARD GOOD — The individual income tax. Revised Edition. 1976. Studies of Government Finance. The Brookings Institution. Washington, D. C.

17—DENIS C. MUELLER—Public Choice—A Survey, in Joumal of Economic Literature. 1976. pags. 395-433.

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21 — O. C. D. E. — Etudes économiques. Portugal. Décembre. 1977.

22 — BEMARD P. HERBER — Modem Public Finance. The Study of Public Sector Economics. 3. Ed. 1975. Richard 0. Irwin, Inc. Homewood. Ill.

23 — PAUL A. SAMUELSON — Economia. Uma anáise introdutória. 2 vols. Fundação Calouste Gulbenkian. Lisboa.

24—VITAL MOREIRA—A ordem jurídica do capitalismo. Centelha. Coimbra. 1973.