2-4-2004
Sergey Ivanovich Taneyev
Сергей Иванович Танеев
(1856 – 1915)
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Em inglês: O
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Esta página refere-se a um concerto que teve lugar na Fundação Calouste Gulbenkian em 17-10-2003, com o coro e orquestra dirigidos pelo Maestro russo Mikhail Pletnev - Михаил Васильевич Плетнев – e a participação de quatro cantores russos: Lolita Semenina – Soprano - Лолита Семенина Irina Doljenko – Meio Soprano - Ирина Долженко Mikhail Gubsky – Tenor - Михаил Губский Andrei Baturkin – Barítono - Андрей Батуркин A orquestra, reforçada com 24 instrumentistas, começou por executar “A Rússia desconhecida”, de Tchaikovsky, Suite em Ré maior, op. 43, muito agradável de ouvir. Depois, a Cantata, op. 36, de Sergey Taneyev, Após a leitura de um salmo, uma obra grandiosa deste autor, ainda desconhecido entre nós. Foi um belo concerto e nem se notaram dificuldades para o coro de cantar em russo. Os solistas demonstraram também muita categoria.
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Cantata op. 36, Após a Leitura de um Salmo (letra de A.C. Khomiakov)
Пo прочтении псалмa (слова A. С. Хомяковa)
Земля трепещет: по эфиру
Израиль,
ты Мне строишь храмы,
К
чему Мне ваших храмов своды,
Я
создал землю, создал воды,
Хочу
– и словом расширяю
К
чему Мне злато? В глубь земную,
Он
там кипит и рвется, сжатый
К чему куренья?
Предо Мною
Земля
со всех своих концов
К
чему огни? Не Я ль светила
Твой скуден дар.
Есть дар бесценный,
Алексей ХОМЯКОВ
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PRIMEIRA PARTE
1. (Coro) - Allegro tempestoso
A terra estremece, O trovão rasga o céu em todo o lado. É a voz divina que anuncia ao mundo: «Israel, escutai meu povo!
2. (Coro dividido) - Andante sostenuto
Meu povo, tu me constróis os templos E os templos brilham cobertos de ouro, Queima-se lá o incenso, Dia e noite ardem os fogos.
3. (Coro) - . Andante
Para que preciso eu das sumptuosas abóbadas dos templos, Pedra sem alma, cinza terrestre?
Allegro molto
Eu criei a terra, criei a água, Com a minha mão desenhei o céu.
Fuga à 3 soggetti
Se quiser, com a minha palavra posso alargar Os limites das maravilhas de vós desconhecidas. Eu observo o infinito, Observo o infinito dos céus.
SEGUNDA PARTE
4. (Coro) - Allegro moderato
Para que preciso eu do ouro? Nas profundezas da terra, no ventre das rochas eternas Despejei, como se fosse simples água da chuva, O metal fundido pelo fogo.
Allegro tenebroso – Fuga
Que ali ferve e se debate comprimido, Preso nas profundezas escuras. Os vossos ouro e prata São apenas os salpicos desta onda ardente.
5. (Coro) – Andante
Para quê o fumo do incenso?
(Quarteto de solistas)
Diante de Mim A Terra, de todos os seus recantos, Exala o cheiro perfumado Das flores cobertas de orvalho.
6. (Solistas e Coro) - Adagio ma non troppo
Para quê os fogos? Não fui eu quem acendeu Os astros por cima das vossas cabeças? Não sou eu, quem, como faíscas da fornalha, Atira as estrelas na escuridão da noite?
TERCEIRA PARTE
7. (Coro) - Interlúdio: Allegro appassionato
Pobres são as vossas oferendas.
8. Ária (Contralto) - Adagio piutosto largo
Existe uma dádiva inestimável, A dádiva que necessita o teu Deus, Apresentai-te com ela e Eu, conciliado, Aceitarei todas as tuas oferendas:
Preciso do coração mais puro que o ouro, E de uma grande força de vontade no trabalho. Eu preciso de um irmão que ame o irmão, Preciso da verdade no julgamento.
9. (Coro dividido) - Adagio pietoso e molto cantabile
Preciso do coração mais puro que o ouro, E de uma grande força de vontade no trabalho. Eu preciso de um irmão que ame o irmão, Preciso da verdade no julgamento.
Tradução de Arman Amirkhanian
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Иоанн Дамаскин (слова A. К. Толстогo)
Иду в незнаемый я путь,
Но вечным сном пока я сплю,
В тот день, когда труба
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Cantata op. 1, São João Damasceno (Alexei Tolstoi)
Sigo o caminho que desconheço, avançando entre o medo e a esperança; apagou-se a minha vista, arrefeceu o meu peito, meus ouvidos não ouvem, os meus olhos estão fechados; estou deitado sem voz, sem movimento, não ouço o choro fraterno, e a fumaça azulada do incenso não me leva o seu perfume.
Mas enquanto durmo, submerso em sono eterno, o meu amor não morre. E com ele rogo-vos, irmãos, oremos todos apelando ao Senhor: Deus!
No dia, em que as trombetas anunciarem o fim do mundo, recebe este Teu escravo defunto no Teu paraíso celeste.
Tradução de Arman Amirkhanian |
16 de Março de 2004 - Mikhail Pletnev regressou a Lisboa à frente da Orquestra Nacional Russa para actuar no ciclo das “Grandes Orquestras Mundiais”. Pena foi que o Coro Gulbenkian não tivesse cantado, como havia sido anunciado, as “Três canções russas”, Op. 41, de Rachmaninov.
Interpretou apenas (muito bem) a Cantata n.º 1 de Sergei Taneyev a S. João Damasceno.
A orquestra interpretou a seguir a Sinfonia n.º 4 de Tchaikovsky, com muita categoria, como era de esperar.
O Milagre da 4ª Sinfonia de Tchaikovski
Por CRISTINA FERNANDES3
PÚBLICO;Quinta-feira, 18 de Março de 2004
O último concerto do ciclo Grandes Orquestras Mundiais, organizado pela Fundação Gulbenkian, trouxe na passada terça-feira ao Coliseu de Lisboa a Orquestra Nacional Russa, sob direcção do seu titular, Mikhail Pletnev, na interpretação de um programa inteiramente preenchido com repertório russo. Infelizmente os inicialmente anunciados "Três Cantos Populares Russos", op. 41, de Rachmaninov - uma obra raramente cantada em Portugal - foram inexplicavelmente substituídos por uma das partituras mais tocadas de Tchaikovski, com o estatuto de verdadeiro "clássico popular"- o bailado "A Bela Adormecida", de que ouvimos quatro excertos: Introdução, Marcha, Entreacto e Valsa.
A interpretação teve um bom nível (ainda que com um ou outro ponto menos depurado: falta de transparência no início da Introdução, madeiras pouco precisas na Valsa...), mas deixou-nos na memória o inspirado solo do primeiro violino do Entreacto (beleza do fraseado, "cantabile" generoso). Pode dizer-se que estas peças iniciais funcionaram um pouco como "aquecimento" para o resto do concerto, já que na Cantata op. 1, "São João Damasceno", de Taneyev, a orquestra não só mostrou uma sonoridade de conjunto muito mais opulenta e equilibrada, como se tornou evidente um trabalho interpretativo profundo em conformidade com o plano dramático da obra - uma tocante meditação sobre a morte. A prestação do Coro Gulbenkian foi, em geral, eficaz (se bem que nem sempre perfeita) e expressiva, mas o seu menor amadurecimento da partitura face à orquestra teria inevitavelmente de se notar.
O ponto áureo do concerto surgiu na segunda parte, com a Sinfonia nº 4, de Tchaikovski. O virtuosismo técnico, uma sólida concepção da obra (não só de cada andamento, mas do todo, aspecto ainda mais essencial numa sinfonia cíclica) e a paixão colocada na interpretação contribuiram para uma leitura notável de uma das mais admiráveis e inquietantes obras do compositor russo. O ar sisudo, austero e impenetrável de Pletnev não podia ser mais contrastante com o manancial de emoções que emergiram da orquestra - a prova de que uma boa técnica de direcção pode transmitir tudo, sem necessidade de gestos supérfluos ou exibicionismo teatral.
Para além do rigor do maestro (por sinal, menos eficiente na direcção do Coro), impressionou a sua noção muito clara da arquitectura da obra, a forma como soube caracterizar cada complexo temático, o sentido dos contrastes, a gestão das dinâmicas, tensões e volumes sonoros. Um bom exemplo foi a condução do implacável tema do "destino" ao longo do primeiro andamento, levado a um pico de tensão emocional angustiante no final do desenvolvimento, bem em conformidade com o espírito da música de Tchaikovski. Os metais revelaram-se aqui uma das mais-valias da formação, em especial o naipe dos trompetes, de uma precisão e homogeneidade imaculada. O outro ponto forte foram as cordas, com uma sonoridade cativante e muito própria (caracteristicamente russa?), ficando a qualidade das madeiras um pouco abaixo. Para além do imponente e intenso final, não podemos deixar de destacar ainda a clareza dos "pizzicatti" do "Scherzo" (a sua sincronização é um teste implacável a qualquer orquestra), combinada com uma minuciosa paleta dinâmica e sugestivos efeitos de estereofonia.
Um concerto de elevado nível que ficará na memória pela notável interpretação da Sinfonia nº 4, de Tchaikovski.